Em seguida, olhou para Sally
e tornou-se duvidosamente cordial.
— Sally, sempre me considerei
um cavalheiro, um homem de dignidade e honra, e respeitador da dignidade
feminina. Desejo sinceramente um dialogo inteligente e produtivo com você, e
estou certo de que, dada a alternativa, você deseja o mesmo.
— Eu preferiria que fosse
assim — admitiu Sally. Santinelli assentiu com a cabeça.
— Então, tendo concordado
sobre isso, faríamos bem em considerar sua credibilidade como testemunha contra
nós. Parece que se esqueceu do que é.
Sally respondeu simples e
diretamente.
— Sou uma adúltera, uma
assassina de nenê, e uma criminosa condenada. — Eles pareceram pouco à
vontade. Ela respondera àquela pergunta um tanto facilmente demais. — Tenho
sido relembrada sobre isso constantemente desde o dia em que aconteceu, por
sete anos de prisão, por espíritos atormentadores, e pela minha própria
consciência.
Steele disse:
— Sally, esse é um conjunto
de rótulos vergonhoso e repugnante. Ela sorriu, o que chegou a surpreendê-la.
— Na realidade, esses rótulos
são maravilhosos e lindos por causa... — Ela hesitou.
Goring completou a sentença.
— Por causa da Cruz?
Ela animou-se ao ouvir a
pergunta.
— Sim, Sr. Goring.
Surpreende-me que o senhor saiba a respeito disso. Goring deu uma risadinha
sarcástica.
— Sabemos a respeito de uma
porção de coisas, Srta. Roe.
Sally não reagiu de forma
alguma a essa declaração, mas continuou.
— Estou longe de ser
competente em teologia cristã, mas sei que encontrei esse Jesus pessoalmente, e
sei que fui perdoada. Considerando quais foram os meus atos, acho esse fato
animador, inspirador.
Eles não gostaram nem um
pouquinho daquela resposta.
O Homem Forte também não gostou, e soltou um rugido que encheu o prédio e inquietou os demônios. Ele deu uma olhada de esguelha para Destruidor, que olhou para o outro lado.
Santinelli tentou manter-se frio, mas seu rosto estava ficando um tanto rosado.
— Então, devemos entender que
voltou-se para a religião antiquada numa tentativa final de obliterar o
passado? — Ele riu zombeteiramente. — Essa, Sally, é uma ilusão maravilhosa
para os fracos de coração e mente. A idéia de que seus pecados são perdoados é
uma fábula tanto quanto os próprios pecados. Você é deus, Sally; não tem de
prestar contas a ninguém.
— Então, eu deveria estar
livre para ir embora, não deveria?
— Essa é uma questão
secundária — disse Goring, com um aceno da mão — e não tem relação com o nosso
propósito atual. Sally, permita-me ser franco: Mesmo que os pecados fossem
reais e que esse Jesus pudesse salvá-la deles, o que precisa enfrentar neste
momento é que ele não pode salvá-la de nós.
— Eu não presumiria que ele
devesse fazê-lo. Agora Santinelli chegou a erguer a voz.
— Srta. Roe, estou certo de
que sabe que esta sua conversa a colocou em maior perigo ainda. Não poderia ter
feito nada melhor para garantir inimizade entre nós, e mesmo a sua própria
morte, do que se tornando cristã! — Ele inclinou-se para diante e com raiva
controlada apontou um dedo ao rosto dela. — Você se estabeleceu como uma
inimiga suprema neste empreendimento, merecendo o nosso ódio!
Igualzinho à Amber, pensou
Sally. Steele, Santinelli e Goring estão mostrando os mesmos olhos de demônios,
o mesmo ódio diabólico. Ela tomou conhecimento das palavras de Santinelli.
— Eu sei.
O Homem Forte podia ver a paz nos olhos dela, e isso o enfureceu. Bata-lhe!
Santinelli esbofeteou-lhe o rosto.
— Vai nos dizer onde estão as
listas! O que fez com elas?
Krioni e Triskal saudaram Natã e seus guerreiros quando o caminhão de correspondência chegou ao Correio de Ashton.
— Então, tiveram
dificuldades? — perguntou Krioni.
— Um pouquinho — disse Natã.—
Bem, estamos esperando mais outras — disse Triskal.
Armoth seguiu o motorista
para dentro do prédio e observou atentamente enquanto ele colocava o malote
com alguns outros num carrinho de recebimento. Logo a correspondência seria
removida e separada, e aquele seria o momento mais crítico de todos.
Um fuliginoso, heterogêneo bando de diabretes e desordeiros, liderados pelos abomináveis doze repugnantes guerreiros de Destruidor, abriram caminho até Ashton, voando baixo sobre o chão, atingindo grande velocidade, as espadas desembainhadas, os olhos saltados de ansiedade. Essa batalha seria a sua última, pensavam os doze. Seria bom que fosse a melhor.
No Clarim de Ashton, estava na hora de ir buscar a correspondência matutina; Bernice havia colocado o casaco e tinha as chaves do carro na mão, mas não era previsível? Mal ela tinha colocado a mão na maçaneta da porta da frente, o telefone tocou, e era o Eddy, da Padaria do Eddy. O sujeito era a exigência personificada!
— Sim, Eddy, posso dar-lhe
esses cinco centímetros. Bem, sim, de graça, mas apenas um mês para você
experimentar. — Outras perguntas. — Para decidir se você gosta assim e se nós
gostamos assim. Nunca fizemos isso antes, e achei que devíamos tentar. — Ele
continuou falando. Ela fez um gesto na direção da porta da frente. — Não, acho
que podemos aumentar aquela caneca de café um pouco mais e dará muito certo.
Isso, não precisará mudar o seu logotipo. — Ela fez uma careta e revirou os
olhos. — Escute, por que não fala com Cheryl sobre isso? Sim, ela sabe tudo a
respeito.
Ele não queria falar com
Cheryl.
ATACAR! Os espíritos negros atiraram medo e cautela ao vento e desceram sobre Ashton numa torrente de caos e maldade, asas rugindo, enxofre formando trilhas, obscurecendo a luz, entrechocando-se com guerreiros angelicais por toda a cidade. Acima e abaixo nas ruas eles se atiravam, revirando, entrechocando-se, atacando os guerreiros dos Céus com espadas de fogo e ardor, disparando pelo meio do transito, ficando de emboscada nas esquinas, voando através de prédios e criando confusão, guinchando seus brados de guerra, totalmente entregues à tarefa de manter os anjos ansiosos, batalhando, independente do custo, independente da perda. Enquanto os diabretes, atormentadores e desordeiros agitavam a cidade como um turbilhão, os doze de Destruidor partiram atrás daquela carta.
Até que enfim Bernice chegou ao seu fusquinha, mas a porta não se abria. A chave nem chegava a virar na fechadura.
VUPT! Uma faixa de luz atravessou o demônio que havia
estragado a fechadura. Ele se dissolveu.
A chave virou por fim.
Bernice entrou.
Na rua, o sinal encrencou no vermelho
e os carros começaram a enfileirar-se.
Um pequeno sedan foi parando
devagar ao lado do carro de Bernice, e imediatamente uma caminhonete bateu-lhe
atrás. Os dois motoristas saíram de seus veículos e puseram-se a debater numa
longa batalha de desculpas.
Seis anjos voaram ombro a
ombro pela Sexta Avenida enquanto quatro outros mergulharam do céu e
arremeteram pela Rua Miller. Eles convergiram num choque explosivo logo acima
do sinaleiro, arremessando demônios sabotadores a dissolver-se em altos
arcos que formaram uma samambaia de trilhas de fumaça vermelha.
A luz ficou verde.
Mas o trânsito ainda não se
movia, devido ao acidente. Bernice resolveu caminhar.
Sally tentou afundar-se mais no sofá, mas não havia jeito de diminuir a dor do aperto contundente e esmagador que o capanga grandalhão exercia sobre os ombros dela. Ele a estava machucando e deliciando-se com isso.
Steele estava falando baixo e
deliberadamente a fim de certificar-se de que ela o ouvisse; naquele momento
ela parecia bem preocupada com sua agonia.
— Estou certo de que está
familiarizada com os rituais satânicos, por isso eu não deveria ter de dar os
detalhes. Sally, não queremos ver isso acontecer; mas se for preciso,
entregaremos você ao Sr. Kholl e sua gente, e deixaremos que eles façam o pior
com você até que nos diga aquilo que queremos saber.
Sally estava prestes a
responder, prestes a dizer que eles iam matá-la de qualquer forma, mas foi
detida quando algo aconteceu-lhe aos olhos, como se eles se tivessem aberto
pela primeira vez, como se uma escuta cortina tivesse sido puxada para o lado.
Talvez a dor estivesse fazendo com que ela alucinasse.
Ela podia ver os espíritos
por trás desses homens. Eram umas coisas enormes, verrugosas, feias, olhando-a
furiosamente com ódio assassino.Em todas as suas experiências com o oculto, ela
jamais os havia visto tão claramente; jamais havia discernido tanto mal ou
tanto ódio.
Mas ela via que o ódio deles
não lhe era dirigido. Era dirigido ao Salvador que ela trazia dentro de si.
E então ela soube.
Simplesmente soube, e falou, se em voz alta no mundo presente ou se em espírito
em outra dimensão, ela não poderia dizer.
— Vocês estiveram lá! Todos
vocês estiveram lá! Fizeram o pior que podiam com ele... vocês o mataram!
Aquilo perturbou os espíritos.
Eles se entreolharam, indignidade e ultraje enrugando-lhe as caras.
— E ele os derrotou ao
morrer! Ele venceu! — O espírito brutamontes que pairava no alto arreganhou os
dentes e rugiu maldições indiscerníveis contra ela, as asas inflando. Ela olhou
dentro daqueles ardentes olhos amarelos, e para grande surpresa sua, viu medo.
Em seu espírito, ela riu. — E façam o que fizerem comigo, eu já venci!
Ela gritou. Podia sentir toda
a dor novamente. O capanga estava prestes a quebrar-lhe o pescoço. Os espíritos
se desvaneceram com o resto do mundo. Ela já não ouvia, ela já não via. Estava
mergulhando num sonho, numa escuridão sem fim. Santinelli berrou algo, e o
capanga a soltou. Ela pensou que flutuaria do sofá para cima. A dor diminuiu.
Num momento pôde ver e ouvir
de novo, e percebeu que estava quase caindo para a frente. Seus ombros
latejavam. Santinelli estava dizendo algo a respeito de matá-la.
Então Goring disse:
— O dia da conferência vai
começar; vai ter gente passando pelas janelas. É melhor continuarmos isto lá em
baixo.
— Esperem! — disse Sally, e
todos se imobilizaram. Ela tinha a atenção deles. Erguendo a cabeça, ela reuniu
as forças e a coragem, e murmurou debilmente: — Ainda tenho mais um trunfo com
que jogar. Vocês precisam saber que me correspondi regularmente com Tom Harris
de Baskon. Contei-lhe tudo o que sei e tudo o que fiz. Se alguma coisa me
acontecer, existe alguém que saberá.
Goring sorriu, e enfiou a mão
dentro de uma maleta ao lado do sofá.
— Oh, deve estar-se referindo
a estas. — A mancheias, três de cada vez, quatro de cada vez, uma de cada vez,
Goring tirou as cartas da maleta e as colocou empilhadas sobre a mesinha de
centro, danto a Sally uma revelação lenta, torturante. Quando ela havia
adquirido um tom satisfatório de palidez, ele continuou: — Dedicamos grande
quantidade de preparação ao nosso plano, e felizmente conseguimos exercer
influência suficiente sobre a acusadora na ação judicial, que é também a chefe
do correio local. Ela nos tem mandado todas as suas cartas; portanto, nem é
preciso dizer, Tom Harris e seus amigos jamais as receberam. Eles não têm idéia
do seu paradeiro ou do que você poderia saber. Santinelli acrescentou:
— E, sim, temos estado a
observá-los, e é óbvio que têm pouca informação a seu respeito e que estão
atirando no escuro. Eu diria que estão ficando um tanto desesperados. Mas isso
não importa agora, não é? Temos você, e trataremos com você da maneira que
acharmos melhor, que acharmos necessária.
Goring apontou para a mesinha
de centro:
— Portanto, temos você, temos
todas as suas cartas, temos o anel denunciador; está na hora de tratarmos
firmemente dessas listas roubadas. Senhores?
De repente, ela estava
dependurada pelos braços. Ela empurrou com os pés a fim de diminuiu a dor, e
ficou em pé por conta própria.
— Por aqui — disse Goring.
Os homens do Vidoeiro
Quebrado forçaram-na adiante, levando-a na direção de uma escada que levava
para dentro do frio ventre de concreto do chalé. Goring foi à frente, acendendo
as luzes e guiando-os pelas escadas em caracol.
Steele seguia atrás, e depois
dele vinha Santinelli. Kholl seguia no fim da procissão, enfiando a mão no
casaco para pegar a faca.
Então Kholl hesitou.
— Vou-me certificar de que a
porta da frente esteja trancada — disse ele.
Subiu novamente, mas passou
pela mesinha de centro a fim de dar uma boa olhada em todas aquelas cartas. Hmmm.
Excelente!
Pronto, consegui! Bernice olhou o relógio e descobriu que havia levado apenas dez minutos para caminhar até o Correio. Não era tão mau assim. Agora era pegar aquela correspondência.
Bem ao alto, os doze asseclas de Destruidor a viram. Também viram o dossel de anjos sobre o prédio. Eles soltaram um brado e mergulharam para a batalha, as asas guinchando, as narinas soltando trilhas de enxofre.
UUXX! Três deles varreram cinco guerreiros angelicais do
telhado do Correio e os atacaram, revirando, arremetendo, rodopiando,
retalhando. Estariam ocupados por algum tempo.
Dois capangas se atiraram
através da parede norte. Natã e Armoth se abaixaram quando eles passaram,
rebateram-nos com firmeza, e mandaram-nos através da parede sul.
UFA! Quatro outros deixaram-se cair pelo telhado e
golpearam os anjos com garras à mostra. Os demônios levaram em pleno rosto as
asas flamejantes e somente viram as lâminas brandidas tarde demais. Fumaça
vermelha.
O jovem funcionário esvaziou cuidadosamente o malote, separando os pacotes, envelopes, propaganda não solicitada, revistas.
— Oi, Al! — veio uma saudação
do saguão.
— Oi, Bernice! A
correspondência está um pouco atrasada.
— Oh, tudo certo, eu também
estou.
Ah, ali estava alguma
correspondência para o Clarim. Ele a fez escorregar para a caixa do Clarim,
e depois olhou para ver se havia mais.
Quatro capangas explodiram através da parede, asas formando um borrão, Krioni e Triskal encarniçados em seus calcanhares. Uma espada vermelha abaixou-se com ímpeto.
A carta adejou para o chão.
Bernice retirou toda a correspondência da caixa do Clarim e deixou-a cair numa sacola de compras. Ela olhou através da abertura e bradou:
— É só isso?
Al examinou a nova
correspondência que havia chegado.
— É, acho que você pegou
tudo.
— Está bem.
Bernice fechou a porta da
caixa e voltou-se para sair.
Krioni pegou um espírito pelo calcanhar, mas o bicho era tão forte que o arrastou através da parede do Correio e ele teve de soltá-lo.
Triskal levou um violento sopapo de um monstro, deu uma estocada em outro, e chutou um terceiro para fora por cima do balcão.
Bernice não viu o espírito passar voando por ela quando estendeu a mão para abrir a porta.
Natã abaixou-se para apanhar a carta.
Um pé preto, cheio de garras,
pegou-o no peito e arremessou-o até o teto. Outros dois espíritos o cercaram.
Ele rodopiou, a espada estendida, dividindo um, aparando o golpe do outro com
uma explosão de fagulhas.
Krioni voltou, viu a carta e
foi atrás dela. Armoth o cobriu, empurrando para trás dois espíritos, bem em
cima da lamina de Natã.
Krioni fez a espada deslizar
por baixo da carta e a atirou para o ar.
Al não viu Krioni socando dois demônios a fim de tirá-los da frente do funcionário postal, mas viu a carta quando ela pousou no chão, com o endereço para cima.
— Oh, ei, Bernice!
A porta estava para fechar-se
atrás dela. Ela ouviu-o chamando e voltou, abrindo novamente a porta e entrando
de novo no saguão.
Bom! Agora os guerreiros podiam concentrar-se nos demônios. Não devia haver muitos mais — apenas os maiores e mais fortes.
Al entregou a carta a Bernice por cima do balcão.
— Meio grossa. Talvez um
cartão aí dentro ou algo assim.
O coração de Bernice quase
parou quando ela viu a remetente: S. B. Roe.
Em Baskon, Kate entregou o telefone a Marshall.
— Fique alerta, Marshall —
sussurrou ela. Ben e Bev ouviram isso e se aproximaram.
— Quem é?
Marshall falou no aparelho:
— Sim, aqui fala Marshall
Hogan.
— Sr. Hogan — disse a voz no
outro lado — aqui é Debbie Aronson. Trabalho no Correio com Lucy Brandon.
Preciso falar com o senhor.
O saguão do Correio encheu-se de fumaça vermelha quando Triskal arremeteu de espada em riste através de dois espíritos e através da parede até o lado de fora, sacudindo de seus ombros e asas espíritos que se dissolviam.
Bernice abriu a carta
impetuosamente e encontrou a chave de uma caixa postal ali dentro. Caixa 203.
Ali? Naquela agência? Ela deu uma passada rápida de olhos pela carta de Sally
Roe.
Talvez Bernice nem tivesse
notado, mas começou a balançar para cima e para baixo sobre os dedos dos
pés.Marshall agarrou uma caneta enquanto Kate lhe trouxe papel, e ele sentou-se
à mesa da sala de jantar de Ben e Bev.
— Que bom você ter chamado,
Debbie. Gostaria muito de conversar com você.
— Bem, não tenho tanta coisa
assim para dizer. Estou no meu horário de folga, no Restaurante do Don.
— Podemos nos encontrar em
algum lugar, alguma hora?
— Não, não quero me arriscar
a ser vista com o senhor. Escute, deixe-me apenas contar-lhe o que sei e depois
faremos de conta que nunca conversei consigo, está bem?
— Está bem.
Bernice encontrou a Caixa 203. Podia ver uma grande pilha de correspondência através do painel de vidro. Ela enfiou a chave na fechadura, e esta serviu perfeitamente, girando a lingüeta.
— Lucy tem estado a interceptar correspondência; está mandando para outro endereço cartas que tenho a certeza de que não deveriam ser mandadas. Faz semanas que a vejo fazendo isso, e acho que o sargento Mulligan a está amedrontando para que faça isso.
Puxa vida, puxa vida, puxa
vida. Senhor Deus, é esta a solução? Marshall tentou manter calma a voz.
— Muito bem. Você sabe a quem
as cartas eram endereçadas e de quem eram?
Bernice abriu a portinha da caixa postal. O que era tudo isso? Envelopes amarelos, envelopes menores, um pacote marrom simples, uma caixinha embrulhada em papel.
— Eram todos endereçadas a Tom Harris... Marshall podia sentir seus olhos ficando grandes.
— ... E eram todas daquela
mulher que supostamente está morta... Marshall evitou dizer o nome. Debbie
tinha de dizê-lo ela mesma.
— Que mulher, Debbie? Você
sabe o nome?
— Humm, aquela mulher Roe.
Sally Roe.
As mãos de Bernice tremiam enquanto ela removia até o último ítemda caixa postal e enfiava tudo em sua sacola de compras. Não podia esperar para voltar ao escritório.
Natã abaixou-se para escapar da violenta arremetida da espada da fera que sobrara, depois devolveu o ataque forte e rapidamente com sua própria lamina. A coisa afastou-se através da parede, e Krioni a encontrou no lado de fora.
Fumaça vermelha. Era o último
deles.
O resto de Ashton também
estava garantido. O ataque, concentrado no Correio, havia sido enfrentado e derrotado.
Marshall desligou o telefone suavemente, depois reclinou-se na cadeira, jogou a cabeça para trás e soltou um rugido que fez tremer as janelas. Ele não sabia o que dizer, o que fazer, como expressar como se sentia, por isso somente berrou enquanto Kate, Ben e Bev tentavam fazê-lo falar.
— Marshall! — insistiu Kate.
— O que é?
Ele apenas berrou de novo,
erguendo as mãos aos Céus. O telefone tocou novamente. Marshall apanhou-o com
mãos trêmulas. — Sim?
A voz no outro lado mal podia
falar; estava tão fina e espremida que quase sumia.
— Marshall, aqui é Bernice!
Faça o que fizer, sente-se!
Até que enfim, Sally havia ateado fogo ao cerrado.
Natã foi o primeiro a ficar
com as mãos livres. Ele arremeteu aos céus acima de Ashton, abrindo um brilhante
espaço através da fumaça desvanecente da batalha que ora se findava, e levou
uma trombeta de ouro aos lábios.
O toque foi transmitido por
sobre as plantações, sobre os prados, de um lado ao outro do céu; cada
guerreiro angelical podia ouvi-lo e sabia o que significava.
Ainda assim, eles esperavam.
Ainda não. Primeiro Baskon, depois o resto. Eles puseram-se de novo à escuta. O
toque de Baskon viria logo.
No Instituto Summit, os demônios ouviram o toque distante, e foi enervante, como uma lembrança muito enterrada, horrível demais para se enfrentar. Um número demasiadamente elevado deles havia ouvido aquele som antes e agora trazia as cicatrizes que vieram logo após tê-lo ouvido.
O Homem Forte inclinou a
cabeça ao redor por um momento.
— Esperem! Fiquem quietos!Destruidor
ouviu, mas não queria admiti-lo. Ele pensou imediatamente em seus doze capangas
e as hordas que eles haviam conduzido a Ashton. Não era dessa direção que o som
estava vindo? Oh, não.
Lá fora, no jardim das ervas,
os médiuns estavam arquejando de medo.
— Não... não! — disse o
demônio em cima da advogada.
— Não... não! — ecoou a
mulher.
— O que e? — disse o cantor
loiro.
O demônio que estava em cima
do professor de quinta série inventou uma resposta em que ele mesmo não
acreditava. O professor ecoou:
— É medo e ignorância,
fanatismo e ódio, ainda abundantes no país! Os ventos de mudança precisam
soprá-los para longe; precisamos postar-nos diante deles e prevalecer!
— Sim, sim! — replicaram
todos. O cantor dedilhou seu violão, e eles puseram-se a balançar com a melodia
de ainda outra canção de paz e perfeição globais.
Em Baskon, Mota e Signa explodiram do esconderijo com um grito, espadas refulgindo, asas abrindo-se como o rebentar de ondas, luz branca ofuscando como o sol.
— Pelos santos de Deus e pelo
Cordeiro! — gritaram eles enquanto os milharais, os silos, os depósitos, os
celeiros, as florestas, as estradas por toda a volta de Baskon explodiam com a
luz branca das legiões dos Céus.
Mota gritou, com um toque de
júbilo:
— Preparem-se! Começaremos
com Ametista!