terça-feira, 8 de junho de 2021

Este mundo tenebroso - parte 2 - capítulo 41


 Santinelli reclinou-se, descontraído, e com um olhar de instrução a Goring e Steele, encorajou-os a fazer o mesmo.

Em seguida, olhou para Sally e tornou-se duvidosamente cordial.

— Sally, sempre me considerei um cavalheiro, um homem de dignidade e honra, e respeitador da dignidade feminina. Desejo sinceramente um dialogo inteligente e produtivo com você, e estou certo de que, dada a alternativa, você deseja o mesmo.

— Eu preferiria que fosse assim — admitiu Sally. Santinelli assentiu com a cabeça.

— Então, tendo concordado sobre isso, faríamos bem em considerar sua credibilidade como testemunha contra nós. Parece que se esqueceu do que é.

Sally respondeu simples e diretamente.

— Sou uma adúltera, uma assassina de nenê, e uma criminosa condena­da. — Eles pareceram pouco à vontade. Ela respondera àquela pergunta um tanto facilmente demais. — Tenho sido relembrada sobre isso constan­temente desde o dia em que aconteceu, por sete anos de prisão, por espíritos atormentadores, e pela minha própria consciência.

Steele disse:

— Sally, esse é um conjunto de rótulos vergonhoso e repugnante. Ela sorriu, o que chegou a surpreendê-la.

— Na realidade, esses rótulos são maravilhosos e lindos por causa... — Ela hesitou.

Goring completou a sentença.

— Por causa da Cruz?

Ela animou-se ao ouvir a pergunta.

— Sim, Sr. Goring. Surpreende-me que o senhor saiba a respeito disso. Goring deu uma risadinha sarcástica.

— Sabemos a respeito de uma porção de coisas, Srta. Roe.

Sally não reagiu de forma alguma a essa declaração, mas continuou.

— Estou longe de ser competente em teologia cristã, mas sei que encontrei esse Jesus pessoalmente, e sei que fui perdoada. Considerando quais foram os meus atos, acho esse fato animador, inspirador.

Eles não gostaram nem um pouquinho daquela resposta.

O Homem Forte também não gostou, e soltou um rugido que encheu o prédio e inquietou os demônios. Ele deu uma olhada de esguelha para Destruidor, que olhou para o outro lado.

Santinelli tentou manter-se frio, mas seu rosto estava ficando um tanto rosado.

— Então, devemos entender que voltou-se para a religião antiquada numa tentativa final de obliterar o passado? — Ele riu zombeteiramente. — Essa, Sally, é uma ilusão maravilhosa para os fracos de coração e mente. A idéia de que seus pecados são perdoados é uma fábula tanto quanto os próprios pecados. Você é deus, Sally; não tem de prestar contas a ninguém.

— Então, eu deveria estar livre para ir embora, não deveria?

— Essa é uma questão secundária — disse Goring, com um aceno da mão — e não tem relação com o nosso propósito atual. Sally, permita-me ser franco: Mesmo que os pecados fossem reais e que esse Jesus pudesse salvá-la deles, o que precisa enfrentar neste momento é que ele não pode salvá-la de nós.

— Eu não presumiria que ele devesse fazê-lo. Agora Santinelli chegou a erguer a voz.

— Srta. Roe, estou certo de que sabe que esta sua conversa a colocou em maior perigo ainda. Não poderia ter feito nada melhor para garantir inimizade entre nós, e mesmo a sua própria morte, do que se tornando cristã! — Ele inclinou-se para diante e com raiva controlada apontou um dedo ao rosto dela. — Você se estabeleceu como uma inimiga suprema neste empreendimento, merecendo o nosso ódio!

Igualzinho à Amber, pensou Sally. Steele, Santinelli e Goring estão mostrando os mesmos olhos de demônios, o mesmo ódio diabólico. Ela tomou conhecimento das palavras de Santinelli.

— Eu sei.

O Homem Forte podia ver a paz nos olhos dela, e isso o enfureceu. Bata-lhe!

Santinelli esbofeteou-lhe o rosto.

— Vai nos dizer onde estão as listas! O que fez com elas?

Krioni e Triskal saudaram Natã e seus guerreiros quando o caminhão de correspondência chegou ao Correio de Ashton.

— Então, tiveram dificuldades? — perguntou Krioni.

— Um pouquinho — disse Natã.— Bem, estamos esperando mais outras — disse Triskal.

Armoth seguiu o motorista para dentro do prédio e observou atenta­mente enquanto ele colocava o malote com alguns outros num carrinho de recebimento. Logo a correspondência seria removida e separada, e aquele seria o momento mais crítico de todos.

Um fuliginoso, heterogêneo bando de diabretes e desordeiros, lidera­dos pelos abomináveis doze repugnantes guerreiros de Destruidor, abri­ram caminho até Ashton, voando baixo sobre o chão, atingindo grande velocidade, as espadas desembainhadas, os olhos saltados de ansiedade. Essa batalha seria a sua última, pensavam os doze. Seria bom que fosse a melhor.

No Clarim de Ashton, estava na hora de ir buscar a correspondência matutina; Bernice havia colocado o casaco e tinha as chaves do carro na mão, mas não era previsível? Mal ela tinha colocado a mão na maçaneta da porta da frente, o telefone tocou, e era o Eddy, da Padaria do Eddy. O sujeito era a exigência personificada!

— Sim, Eddy, posso dar-lhe esses cinco centímetros. Bem, sim, de graça, mas apenas um mês para você experimentar. — Outras perguntas. — Para decidir se você gosta assim e se nós gostamos assim. Nunca fizemos isso antes, e achei que devíamos tentar. — Ele continuou falando. Ela fez um gesto na direção da porta da frente. — Não, acho que podemos aumentar aquela caneca de café um pouco mais e dará muito certo. Isso, não precisará mudar o seu logotipo. — Ela fez uma careta e revirou os olhos. — Escute, por que não fala com Cheryl sobre isso? Sim, ela sabe tudo a respeito.

Ele não queria falar com Cheryl.

ATACAR! Os espíritos negros atiraram medo e cautela ao vento e desceram sobre Ashton numa torrente de caos e maldade, asas rugindo, enxofre formando trilhas, obscurecendo a luz, entrechocando-se com guerreiros angelicais por toda a cidade. Acima e abaixo nas ruas eles se atiravam, revirando, entrechocando-se, atacando os guerreiros dos Céus com espadas de fogo e ardor, disparando pelo meio do transito, ficando de emboscada nas esquinas, voando através de prédios e criando confusão, guinchando seus brados de guerra, totalmente entregues à tarefa de manter os anjos ansiosos, batalhando, independente do custo, inde­pendente da perda. Enquanto os diabretes, atormentadores e desordeiros agitavam a cidade como um turbilhão, os doze de Destruidor partiram atrás daquela carta.

Até que enfim Bernice chegou ao seu fusquinha, mas a porta não se abria. A chave nem chegava a virar na fechadura.

VUPT! Uma faixa de luz atravessou o demônio que havia estragado a fechadura. Ele se dissolveu.

A chave virou por fim. Bernice entrou.

Na rua, o sinal encrencou no vermelho e os carros começaram a enfileirar-se.

Um pequeno sedan foi parando devagar ao lado do carro de Bernice, e imediatamente uma caminhonete bateu-lhe atrás. Os dois motoristas saí­ram de seus veículos e puseram-se a debater numa longa batalha de desculpas.

Seis anjos voaram ombro a ombro pela Sexta Avenida enquanto quatro outros mergulharam do céu e arremeteram pela Rua Miller. Eles convergi­ram num choque explosivo logo acima do sinaleiro, arremessando demô­nios sabotadores a dissolver-se em altos arcos que formaram uma samam­baia de trilhas de fumaça vermelha.

A luz ficou verde.

Mas o trânsito ainda não se movia, devido ao acidente. Bernice resolveu caminhar.

Sally tentou afundar-se mais no sofá, mas não havia jeito de diminuir a dor do aperto contundente e esmagador que o capanga grandalhão exercia sobre os ombros dela. Ele a estava machucando e deliciando-se com isso.

Steele estava falando baixo e deliberadamente a fim de certificar-se de que ela o ouvisse; naquele momento ela parecia bem preocupada com sua agonia.

— Estou certo de que está familiarizada com os rituais satânicos, por isso eu não deveria ter de dar os detalhes. Sally, não queremos ver isso acontecer; mas se for preciso, entregaremos você ao Sr. Kholl e sua gente, e deixaremos que eles façam o pior com você até que nos diga aquilo que queremos saber.

Sally estava prestes a responder, prestes a dizer que eles iam matá-la de qualquer forma, mas foi detida quando algo aconteceu-lhe aos olhos, como se eles se tivessem aberto pela primeira vez, como se uma escuta cortina tivesse sido puxada para o lado. Talvez a dor estivesse fazendo com que ela alucinasse.

Ela podia ver os espíritos por trás desses homens. Eram umas coisas enormes, verrugosas, feias, olhando-a furiosamente com ódio assassino.Em todas as suas experiências com o oculto, ela jamais os havia visto tão claramente; jamais havia discernido tanto mal ou tanto ódio.

Mas ela via que o ódio deles não lhe era dirigido. Era dirigido ao Salvador que ela trazia dentro de si.

E então ela soube. Simplesmente soube, e falou, se em voz alta no mundo presente ou se em espírito em outra dimensão, ela não poderia dizer.

— Vocês estiveram lá! Todos vocês estiveram lá! Fizeram o pior que podiam com ele... vocês o mataram!

Aquilo perturbou os espíritos. Eles se entreolharam, indignidade e ultraje enrugando-lhe as caras.

— E ele os derrotou ao morrer! Ele venceu! — O espírito brutamontes que pairava no alto arreganhou os dentes e rugiu maldições indiscerníveis contra ela, as asas inflando. Ela olhou dentro daqueles ardentes olhos amarelos, e para grande surpresa sua, viu medo. Em seu espírito, ela riu. — E façam o que fizerem comigo, eu já venci!

Ela gritou. Podia sentir toda a dor novamente. O capanga estava prestes a quebrar-lhe o pescoço. Os espíritos se desvaneceram com o resto do mundo. Ela já não ouvia, ela já não via. Estava mergulhando num sonho, numa escuridão sem fim. Santinelli berrou algo, e o capanga a soltou. Ela pensou que flutuaria do sofá para cima. A dor diminuiu.

Num momento pôde ver e ouvir de novo, e percebeu que estava quase caindo para a frente. Seus ombros latejavam. Santinelli estava dizendo algo a respeito de matá-la.

Então Goring disse:

— O dia da conferência vai começar; vai ter gente passando pelas janelas. É melhor continuarmos isto lá em baixo.

— Esperem! — disse Sally, e todos se imobilizaram. Ela tinha a atenção deles. Erguendo a cabeça, ela reuniu as forças e a coragem, e murmurou debilmente: — Ainda tenho mais um trunfo com que jogar. Vocês precisam saber que me correspondi regularmente com Tom Harris de Baskon. Contei-lhe tudo o que sei e tudo o que fiz. Se alguma coisa me acontecer, existe alguém que saberá.

Goring sorriu, e enfiou a mão dentro de uma maleta ao lado do sofá.

— Oh, deve estar-se referindo a estas. — A mancheias, três de cada vez, quatro de cada vez, uma de cada vez, Goring tirou as cartas da maleta e as colocou empilhadas sobre a mesinha de centro, danto a Sally uma revela­ção lenta, torturante. Quando ela havia adquirido um tom satisfatório de palidez, ele continuou: — Dedicamos grande quantidade de preparação ao nosso plano, e felizmente conseguimos exercer influência suficiente sobre a acusadora na ação judicial, que é também a chefe do correio local. Ela nos tem mandado todas as suas cartas; portanto, nem é preciso dizer, Tom Harris e seus amigos jamais as receberam. Eles não têm idéia do seu paradeiro ou do que você poderia saber. Santinelli acrescentou:

— E, sim, temos estado a observá-los, e é óbvio que têm pouca informação a seu respeito e que estão atirando no escuro. Eu diria que estão ficando um tanto desesperados. Mas isso não importa agora, não é? Temos você, e trataremos com você da maneira que acharmos melhor, que acharmos necessária.

Goring apontou para a mesinha de centro:

— Portanto, temos você, temos todas as suas cartas, temos o anel denunciador; está na hora de tratarmos firmemente dessas listas roubadas. Senhores?

De repente, ela estava dependurada pelos braços. Ela empurrou com os pés a fim de diminuiu a dor, e ficou em pé por conta própria.

— Por aqui — disse Goring.

Os homens do Vidoeiro Quebrado forçaram-na adiante, levando-a na direção de uma escada que levava para dentro do frio ventre de concreto do chalé. Goring foi à frente, acendendo as luzes e guiando-os pelas escadas em caracol.

Steele seguia atrás, e depois dele vinha Santinelli. Kholl seguia no fim da procissão, enfiando a mão no casaco para pegar a faca.

Então Kholl hesitou.

— Vou-me certificar de que a porta da frente esteja trancada — disse ele.

Subiu novamente, mas passou pela mesinha de centro a fim de dar uma boa olhada em todas aquelas cartas. Hmmm. Excelente!

Pronto, consegui! Bernice olhou o relógio e descobriu que havia levado apenas dez minutos para caminhar até o Correio. Não era tão mau assim. Agora era pegar aquela correspondência.

Bem ao alto, os doze asseclas de Destruidor a viram. Também viram o dossel de anjos sobre o prédio. Eles soltaram um brado e mergulharam para a batalha, as asas guinchando, as narinas soltando trilhas de enxofre.

UUXX! Três deles varreram cinco guerreiros angelicais do telhado do Correio e os atacaram, revirando, arremetendo, rodopiando, retalhando. Estariam ocupados por algum tempo.

Dois capangas se atiraram através da parede norte. Natã e Armoth se abaixaram quando eles passaram, rebateram-nos com firmeza, e manda­ram-nos através da parede sul.

UFA! Quatro outros deixaram-se cair pelo telhado e golpearam os anjos com garras à mostra. Os demônios levaram em pleno rosto as asas flamejantes e somente viram as lâminas brandidas tarde demais. Fumaça vermelha.

O jovem funcionário esvaziou cuidadosamente o malote, separando os pacotes, envelopes, propaganda não solicitada, revistas.

— Oi, Al! — veio uma saudação do saguão.

— Oi, Bernice! A correspondência está um pouco atrasada.

— Oh, tudo certo, eu também estou.

Ah, ali estava alguma correspondência para o Clarim. Ele a fez escor­regar para a caixa do Clarim, e depois olhou para ver se havia mais.

Quatro capangas explodiram através da parede, asas formando um borrão, Krioni e Triskal encarniçados em seus calcanhares. Uma espada vermelha abaixou-se com ímpeto.

A carta adejou para o chão.

Bernice retirou toda a correspondência da caixa do Clarim e deixou-a cair numa sacola de compras. Ela olhou através da abertura e bradou:

— É só isso?

Al examinou a nova correspondência que havia chegado.

— É, acho que você pegou tudo.

— Está bem.

Bernice fechou a porta da caixa e voltou-se para sair.

Krioni pegou um espírito pelo calcanhar, mas o bicho era tão forte que o arrastou através da parede do Correio e ele teve de soltá-lo.

Triskal levou um violento sopapo de um monstro, deu uma estocada em outro, e chutou um terceiro para fora por cima do balcão.

Bernice não viu o espírito passar voando por ela quando estendeu a mão para abrir a porta.

Natã abaixou-se para apanhar a carta.

Um pé preto, cheio de garras, pegou-o no peito e arremessou-o até o teto. Outros dois espíritos o cercaram. Ele rodopiou, a espada estendida, dividindo um, aparando o golpe do outro com uma explosão de fagulhas.

Krioni voltou, viu a carta e foi atrás dela. Armoth o cobriu, empurrando para trás dois espíritos, bem em cima da lamina de Natã.

Krioni fez a espada deslizar por baixo da carta e a atirou para o ar.

Al não viu Krioni socando dois demônios a fim de tirá-los da frente do funcionário postal, mas viu a carta quando ela pousou no chão, com o endereço para cima.

— Oh, ei, Bernice!

A porta estava para fechar-se atrás dela. Ela ouviu-o chamando e voltou, abrindo novamente a porta e entrando de novo no saguão.

Bom! Agora os guerreiros podiam concentrar-se nos demônios. Não devia haver muitos mais — apenas os maiores e mais fortes.

Al entregou a carta a Bernice por cima do balcão.

— Meio grossa. Talvez um cartão aí dentro ou algo assim.

O coração de Bernice quase parou quando ela viu a remetente: S. B. Roe.

Em Baskon, Kate entregou o telefone a Marshall.

— Fique alerta, Marshall — sussurrou ela. Ben e Bev ouviram isso e se aproximaram.

— Quem é?

Marshall falou no aparelho:

— Sim, aqui fala Marshall Hogan.

— Sr. Hogan — disse a voz no outro lado — aqui é Debbie Aronson. Trabalho no Correio com Lucy Brandon. Preciso falar com o senhor.

O saguão do Correio encheu-se de fumaça vermelha quando Triskal arremeteu de espada em riste através de dois espíritos e através da parede até o lado de fora, sacudindo de seus ombros e asas espíritos que se dissolviam.

Bernice abriu a carta impetuosamente e encontrou a chave de uma caixa postal ali dentro. Caixa 203. Ali? Naquela agência? Ela deu uma passada rápida de olhos pela carta de Sally Roe.

Talvez Bernice nem tivesse notado, mas começou a balançar para cima e para baixo sobre os dedos dos pés.Marshall agarrou uma caneta enquanto Kate lhe trouxe papel, e ele sentou-se à mesa da sala de jantar de Ben e Bev.

— Que bom você ter chamado, Debbie. Gostaria muito de conversar com você.

— Bem, não tenho tanta coisa assim para dizer. Estou no meu horário de folga, no Restaurante do Don.

— Podemos nos encontrar em algum lugar, alguma hora?

— Não, não quero me arriscar a ser vista com o senhor. Escute, deixe-me apenas contar-lhe o que sei e depois faremos de conta que nunca conversei consigo, está bem?

— Está bem.

Bernice encontrou a Caixa 203. Podia ver uma grande pilha de corres­pondência através do painel de vidro. Ela enfiou a chave na fechadura, e esta serviu perfeitamente, girando a lingüeta.

— Lucy tem estado a interceptar correspondência; está mandando para outro endereço cartas que tenho a certeza de que não deveriam ser mandadas. Faz semanas que a vejo fazendo isso, e acho que o sargento Mulligan a está amedrontando para que faça isso.

Puxa vida, puxa vida, puxa vida. Senhor Deus, é esta a solução? Marshall tentou manter calma a voz.

— Muito bem. Você sabe a quem as cartas eram endereçadas e de quem eram?

Bernice abriu a portinha da caixa postal. O que era tudo isso? Envelopes amarelos, envelopes menores, um pacote marrom simples, uma caixinha embrulhada em papel.

— Eram todos endereçadas a Tom Harris... Marshall podia sentir seus olhos ficando grandes.

— ... E eram todas daquela mulher que supostamente está morta... Marshall evitou dizer o nome. Debbie tinha de dizê-lo ela mesma.

— Que mulher, Debbie? Você sabe o nome?

— Humm, aquela mulher Roe. Sally Roe.

As mãos de Bernice tremiam enquanto ela removia até o último ítemda caixa postal e enfiava tudo em sua sacola de compras. Não podia esperar para voltar ao escritório.

Natã abaixou-se para escapar da violenta arremetida da espada da fera que sobrara, depois devolveu o ataque forte e rapidamente com sua própria lamina. A coisa afastou-se através da parede, e Krioni a encontrou no lado de fora.

Fumaça vermelha. Era o último deles.

O resto de Ashton também estava garantido. O ataque, concentrado no Correio, havia sido enfrentado e derrotado.

Marshall desligou o telefone suavemente, depois reclinou-se na cadeira, jogou a cabeça para trás e soltou um rugido que fez tremer as janelas. Ele não sabia o que dizer, o que fazer, como expressar como se sentia, por isso somente berrou enquanto Kate, Ben e Bev tentavam fazê-lo falar.

— Marshall! — insistiu Kate. — O que é?

Ele apenas berrou de novo, erguendo as mãos aos Céus. O telefone tocou novamente. Marshall apanhou-o com mãos trêmulas. — Sim?

A voz no outro lado mal podia falar; estava tão fina e espremida que quase sumia.

— Marshall, aqui é Bernice! Faça o que fizer, sente-se!

Até que enfim, Sally havia ateado fogo ao cerrado.

Natã foi o primeiro a ficar com as mãos livres. Ele arremeteu aos céus acima de Ashton, abrindo um brilhante espaço através da fumaça desvanecente da batalha que ora se findava, e levou uma trombeta de ouro aos lábios.

O toque foi transmitido por sobre as plantações, sobre os prados, de um lado ao outro do céu; cada guerreiro angelical podia ouvi-lo e sabia o que significava.

Ainda assim, eles esperavam. Ainda não. Primeiro Baskon, depois o resto. Eles puseram-se de novo à escuta. O toque de Baskon viria logo.

No Instituto Summit, os demônios ouviram o toque distante, e foi enervante, como uma lembrança muito enterrada, horrível demais para se enfrentar. Um número demasiadamente elevado deles havia ouvido aquele som antes e agora trazia as cicatrizes que vieram logo após tê-lo ouvido.

O Homem Forte inclinou a cabeça ao redor por um momento.

— Esperem! Fiquem quietos!Destruidor ouviu, mas não queria admiti-lo. Ele pensou imediatamente em seus doze capangas e as hordas que eles haviam conduzido a Ashton. Não era dessa direção que o som estava vindo? Oh, não.

Lá fora, no jardim das ervas, os médiuns estavam arquejando de medo.

— Não... não! — disse o demônio em cima da advogada.

— Não... não! — ecoou a mulher.

— O que e? — disse o cantor loiro.

O demônio que estava em cima do professor de quinta série inventou uma resposta em que ele mesmo não acreditava. O professor ecoou:

— É medo e ignorância, fanatismo e ódio, ainda abundantes no país! Os ventos de mudança precisam soprá-los para longe; precisamos postar-nos diante deles e prevalecer!

— Sim, sim! — replicaram todos. O cantor dedilhou seu violão, e eles puseram-se a balançar com a melodia de ainda outra canção de paz e perfeição globais.

Em Baskon, Mota e Signa explodiram do esconderijo com um grito, espadas refulgindo, asas abrindo-se como o rebentar de ondas, luz branca ofuscando como o sol.

— Pelos santos de Deus e pelo Cordeiro! — gritaram eles enquanto os milharais, os silos, os depósitos, os celeiros, as florestas, as estradas por toda a volta de Baskon explodiam com a luz branca das legiões dos Céus.

Mota gritou, com um toque de júbilo:

— Preparem-se! Começaremos com Ametista!