— Está-se sentindo bem? —
perguntou ele. Ela sorriu fracamente.
— Oh, para falar a verdade,
acho que estou lutando com um pouco de gripe ou algo parecido.
— Oh, sinto muito. Vamos
continuar esta entrevista o mais rápido possível, então.
Ela não se sentia disposta a
continuar, mas continuou. Tirou a caneta, e se preparou para fazer algumas
anotações.
Lynch pôs-se a falar sem que
nenhuma pergunta fosse feita.
— Como deve saber, Owen
Bennett foi professor de direito aqui por diversos anos, e um bom amigo de
todos nós. Era aventureiro, inovador, inteligente...
Esse comovente tributo a Owen
Bennett continuou por diversos minutos. Sally anotou tudo tão bem quanto pôde,
esperando desesperadamente encontrar algum ponto onde pudesse interromper,
agradecer ao Professor Lynch e dar o fora dali.
O Professor Lynch havia
estado sentado em sua cadeira, voltado leve-mente para longe de Sally, olhando
os livros na parede e falando em sentenças fluídas, os dedos espalhados e as
mãos batendo uma contra a outra, as pontas dos dedos unidas. Agora, sem quase
fazer uma pausa, mas com uma estranha e agourenta mudança de tom, ele voltou a
cadeira para Sally e continuou seus comentários.
— Ora, foi naquele ano em
particular que Owen, tendo completado a estruturação inicial do Conselho Legal
de Consulta e tendo entregue sua administração a gente capaz, assumiu outro
desafio, mais pioneiro ainda, de servir na diretoria consultiva de um novo esforço
visionário: O Centro Ômega para Estudos Educacionais, localizado em Fairwood,
estado de Massachusetts.
Sally anotou aquilo. Percebeu
que ele parou a fim de vê-la anotar.
— Isso veio como surpresa
para algumas pessoas. Perguntaram elas: "Que interesse você poderia ter
num lugar como aquele?" Para um homem da estatura profissional de Owen,
tal papel no conselho consultivo de uma obscura instituição metafísica parecia
uma condescendência.
— Mas essas pessoas não
conheciam Owen como seus amigos mais íntimos conheciam. Aqueles que o conheciam
bem sabiam que era um mestre na política do poder, ele compreendia que o poder
pode ser um bem a ser negociado em troca de favores e mais poder, um suborno
que pode ser passado às pessoas certas a fim de realizar certas coisas que
precisam ser feitas, ou mesmo uma alavanca para controlar a vontade e o
propósito de subalternos ou inimigos profissionais. Ele já era bem recebido na
companhia de legisladores e juizes, executivos de companhias e políticos, todas
as pessoas certas que poderiam fazer as coisas certas acontecerem nos
lugares certos para qualquer pessoa que tivesse influência o suficiente com a
qual negociar. Owen tinha influência, mas aceitar essa posição lhe trouxe mais
influência ainda.
— O Centro Ômega, você
compreende, é um centro para facilitar a mudança em nossa sociedade. Como o
homem pensa, assim é. Mude-se o seu modo de pensar, e se mudará o homem.
Mude-se o modo de pensar de uma sociedade, e se mudará a sociedade. O Centro
Ômega dedica-se a mudar o modo de pensar da nossa sociedade, e portanto mudar a
nossa sociedade, começando com seu segmento mais vulnerável e moldável: as suas
crianças.
— Esse, Srta. Freeman, era o
tipo de coisa que poderia atrair Owen como o mel atrai abelhas. Se uma
instituição tal como o Centro Ômega puder verdadeiramente ter um papel no
controle do que nossa sociedade se tornará, então seria um benefício muito
grande ser uma das pessoas que controlam o Centro Ômega. Owen Bennett tornou-se
um desses controladores, o controlador de um controlador! Agora ele tinha algo
que outras pessoas desejariam ter.Lynch virou a cadeira de modo que ficou
diretamente de frente para Sally.
— Mas, naturalmente, você
sabe tudo isso. É um dos mais simples princípios de sobrevivência neste mundo:
se se quiser progredir, tenha-se amigos em posições elevadas. — Seus olhos se
estreitaram, e um sorriso — parecia malicioso — espalhou-se devagar por seu
rosto. — Como exemplo, lembro-me de uma aluna que tive algum tempo atrás, uma
moça extremamente inteligente que havia de fato passado diversos verões no
Centro Ômega antes de começar seus estudos aqui em Bentmore. Ela veio aqui
altamente recomendada pelo Centro Ômega, e ficamos felizes em dar-lhe atenção
especial. Ela permaneceu aqui até tirar seu mestrado em educação, e então, como
era fácil prever, desejou retornar ao Centro Ômega e fazer parte daquele sonho.
— Felizmente, ela e Owen
Bennett eram amigos muito íntimos, e nessa ocasião, ele estava no conselho
consultivo do Ômega, por isso a posição dela com o Centro Ômega tornou-se uma
realidade instantânea. — Ele riu e reclinou-se sobre os cotovelos. — Por isso, como
vê, assim como ensinei aos meus alunos, é útil ter amigos que podem oferecer influência,
especialmente num campo onde se pode estar mudando a sociedade contra a
vontade desta.
Sally sorriu e rabiscou
algumas notas. Ele apenas se manteve olhando-a fixamente.
Ela terminara. Completamente.
Tudo o que queria era sair dali.
— Muito obrigada por suas
percepções. Eu gostaria de levar isto para casa agora e organizá-lo. Talvez
possa conversar com o senhor novamente?
— Oh, apenas uma outra coisa!
— insistiu ele, indicando-lhe com um gesto que permanecesse sentada. — Sim,
amigos nos lugares certos são importantes, e o poder é definitivamente
uma ferramenta, mas a pessoa precisa lembrar-se de nunca chegar perto demais
dos amigos, porque qualquer arma, qualquer alavanca que se possa usar para
obter poder sobre outros, pode também ser usada para outros obterem poder sobre
a própria pessoa, a menos que ela tome as precauções necessárias. Fiquei
sabendo a respeito de um homem, um jovem advogado habilidoso e promissor, que
permitiu a uma amiga de antecedentes questionáveis ficar conhecendo-o um pouco
bem demais, e mais tarde a amiga tentou usar esse conhecimento como uma
alavanca contra ele. Isso criou uma situação muito sensível! Compreende?
Ela estava na ponta do assento,
pronta a colocar-se em pé e sair dali.
— Bem, sim, como chantagem,
suponho. Ele iluminou-se ante a resposta correta dela.
— Sim, exatamente! Ao se
obter poder sobre outros, nunca se deseja descartar a chantagem como um
alavanca para se obter o que se deseja ou para proteger-se a si mesmo! —
Subitamente, ele enfiou a mão no bolso e tirou uma caixinha de jóia. — Isto foi
o que me levou a sair da sala por uns instantes. Eu sabia que você estaria
interessada.
Ele abriu a caixinha com um
piparote e mostrou-lhe o conteúdo.
Era um anel de ouro. O mesmo
gárgula.
A voz do Professor Lynch tornou-se
mais baixa e sombria.
— Esse jovem advogado
contratou a sua amiga para matar alguém. Sim, isso mesmo, matar alguém,
e pagou-lhe uma grande quantia de dinheiro para fazer isso. Mas ela era sutil e
esperta; roubou-lhe um item muito pessoal, o seu anel sagrado, sabendo que para
sempre depois ela poderia, se precisasse, provar que tinha uma aliança com ele.
Ela trazia o anel em seu corpo quando tentou executar o ato medonho, e temos
bons motivos para acreditar que ela levava o dinheiro consigo também, de modo
que, se alguma coisa desse errado, ela seria encontrada com ele e uma conexão
poderia ser feita com a pessoa que a havia contratado. De qualquer forma, o
anel era idêntico a este e, com o dinheiro, era uma alavanca perfeita para
chantageá-lo e manipulá-lo.
Ele lhe permitiu ver o anel
por apenas um momento, e depois abandonou toda a cordialidade quando
perguntou:
— Você está de posse do anel,
não está?
Ela colocou-se de pé mas
cambaleou, sentindo-se desmaiar, tonta de terror. As palavras não vinham. Não
havia nenhuma palavra.
— Eu... Obrigada, senhor —
disse ela, engolfada por náusea. — Preciso ir-me agora.
Ela dirigiu-se apressada à
porta e escancarou-a.
O homem da sala de espera!
Ele já não estava lendo uma revista — preenchia agora o umbral da porta,
bloqueando o seu escape! Lynch falou cordialmente.
— Este é o Sr. Kholl, um
indivíduo altamente motivado que está agora trabalhando para nós. Sabíamos que
havia uma possibilidade de você vir aqui a seguir, e por isso convidamos o Sr.
Kholl para ficar por perto caso isso acontecesse. Por que não se senta
novamente a fim de podermos completar esta entrevista... Sally Beth Roe?
Kholl inclinou-se na direção
dela. Ela afastou-se até dar de encontro com a poltrona da qual saíra, e então
afundar-se nela.
Lynch sentou-se e fitou-a
furioso por diversos momentos.
— Então, o que Jonas lhe tem
dito estes dias? — perguntou ele por fim. Ela encarou-o pela primeira vez desde
que se sentara. Não parecia haver
motivo para continuar
fingindo. O sotaque do Tennessee desapareceu.
— Ele se foi. Não mais o
canalizei desde que fui para a prisão. Lynch sorriu.
— Imagino que ele achou haver
pessoas mais respeitáveis com quem trabalhar, não vis, miseráveis assassinas de
nenês.Ela olhou para baixo envergonhada e derrotada. Já não sabia como
defender-se.
— A sua história é lamentável
— disse Lynch. — Eu tinha tantas esperanças para você! Eu a treinei, eu mesmo a
refinei, fi-la o que é... desculpe, foi. Você nasceu para ser líder,
Sally. Contávamos com você. Owen estava contando com você. Um potencial tão
maravilhoso, conexões espirituais tão incríveis! — Ele pausou apenas para olhar
o vulto lastimável da mulher. — Mas oh, como você ruiu! Oh, como você caiu!
Talvez fosse o ódio que deu a
Sally força para dizer.
— Acho que não caí suficientemente
baixo. Aquela mulher de quem o senhor estava falando, que roubou o anel do
homem — pelo que entendi foi ela quem tentou me matar?
Ele não se perturbou nada com
aquilo.
— Foi o que ouvi dizer. Mas
isso nos traz de volta à minha pergunta original: O que você fez com o anel que
tirou do dedo de sua atacante?
Ela não pôde pensar em uma
mentira suficientemente boa, por isso não falou nada.
Ele assentiu com a cabeça
ante essa reação.
— Claro. Você não vai me
contar. Como já discutimos, você o pegou como seguro, como... — Ele não pôde
deixar de rir. — Como alavanca! Oh, Sally, como seu professor, sinto-me
condenado! — Ele estendeu a mão e apanhou a caixinha de jóias, olhando o anel
dentro dela. — Bom, bom. Não precisa contar-me. Agora que temos você, o anel
não importa. Mas, realmente... — Ele fitou-a e riu como se tivesse ouvido uma
piada. — Por que você quer ajudar aquele miserável professorzinho de Baskon?
Que bem você poderia possivelmente fazer?
Agora ele deu a volta à
escrivaninha e postou-se acima dela, fazendo-a sentir-se menor ainda.
— Talvez sente-se culpada?
Ora, isso seria muito fora de caráter para você, Sally. — Sua voz abaixou de
tom, e cada palavra cortava como uma faca. — Desde quando a culpa significa
alguma coisa para você, uma prostituta assassina destituída de consciência?
Quanto a Tom Harris, jamais se encontrará uma nulidade mais insignificante! Ele
é lixo, como você! E que pode o lixo oferecer ao lixo? Quem acreditaria numa
palavra que você dissesse? Quem lhe daria crédito por coisa alguma? — Ele riu,
genuinamente divertido. — Mas posso compreender sua paixãozinha pelo homem;
vocês dois constituem um par perfeito: uma assassina de crianças e um pedófilo!
Ele estava tentando
rebaixá-la, e mesmo através de sua fraqueza e tormento, ela estava começando a
ressentir-se disso.
— O que acontecerá agora? —
perguntou Sally.
Ele deu a volta de novo até a
sua poltrona e sentou-se, deixando que ela esperasse por uma resposta.—
Primeiro, um conselho que provavelmente será ignorado, mas talvez não. Sugiro
enfaticamente, Sally, que abandone esta sua aventura, quaisquer que sejam as
suas intenções. Encontre algum outro sitiozinho em algum canto perto de outro
obscuro vilarejo rural, e desapareça — para sempre.
Ele parecia muito
descontraído. Um momento se passou, e nada aconteceu. Nada foi dito.
Sally olhou para ele, depois
ao sinistro Kholl, e depois de volta a Lynch de novo. Ela sentia-se fraca
demais para sair da poltrona; estava impotente com relação à resposta à
pergunta que fez.
— Vão me matar? Ele sorriu.
— Você é mesmo um bichinho
apavorado. Bem, será bom para você. Fornecerá o incentivo para que considere
seriamente suas opções. Existem apenas duas: Encontre um buraco bem, bem fundo
nalgum canto, Sally, e desapareça dentro dele. Não nos deixe ver o seu rosto de
novo nesta vida. Ou, considere a sua vida terminada totalmente, talvez hoje,
talvez amanhã, mas com toda a certeza.
Ele fez um movimento
afirmativo de cabeça para Kholl, que se afastou da porta. Com um olhar furtivo
de volta a Sally, ele a soltou para partir.
Ela abaixou a mão e apanhou a
sacola. Então, empurrou-se para fora da poltrona, encontrou força para o
primeiro passo, depois o seguinte, depois força suficiente para chegar à porta.
— Sally! — chamou Lynch.
Ela não estava disposta a
parar. Kholl assegurou-se de que ela o fizesse.
— Nunca culpe Jonas pelo que
aconteceu. Foi você quem fez aquilo, Sally. A culpa é sua!
— Sei disso, senhor — replicou ela.
— Desapareça, Sally.
Desapareça!
Ela atravessou a porta, e
então encontrou novas forças para apressar os passos pelo corredor até as
grandes portas de vidro. Ela as atravessou.
Então correu. Lágrimas
começavam a inundar-lhe os olhos. Com a renovação das forças, ela percebeu o
quanto estava aterrorizada. Jamais poderia esperar o elevador. Desceu as
escadas.
Tal tinha alguns guerreiros especiais ocupados em uma granja distante. Ele precisava sacudir as coisas numa casa perto do campus de Bentmore.
Marv e Cláudia Simpson
estavam apenas começando a gozar aquela curta estada com a filha e o genro
quando o telefone tocou.
— É o Mack, na granja — disse
Jessica, a filha do casal. Marv franziu as sobrancelhas e tomou o aparelho.
— Muito bem, Mack, conte-me a
coisa suavemente.— Marv — disse Mack — é melhor você voltar. Lizzy está pronta
para dar cria agora!
— Agora? Mas ainda falta uma
semana!
— E deu pane na ordenhadora
automática também. Não sei o que aconteceu com ela!
Marv fez uma careta.
— Oh, que ótimo!
— E o idiota daquele trator
não dá partida por nada deste mundo!
— Caramba! Ed e eu estávamos
planejando ir assistir ao jogo esta noite!
— Bem, a granja é sua. Faça
como quiser.
— Oh, certo, claro, que bela
escolha eu tenho! — Ele olhou para Cláudia, que apenas meneou a cabeça em
triste resignação. — Está bem, estamos a caminho, mas teremos de dirigir a
noite toda.
— Bem, tentaremos defender o
forte até você chegar aqui. Desculpe interromper a sua visita.
— É...
Marv desligou, perguntando-se
porque Deus permitia coisas assim acontecerem em horas tão inoportunas.
Mota estava ali no aposento,
certificando-se de que as coisas acontecessem. Vamos, Marv, depressa com
isso!
Kholl tirou um momento para relaxar na mesma poltrona onde Sally havia sentado, e ouvir o lado do Professor Lynch de uma conversa interurbana.
— Sr. Goring, fiquei
desapontado. Ela dificilmente era o inimigo terrível que parece ser nas cartas.
Uma brisa a teria derrubado. Isso mesmo, — Ele ouviu por um momento, depois
endereçou uma pergunta a Kholl. — Quantos homens você colocou para segui-la?
Kholl respondeu depressa.
— Cinco ao redor do prédio,
cinco outros nas passagens principais do campus.
Lynch levou de volta uma
resposta.
— Bem coberta. Depois de
hoje, a saga de Sally Roe estará terminada. Sim. Avisarei assim que souber. Oh,
e vai querer o anel de volta? — Ele deu uma risada. — Acho que posso sempre
jogá-lo na bacia e dar descarga. Então Bardine e seu anel estarão juntos! — Ele
tirou algum tempo para rir desse gracejo, e aparentemente Goring também estava
rindo.
Kholl riu por cerca da metade
do tempo, depois parou abruptamente. Lynch começou a despedir-se.
— Muito bem, então. Alegro-me
por poder ser-lhe útil. Sim. Dê lembranças minhas a todos no Summit. Sim,
vê-lo-ei na conferência. Está bem. Até logo.Desligou o telefone e reclinou-se
na cadeira.
— Oh, um negócio tão sujo! —
Olhou para Kholl. — Mas suponho que vocês satanistas não se incomodam muito com
isso.
— No fundo, somos todos assassinos,
Professor Lynch.
— Bem, espero apenas que
faça-o depressa, e poupe-me dos detalhes!
— Que pena tê-la deixado ir.
— Não seja tolo. Não quero
que nada aconteça aqui por perto. Não posso permitir que ninguém neste gabinete
suspeite que tive algo a ver com a coisa.
— Bem, talvez tenha pensado
que ela era fraca e indefesa, mas parece que ainda era esperta o bastante para
passar-lhe a perna.
Lynch olhou na direção de
Kholl, depois acompanhou o olhar deste à prateleira que ficava atrás da
escrivaninha.
Kholl anunciou ao mesmo tempo
em que Lynch percebeu:
— Parece que ela levou as
suas listas.
Os quatro volumes que traziam
o estranho símbolo dos gárgulas arreganhados haviam sumido, deixando um buraco
lastimoso.
— Destruidor! — disse Tal, e todos os guerreiros olharam. Sim, lá estava ele, precipitando-se sobre o campus qual enorme gavião preto. — Desta vez, ele a apanhará!
Guilo apontou com sua espada
um enorme vulto preto que se elevava do Prédio da Administração.
— Corruptor! Ele é lerdo, mas
vê bem!
— Mantenha-o ocupado e longe
do nosso negócio! — Então, Tal pôs-se a bradar ordens enquanto guerreiros
arremetiam aos céus em todas as direções. — Scion, chamariscos! Chimon, fique
com ela. Signa, apóie-o! Nathan, Armoth, bloqueiem o ponto de ônibus! Cree e
Si, coloquem proteção!
Lynch agarrou o braço de Kholl. Estava desesperado.
— Kholl, certifique-se de que
seus homens se saiam bem! Eles precisam ser bem-sucedidos!
Kholl olhou para Lynch,
depois para o buraco na prateleira, e deu um sorriso maldoso.
— Humm. O senhor deve estar
bem apavorado.
Destruidor podia ver um vulto diminuto e assustado saindo à toda do Prédio Whitcombe.— Hmm. Então, que tal a sua força agora, Capitão Tal? Faremos com que nos mostre. — Ele gritou aos seus capitães: — Peguem-na!
— Lá está ela! — disse um
homem ao seu companheiro. Ele havia visto Sally sair correndo do Prédio
Whitcombe, dirigindo-se ao sul, rumo ao ponto de ônibus mais próximo. Estava
escuro. Eles a podiam apanhar em qualquer dos jardins, travessas ou arvoredos e
matá-la instantaneamente.
Eram homens grandes,
corpulentos, fortemente tatuados; um tinha uma cicatriz profunda na face
esquerda; ambos usavam um grande brinco numa das orelhas. Debaixo de seus
casacos escuros de couro, carregavam as brilhantes ferramentas prateadas da
morte ritual.
O segundo levou um rádio portátil
ao queixo e resmungou:
— Ela está...
Estava prestes a dizer em que
direção ela se dirigia, mas de repente Sally desapareceu.
Os dois homens pularam de seu
esconderijo e se postaram no meio da passagem. Sally Roe havia sumido.
Cree e Si estavam diretamente à frente deles, asas estendidas. Por trás deles, Sally continuava a correr rumo ao sul.
Um guincho veio do céu! Os
dois guerreiros lançaram um olhar rápido ao sul. Sally estava-se precipitando
por uns degraus, desaparecendo de vista. Acima deles, quatro demônios
guerreiros caíram como falcões. Cree e Si pularam, um deste lado, o outro
daquele, desaparecendo num traço de luz nos prédios dos dois lados da passagem.
Os demônios os perseguiram.
— A mulher! — berrou
Destruidor do céu. — Peguem a mulher!
Os demônios voltearam em
círculos apertados, suas lâminas vermelhas deixando riscas de fogo, e chutaram
os dois homens nas costas. Mexam-se! Por aqui! Então arremeteram pelo
campus, as paredes, as janelas e as passagens um borrão de cada lado deles, as
asas negras guinchando.
Os dois bandidos correram
atrás deles.
— Ela estava rumando para o
sul — bradou o homem pelo rádio.
Corruptor elevou-se acima do campus com a agilidade de um balão de ar quente, observando o incrível espetáculo por todos os lados. Ele viu Sally e apontou.
— Lá! Lá — vocês a estão
vendo?
Um raio de luz surgiu do
nada, atingindo-o com tanta força na cabeça que ele revirou para trás, dando
cambalhotas, como um bola de praia a rodopiar impotente, lastimando-se e
uivando.Guilo sabia que ele estaria afastado por algum tempo. Arremeteu dali
com outras coisas a fazer.
Sally necessitou apenas de
poucos segundos para pular no meio de uns arbustos e apanhar a mochila
escondida. Enfiou a sacola dentro dela e continuou correndo.
Virou uma esquina perto da
Biblioteca de Psicologia, viu o ponto de ônibus iluminado pela luz âmbar de um
poste, arremeteu naquela direção, escorregou e tropeçou parando, e arremeteu de
volta na outra direção.
O ponto de ônibus estava sob
vigilância. De alguma forma, ela sabia quem eram aqueles dois homens.
Corra! disse Natã. Na outra
direção!
Dois outros assassinos de aparência normal estavam a postos perto da Fonte Memorial. Um enxergou através dos diversos jatos verticais de água e detectou a mulher correndo rumo ao norte na direção do Jardim das Esculturas.
— Rumando ao norte! — bradou
ele no seu rádio. — O Jardim das Esculturas!
Sally estava rumando a oeste — não ao norte — na direção do Prédio de Ciências Físicas quando se enfiou atrás de uma árvore a fim de se esconder dos quatro personagens de aparência selvagem que corriam para o norte na direção do Jardim das Esculturas. Assim que eles passaram, ela dirigiu-se a oeste novamente.
— Aonde ela foi? — perguntou um assassino, olhando deste e daquele lado.
O Jardim das Esculturas
continha um número abundante de esculturas esquisitas de pedra e aço, mas
nenhuma fugitiva.
Scion, reassumindo sua própria aparência, alçou vôo e arremeteu do Jardim das Esculturas com quatro morcegos negros encarniçados no seu encalço. Assim que ele passou da altura dos telhados, ainda deixando uma trilha de luz, Si cruzou aquela trilha com sua própria trilha incandescente e atraiu para um lado dois dos demônios. Pelo menos esses urubus estariam ocupados por algum tempo.Correndo, Sally passou pelo Prédio de Ciências Físicas, atravessou uma praça e desceu um longo lance de escada de concreto até a movimentada rua que ficava lá embaixo. Um táxi se aproximava. Ela acenou furiosamente.
— Táxi! Táxi!
Dois homens, parecendo
quaisquer outros estudantes universitários, enxergaram-na e puseram-se a rumar
em sua direção.
O motorista do táxi achou que
viu alguém tentando chamá-lo.
Dois demônios caíram pela
capota e unharam o seu cérebro.
Huh? Eh, ela não está ali...
Agora, aonde era mesmo que eu estava indo?
O táxi passou, desviando-se
de uma faixa para outra, sem diminuir a velocidade. Sally se atirou para dentro
de um beco.
Era um beco sem saída —
apenas paredes de concreto sem escape.
Os dois homens foram-se aproximando
por trás dela, silenciosos, habilidosos. Se se movessem com rapidez suficiente,
poderiam liquidá-la antes que ela tivesse oportunidade de gritar. Um tinha um
longo lenço nas mãos, o outro segurava uma faca faiscante.
Espíritos imundos também se
achavam presentes, dando vivas e espumando, pulando das paredes como bolas de
golfe correndo pela sarjeta. Chegara a hora!
Mota rodava na capota da perua rústica de Marv Simpson enquanto ela deslanchava preguiçosamente pela Avenida Hannan na ponta sul do campus de Bentmore. Quando chegou numa esquina, as asas de Mota explodiram para diante como fogos de artifício e quando Marv percebeu, estava numa faixa em que só podia dobrar à direita e teve de dobrar à direita, dirigindo-se rumo ao lado oeste do campus.
— Que droga — resmungou ele.
— Não era para termos ido na
outra direção? — perguntou Cláudia. Mas ele estava olhando de um lado para
outro, tentando mudar de faixa,
ficando cada vez mais
frustrado.
— Agora, como é que saímos daqui?
Sally retrocedeu até dar de encontro com o concreto puro, liso do fim do beco. Não tinha para onde fugir. Então, o jeito era lutar. Ela ergueu a mochila a fim de proteger-se.
Nenhum som, apenas sombras
borradas à luz dos postes. O lenço atingiu-lhe o rosto, sua cabeça bateu contra
a parede, um olho ficou coberto, ela não podia ver.
Uma faca rebrilhou!Chimon
estava ali e aparou o golpe.
A foca desviou-se e
enterrou-se na mochila.
Um golpe no pescoço dela! Ela
caiu para a frente, agarrando o homem da faca. Ele retirou a lâmina e
mergulhou-a contra ela de novo.
A faca rasgou-lhe o casaco.
Seu grito foi abafado dentro do lenço.
Uma lamina incandescente
abriu o ombro de Chimon. Dois demônios foram pegos pelo golpe oblíquo de sua
espada e se dissolveram.
A faca abriu um talho no casaco
de Sally, mas não lhe atingiu o corpo.
Scion chegou baixo,
desviou-se por baixo de um agrupamento de espíritos que atacava violentamente
com golpes cortantes, e rolou entre as pernas do homem da faca. Este caiu para
trás. A faca retiniu no concreto. Scion havia rolado no meio de uma armadilha
mortal. Retorcendo-se e revolvendo-se, ele conseguiu defender-se da maioria dos
golpes dos demônios, mas uma lâmina violenta pegou-lhe a perna, cortando-a
profundamente.
Chimon agarrava pelo pé um
demônio que berrava, se debatia atabalhoadamente e babava. Ele rebateu os
atacantes de Scion com um golpe poderoso, depois arremessou por cima da cabeça
o corpo agitado e atingiu o rosto do homem do lenço.
O lenço escorregou. Sally
pôde ver novamente. Ela atirou-se para a frente e se livrou.
O homem da faca agarrou-lhe a
manga do casaco.
Signa caiu do céu, traçando
um ponto de exclamação luminoso. Sua espada atingiu a costura do ombro de Sally
e a manga soltou-se.
Ela correu. Viva!
O homem da faca estava
procurando sua faca. O homem do lenço não podia dizer onde se encontrava no
escuro.
Chimon, Scion e Signa estavam
cortados, feridos e mancando, mas agarraram Sally e tiraram-na daquele beco.
Destruidor viu tudo, e berrou
por suas hordas. Os espíritos ajuntaram-se de todos os cantos do campus,
espadas ardendo, asas rugindo, prontas para uma matança. Com Destruidor na
frente de uma maciça formação em forma de ponta de flecha, eles mergulharam
rumo à rua.
Em Baskon, Lucy entrou correndo no quarto de Amber esperando sangue, machucados, um acidente, alguma coisa terrível.
— Amber, o que há? — bradou a
mãe, tentando abraçá-la.
Ela volteou como um animal
selvagem e postou-se longe da mãe, os dedos curvados como garras, o olhar
violento e furioso, arremetendo pelo quarto como se observasse acontecimentos
distantes.
— Cortem essa mulher!
Agarrem, apanhem, cortem-na!Lucy encostou-se na parede e permaneceu ali, muda.
Não havia como fazer Ametista parar quando estava assim. Lucy havia tentado
antes.
Destruidor e suas hordas estavam berrando seu brado de guerra, os hálitos sulfurosos formando serpentinas amarelas que sulcavam o céu como os dentes de um pente.
Marv Simpson procurava um lugar para fazer um retorno e estava cada vez mais frustrado. Mal notou aquela mulher que saiu correndo de um beco.
— Minha nossa — disse Cláudia
— o que está acontecendo aqui?
Tal caiu pela capota e encheu
todo o banco traseiro com seu vulto possante. Pare e pegue-a!
Marv viu-a de novo. Na
verdade, ela corria para a rua.
— Oh — exclamou Cláudia — ela
está vindo na nossa direção!
— Ora, bolas, uma doida
varrida! Temos de sair daqui.
Tal agarrou a cabeça de Marv
em suas duas mãos enormes e forçou-o a olhar na direção da mulher. PEGUE-A!
— Vamos apanhá-la — disse
Cláudia. Ele encostou.
Guilo atirou-se ao céu, flanqueado por Natã, Armoth, Cree e Si. Eles interceptaram Destruidor e seus capangas como um reboar de trovão sobre o campus. Os demônios eram como uma parede irresistível, e os guerreiros angélicos foram revirando e girando para o lado. Destruidor e sua horda prosseguiram em seu curso, caindo sobre a caminhonete de Marv; os cinco guerreiros se recuperaram, deram uma volta, e mergulharam sobre as costas dos demônios como falcões. Os vis espíritos os combateram, mas perderam um tempo precioso para fazerem-no.
— Precisa de carona?
Sally abriu a porta e
jogou-se com dificuldade no banco traseiro.
— Por favor. Tirem-me daqui!
Quatro homens apareceram na
calçada, dois com rádios. Eles a viram entrar no carro e desapareceram
rapidamente. Marv ainda estava perdido.
— Como faço para sair daqui?
— À esquerda, lá na esquina —
disse Sally — e depois passe por dentro do túnel.
— Túnel?
Destruidor e seus guerreiros passaram raspando sobre o topo do Prédio de Ciências Físicas e deixaram-se cair na direção da rua, aproximando-se da caminhonete. Tal e Mota agarravam-se à capota do veículo, espadas prontas, asas cobrindo os passageiros que iam dentro. Então Guilo disparou de uma rua lateral, Natã e Armoth contornaram à toda o prédio de um banco, Scion deixou-se cair de um viaduto, Chimon e Signa ziguezaguearam entre os carros a apenas centímetros acima do asfalto, Si surgiu de um bueiro, e todos eles jogaram-se sobre o carro, cobrindo cada centímetro, as espadas desembainhadas fazendo-o parecer um brilhante porco-espinho.
Era isso, uma batalha direta,
força-por-força!
Mas de súbito,
surpreendentemente, Destruidor saiu de um vôo rasante e os acompanhou a uns
seis metros acima deles, passando por sinaleiros de trânsito, cabos
telefônicos, e placas de ruas, mantendo-os sob vigilância, avaliando a sua
força. A visão do pequeno bando de guerreiros agarrados ao veículo, espadas
desembainhadas para um último ataque, fê-lo rir. Fez seus capangas rirem.
Finalmente ele berrou-lhes:
— Pode chamar a isso de
vitória, capitão. Eu chamo de progresso! Você está mais fraco do que
nunca agora, e a próxima vez será nossa. A fruta estará madura, e a apanharemos
com facilidade! E não se preocupe em escondê-la. Sempre saberemos onde ela se
encontra!
Eles se elevaram para dentro
do céu noturno e estavam desaparecendo na escuridão quando o carro entrou no
túnel.
— E agora? — perguntou
Chimon, segurando o ombro ferido.
— É só dizer, capitão — disse
Scion, segurando a perna imprestável. — Nós o faremos.
— Estamos esgotados — disse
Tal. — Mesmo que tenhamos confundido os homens de Kholl, Destruidor nos poderia
ter vencido, e é apenas pela mão do Senhor que ele não sabia disso. Está na
hora de escondermos Sally em Ashton.
— E deixar que ouça a
respeito da Cruz! — disse Natã.
— Faremos com que ela chegue
lá e deixaremos que o Espírito lhe fale. — Ele acrescentou com raiva incontida:
— Enquanto voltamos a Baskon e eliminamos esse bloqueio das orações de uma vez
por todas!
— Umm — perguntou Marv — para onde está indo? Sally, arquejante, tentava respirar, doente de terror, e suando em bicas. Não estava inteiramente racional.
— Não importa. Qualquer
lugar. Qualquer lugar longe daqui.Cláudia olhou por cima do ombro à miserável
criatura caída sobre o banco traseiro, chorando, arquejando, suando muito.
— Coitada!
Marv olhou-a através do
espelho retrovisor e pôde ver o medo em seus olhos. O Senhor falou-lhe ao
coração. É, não era por acaso que a havia apanhado.
— Bem, acalme-se e tente
descansar. Vamos levá-la bem longe daqui. Conheço o lugar certinho.