Deus sempre quis comunicar-se com o homem. O relato bíblico
sobre a criação do ser humano demonstra, de modo bem evidente, que Deus comunicava-se
diretamente com o ser criado. Sem dúvida, ao por o homem no jardim, para deste
ser o responsável e guardador, Deus lhe deu as instruções necessárias,
fazendo-lhe ouvir sua voz. E o fez, falando diretamente com o ser criado.
Com a Queda, rompeu-se a comunhão com Deus. Antes, sentiam
satisfação em ouvir a voz de Deus, que lhes parecia música suave, pois foram os
primeiros sons que penetraram em seus ouvidos, naquele momento inicial da
criação. A história se repete. Se o homem, e, muito mais, o crente, não zelar
pela comunhão com Deus, o pecado destrói a comunicação com o Senhor. Mas, no
seio da igreja cristã, Deus co- munica-se com seus servos, através da leitura
da Bíblia; através de seus mensageiros, pregadores, ensinadores e líderes,
visando sua edificação. De modo sobrenatural, o Senhor usa pessoas, com os dons
especiais de expressão verbal, ou de elocução, para transmitir sua vontade,
orientações, exortações e direção divina.
Pelo dom de profecia, Deus supre aquilo que a mensagem
costumeira não consegue alcançar. Quantas vezes, no meio da congregação, um
servo ou uma serva de Deus, que tem esse dom, levanta-se e entrega uma mensagem
de exortação, de alerta, ou de edificação para toda a comunidade presente. Via
de regra, a profecia autêntica provoca alegria e glorificação a Deus. Em outras
ocasiões, o dom de variedade de línguas é usado por Deus, com interpretação,
para confortar a igreja ou, equivalendo a uma profecia (com interpretação),
consolar ou edificar o seu povo.
Infelizmente, nos tempos presentes, percebe-se que muitas
igrejas, ditas pentecostais, substituíram a adoração viva e cheia da presença
do Espírito Santo, por um tipo de liturgia social, em que palmas e danças tomam
o lugar da glorificação a Deus. Os dons espirituais são esquecidos, ou nunca
procurados. Não se pode dizer que palmas sejam gestos ilícitos, de modo algum.
Há ocasiões, em que elas cabem bem, na expressão de louvor. Quanto às danças, a
nosso ver, era um costume oriental, bem aceito e praticado entre o povo de
Israel. Mas, no culto neotestamentário, não conseguimos constatar,
biblicamente, que haja espaço para essa expressão corporal. Vemos que a
adoração a Deus, em glórias, aleluias e em línguas estranhas, é muito mais
eloquente para a adoração individual e coletiva. E, quando o dom de variedade
de línguas é praticado, com interpretação, é de grande valor para a igreja.
I - DOM DE PROFECIA (1 CO 12.10)
No Antigo Testamento, havia um “ministério profético”,
reconhecido e considerado por toda a nação. Hoje, não existe esse ministério
nas igrejas cristãs. Existem pessoas ou mensageiros de Deus, que possuem o “dom
de profecia”, usado em determinadas ocasiões, como propósitos definidos, como
veremos mais adiante. Entre os dons ministeriais, objeto de outro comentário,
há dom de “profeta”. No AT, as palavras entregues pelos profetas não admitiam
julgamento, exceto quanto a seu cumprimento. Quando o profeta era de fato
“homem de Deus”, nenhuma palavra deixava de se cumprir (1 Sm 3.19). Se não se
cumprisse, era um falso profeta e era punido com pena de morte (Dt 13.5;
18.20,22). Em o Novo Testamento, os profetas podem ser julgados ou avaliados (1
Co 14.29). Fico a imaginar se houvesse punição para os falsos profetas de
hoje...
O dom de profecia, no Novo Testamento, possui algumas
diferenças, em relação ao ministério profético do Antigo Testamento. Na Antiga Aliança,
os profetas, ou mensageiros de Deus, tinham mensagens dirigidas a todo o povo,
à nação de Israel e, em determinadas ocasiões, a pessoas individualmente, a
reis, a profetas e a quem Deus quisesse enviar sua palavra. Em o Novo
Testamento, a mensagem profética é proclamada, no seio de uma igreja local.
Dificilmente, há uma mensagem para toda a nação. Embora essa hipótese não seja
descartada, Deus age e fala como quer.
Deve-se considerar que a profecia, bem como outras
manifestações do Espírito Santo, é absolutamente necessária nos dias presentes.
Concluir que os dons, os carismas, os milagres, sinais e prodígios, foram
apenas para os dias dos apóstolos, é querer reduzir o poder e a ação do
Espírito Santo a uma matriz teológica, acadêmica e intelectualizada, que não se
coaduna com as afirmações da Palavra de Deus.
1. O QUE É DOM DE PROFECIA
Para entendermos melhor esse dom, precisamos saber um pouco
sobre o significado da palavra profeta e profecia. No Antigo Testamento, a
palavra profeta é navi, (hb. Nãbi') que se refere ao homem que era inspirado
pelo Espírito Santo para entregar as mensagens de Deus para as pessoas (cf. 2
Pe 1.21). A palavra profetizar, no Antigo Testamento, é nãbã isto é, “a função
do verdadeiro profeta quando ele fala a mensagem de Deus para o povo sob a
influência do Espírito Divino (1 Rs 22.8; Jr 29.27; Ez 37.10).'
No Novo Testamento, a palavra grega para profecia é propheteia,
formada de dois termos, depro, que significa “adiante”, “antecipado” e phemi,
“falar”. Assim, nesses termos, profecia significa “a declaração do que não pode
ser conhecido por meios naturais (Mt 26.68), é a descrição antecipada da
vontade de Deus, quer com referência ao passado, presente e futuro (veja Gn
20.7; Dt 18.18; Ap 10.11; 11.3”.2 Profetizar, no grego, se resume numa palavra,
propheteiiein, que significa “falar em nome de alguém, em favor de alguém”.
O dom de profecia é um dom especial, em que seu portador
transmite uma mensagem para a igreja ou para alguém, na inspiração do Espírito
Santo. Não pode ser uma mensagem humana, pessoal da parte do que a transmite,
mas é falada numa linguagem humana. É necessário ter cuidado com as distorções
que podem ocorrer na transmissão da mensagem profética, na igreja de hoje.
Diz a Bíblia: “O profeta que teve um sonho, que conte o
sonho; e aquele em quem está a minha palavra, que fale a minha palavra, com
verdade. Que tem a palha com o trigo? diz o Senhor” (Jr 23.28 — grifo nosso).
Não deve haver mistura da “palha” das “profetadas”, que ocorrem aqui e ali, em
certas igrejas, com o genuíno “trigo” da verdadeira profecia, transmitida por
um servo ou serva de Deus, pela inspiração do Espírito Santo.
Segundo Raymond Carlson, “A profecia, no Novo Testamento,
que difere de uma pregação comum, é uma manifestação sobrenatural, dada para
edificação, exortação e consolação. Através de 1 Coríntios 14.30, entendemos
que o dom nos é dado por revelação através do Espírito”.3 Uma pregação pode ter
caráter profético, mas nem toda pregação é profecia. Raymond Carlson diz que a
profecia, “como seu homônimo dom de línguas, tem de conter elementos de
revelação, conhecimento e doutrina”. Aqui, cabe um esclarecimento. Sem dúvida,
a profecia resulta de revelação espiritual e de conhecimento, concedido por
Deus. Mas não pode trazer nova doutrina, pois tudo o que consta na Bíblia é a
Palavra de Deus, suficiente e necessária para nossa edificação. Quando o autor
citado diz que a profecia deve conter doutrina, certamente quer dizer que ela
tem que ter fundamento doutrinário ou bíblico. A profecia não pode acrescentar
nada à Bíblia.
2. FINALIDADE DA PROFECIA
Como todos os demais dons espirituais, o de profecia tem
propósitos especiais da parte de Deus para a Igreja de Jesus Cristo. Só deve
ser usado de forma correta, com base na Palavra de Deus. “Mas a manifestação do
Espírito é dada a cada um para o que for útil” (1 Co 12.7) ou proveitoso para a
igreja. De maneira bem clara e até didática, o dom de profecia tem três
finalidades básicas, em proveito da igreja: “Mas o que profetiza fala aos
homens para edificação, exortação e consolação” (1 Co 14.3).
1) Edificação
Assim como um edifício de pedras é edificado pouco a pouco,
com a união dos elementos materiais, com a argamassa própria, da mesma forma,
os crentes em Jesus são “edifício de Deus” (1 Co 3.9). A formação espiritual de
um discípulo de Jesus começa com a conversão, mas não para no discipulado
inicial. Deve continuar por toda a vida. Pouco a pouco, o ensino da Palavra e
da doutrina do Senhor vai construindo o caráter cristão no crente.
Mas, às vezes, é necessária uma mensagem especial ou
específica para alguém ou para toda a congregação. E aí que Deus usa um profeta
para transmitir uma mensagem da parte de Deus, visando corrigir ou colocar “no
prumo”, ou “no nível”, alguma área da edificação espiritual. Pastores são
“serventes” ou “servidores” do supremo Arquiteto ou Construtor, que é Cristo.
Não são perfeitos na edificação. Sua mensagem, mesmo com base na Bíblia, carece
de reparos, aqui e ali. Em grande parte das igrejas, pelo país afora, há grande
falta de preparo para o ensino da Palavra de Deus. Há obreiros despreparados
até para os mais elementares ensinos bíblicos. Por misericórdia, o Senhor dá
sabedoria até mesmo a pessoas sem cultura para transmitir sua mensagem, mas, há
ocasiões em que só uma mensagem específica, para determinadas ocasiões, pode
suprir o que é indispensável para a edificação do Corpo de Cristo, no que
respeita à igreja local.
2) Exortação
Exortar tem o sentido de “chamar para fora”, para orientar, ajudar e ensinar. Deriva da palavra grega parakalao, que tem o sentido de confortar, inspirar, defender e guiar. Exortar não tem o sentido distorcido, entendido por alguns, de que significa ameaçar, intimidar, ou causar pavor, na igreja. O verbo grego parakalao tem origem em outra palavra de muito significado, Paracleto, que significa Consolador, o título que é dado ao Espírito Santo (cf. Jo 14.16; 15.26). Por isso, Paulo ensina que quem exorta deve fazê-lo “com toda a longanimidade e doutrina” (2 Tm 4.2).
Uma mensagem profética ajuda a entender como aplicar a
Profecia Maior, que é a Bíblia Sagrada, para os dias presentes, quando surgem
problemas, situações e circunstâncias, que não existiam, quando a mensagem
bíblica foi escrita. Sem o ensino da Palavra de Deus e da mensagem profética,
há uma tendência para a ocorrência de desvios de conduta e distorções perigosas
no meio das igrejas locais. Diz Provérbios: “Não havendo profecia, o povo se
corrompe...” (Pv 29.18a).
As inovações e modismos têm tomado conta de muitos redutos
pen- tecostais. A chamada “teologia da prosperidade” tem causado grandes
estragos, com sua filosofia utilitarista dos dons e da Palavra de Deus. O
evangelho antropocêntrico tem dado ao homem a primazia nas decisões e
ensinamentos de muitos líderes. Aberrações teológicas ou práticas estranhas têm
ocorrido, em certas igrejas. A “unção do riso”, “a unção do leão”, “a urina
ungida”, inventada por determinada igreja (os crentes saíram urinando, nas
esquinas e ruas de uma cidade, para “marcar território”), para o pecado
diminuir. Em lugar disso, a pecaminosidade tem aumentado; certo pregador,
“celebridade” pregou que seu suor era ungido, pois seu DNA era ungido. Com
isso, levou muito dinheiro dos irmãos, além do “cachê polpudo”. Nada disso tem
fundamento bíblico. São ensinos heréticos, que têm grande aceitação no meio de
igrejas e atraem muitos crentes que não conhecem a Palavra de Deus.
Deus disse, no Antigo Testamento: “O meu povo foi destruído,
porque lhe faltou o conhecimento; porque tu rejeitaste o conhecimento...” (Os
4.6). Essa palavra aplica-se de modo bem atual, ao que está ocorrendo no meio
dos evangélicos.
3) Consolação
O Espírito Santo é chamado de “O outro Consolador” (cf. Jo
14.16). Ele é o parakleto prometido por Cristo. Por isso, também usa o dom de
profecia, para transmitir mensagem de consolação aos servos de Deus. Já vimos
que o verbo parakaleo (gr.) significa consolar, confortar. E o que podemos ver
em Barnabé, amigo de Paulo (At 4.36; ver Rm 15-4,5; 1 Co 14.3; 2 Co 1.3,4-7)).
Consolação vem deparaklesis (gr.) e tem o sentido de “consolar”, “dar alegria”,
dar “paz”. Paulo diz que todos os crentes podem profetizar (se Deus conceder
tal dom), visando a consolação da igreja: “Porque todos podereis profetizar,
uns depois dos outros, para que todos aprendam e todos sejam consolados” (1 Co
14.31 — grifo nosso).
Muitas vezes, infelizmente, o zelo exagerado de alguns
ministros, com a palavra e as normas da igreja local faz com ele se torne
agressivo, intolerante e radical. E esquecem que, no meio da congregação, há
dezenas de pessoas que estão experimentando momentos difíceis e dolorosos em
suas vidas. E estão precisando mais do que nunca de ouvir uma palavra de
consolação. A exortação pesada, às vezes, é necessária. Mas fazer uso do
púlpito para chicotear as ovelhas, indiscriminadamente, é falta do espírito de
consolação.
O Espírito Santo é o mesmo. Ele consolava no Antigo
Testamento (SI 23.4; Is 51-12) e continua consolando na Dispensação da Graça (2
Co 1.4; 7.6). Faltaria espaço literário, sem dúvida, se pudessem ser
registradas todas as mensagens de consolação que Deus tem dado à sua Igreja, no
Brasil e em todos os lugares do mundo. Em cultos de oração, nos círculos de
oração, em tantos lugares; em reuniões informais de oração, Jesus tem
confortado seus servos, principalmente os que sofrem por causa do seu Nome e do
evangelho. “O Dom de Profecia, portanto, serve para falarmos sobrenaturalmente
aos homens, assim como o Dom de Línguas serve para falarmos sobrenaturalmente a
Deus”.'1
3. ERROS A SEREM EVITADOS NO USO DO DOM DE PROFECIA
1) Usar a profecia para guiar a igreja
A mensagem através do dom de profecia tem como finalidade:
“exortação, edificação e consolação” (1 Co 14.3). Não tem por objetivo guiar ou
direcionar a administração da igreja local. A Bíblia Sagrada, a Profecia por
excelência, é o manual da Igreja e tem todas as orientações sobre a
administração espiritual, humana e material da igreja cristã. Vemos, em Atos
13.1-3, que, quando Deus quis enviar missionário, O Espírito Santo se dirigiu
aos líderes, como Barnabé, Simeão (Níger), Lúcio de Cirene, Manaén e Saulo. Não
se dirigiu a “um profeta” em particular.
2) Usar o dom de profecia como um “oráculo”
Tendo em vista a finalidade da profecia, não é correto o
crente só fazer as coisas se consultar um profeta. Essa prática tem endeusado
irmãos ou irmãs, a quem Deus deu o dom, para se tomarem verdadeiros “gurus” de
determinadas pessoas. Há exemplos de profetas, nas igrejas, cujo lar se
transformou em lugar de verdadeira romaria. Há, até, os que praticam a simonia
(At 8.18), profetizando para receber ofertas dos que lhe procuram. Deus pode
usar, e tem usado, homens e mulheres de caráter cristão ilibado, para consolar
e orientar casos específicos de pessoas que precisam de uma palavra específica
para eles. Mas é preciso cuidado. A profecia é para o proveito da igreja e não
de domínio particular.
3) Usar o dom de profecia como fonte de doutrina
É completamente errado e contraria a Palavra de Deus. A
fonte por excelência de doutrina é a Palavra de Deus. Nenhuma profecia pode
acrescentar ou retirar o que já foi revelado nas Sagradas Escrituras. Quem o
fizer, incorre no perigo de ser punido por Deus. “Porque eu testifico a todo
aquele que ouvir as palavras da profecia deste livro que, se alguém lhes
acrescentar alguma coisa, Deus fará vir sobre ele as pragas que estão escritas
neste livro; e, se alguém tirar quaisquer palavras do livro desta profecia,
Deus tirará a sua parte da árvore da vida e da Cidade Santa, que estão escritas
neste livro” (Ap 22.18,19).
4) Usar o dom de profecia deforma descontrolada
O dom de profecia deve ser usado, na igreja, com decência e
ordem. Diz Paulo: “Portanto, irmãos, procurai, com zelo, profetizar e não
proibais falar línguas. Mas faça-se tudo decentemente e com ordem” (1 Co 14.39,
40). A igreja em Corinto, como já vimos, possuía todos os dons, operando em seu
meio. Talvez por isso, houve que se achasse mais importante ou santo do que os
outros que não possuíam dons, e achavam-se no direito de usar os dons como bem
entendessem. Por isso, o apóstolo exortou quanto à necessidade de ordem e
decência no culto.
Quando este autor liderava a juventude, há quase 30 anos,
aconteceu um fato constrangedor, mediante o uso do dom de profecia. Um grupo de
jovens e adolescentes passou a reunir-se em casa dos colegas, e passarem noites
inteiras em oração e vigílias. Em princípio, com o consentimento dos pais, não
haveria nada a se reprovar. No entanto, aquele grupo passou a considerar-se
porta-voz de Deus, e a considerar os que não faziam parte dele como carnais,
inclusive este que escreve este texto. Em pouco tempo, aqueles jovens
estavam-se sentindo autossuficientes, e não davam mais satisfação à igreja e
muito menos à direção da mocidade.
Um dizia que Deus estava mandando ir à casa de um irmão para
levar uma mensagem. Outro dizia que Deus lhe falara para irem a outro estado,
para dar uma mensagem para um pastor. Em certa ocasião, na casa de um do grupo,
os jovens se deitaram no chão, rapazes com as moças, e passaram a noite em
vigília. Em dado momento, uma jovem começou a “ser usada em profecia”. E falou
para um jovem: “O teu noivado não é do meu agrado. A que tenho preparado para
ti é o vaso que estou usando”. Se o jovem que ouvira a mensagem não tivesse
convicção do seu noivado teria acabado o relacionamento com sua noiva, com quem
se casou e vive muito bem.
II - VARIEDADES DE LÍNGUAS (1 CO 12.10)
O fenômeno pentecostal do falar em línguas estranhas (gr.
glosso- lalia) tem dois aspectos. O primeiro é o falar línguas estranhas como
evidência do batismo com o Espírito Santo. O segundo é o dom de variedade de
línguas.
1. EVIDÊNCIA DO BATISMO COM ESPÍRITO SANTO
Os discípulos só entenderam que “o outro Consolador” (Jo
14.6) ou revestimento de poder (Lc 24.49) houvera sido enviado, no Dia de
Pentecostes, quando foram envolvidos no mover do Espírito Santo, com evidências
exteriores e perceptíveis, que marcavam a nova fase na História da Igreja do
Senhor Jesus. Os “cessassionistas”, que ensinam que os dons espirituais foram
apenas para o período dos apóstolos afirmam que o batismo com o Espírito Santo
é a própria salvação. Respeitamos os irmãos de outras denominações que creem
assim, mas discordamos dessa teologia “cessassionista” por não se harmonizar
com o que o Novo Testamento ensina sobre o batismo com o Espírito Santo. A
Igreja de Jesus, hoje, mais do que nunca, precisa do revestimento de poder do
Espírito Santo e da manifestação dos dons espirituais.
Em suas últimas instruções, antes da Ascensão, Jesus disse
aos discípulos (que já eram salvos), que eles receberiam um novo batismo:
“Porque, na verdade, João batizou com água, mas vós sereis batizados com o
Espírito Santo, não muito depois destes dias” (At 1.5). Note-se que o verbo
“ser” está no futuro: “sereis”. Eles sentiram que foram “cheios do Espírito
Santo”, quando falaram línguas estranhas a si próprios: “E todos foram cheios
do Espírito Santo e começaram a falar em outras línguas, conforme o Espírito
Santo lhes concedia que falassem” (At 2.4). Nesse aspecto, as línguas náo
precisam de interpretação. O crente pode falar só com Deus (cf. 1 Co 14.2-28).
E pode ser dado a todos quantos buscarem o batismo com o Espírito Santo.
O movimento pentecostal não é propriamente moderno. Ao longo
da História da Igreja, Deus levantou crentes fiéis, que desejavam ver a igreja
local movida pelo poder de Deus. Em 1834, um ministro presbiteriano, Edward
Irving encorajava o falar em línguas em sua denominação. Numa colônia de
mórmons, de Nauvoo, Illinois, em 1855, os crentes criam “no dom de línguas,
profecia, revelação, visões, cura, interpretação de línguas. Em 1873, nas
campanhas de Deight L. Moody, ele encontrou grande avivamento, na Associação
Cristã de Moços. Robert Boyd declarou: “encontrei a reunião em fogo. Os jovens
estavam falando em línguas e profetizando. Que significaria isso? Somente que
Moody pregara para eles naquela tarde. Em 1875, houve batismos com o Espírito
Santo, em Providence, Rhode Island. O pastor R. B. Swan declarou: “No ano de
1875, nosso Senhor começou a derramar sobre nós de seu Espírito; minha esposa,
eu e alguns poucos outros começamos a proferir algumas poucas palavras na
língua desconhecida”.5
Os que resolveram examinar a Bíblia sem preconceito
teológico descobriram que o batismo com o Espírito Santo, com evidência de
línguas estranhas, não foi só para o período apostólico. No ano de 1900, o
jovem obreiro metodista, Charles E Parham entendeu que seu ministério precisava
de algo novo. E, reunindo algumas pessoas, começou a pesquisar o livro de Atos
dos Apóstolos. E descobriu que o batismo com o Espírito Santo era o que faltava
para experimentar o avivamento. Alugou um casarão náo concluído, em Topeka,
Estados de Arkansas, EUA, e transformou num lugar de oração e busca pelo poder
de Deus.6
Foram tantas as pessoas batizadas com o Espírito Santo, com
línguas estranhas, que o movimento inusitado começou a espalhar-se. Em alguns
lugares, teve ferrenha oposição. Em outros, foi bem aceito como algo que
faltava ao evangelismo americano. Pessoas foram curadas milagrosamente, outras
receberam dons do Espírito Santo. Num culto, um índio Pawnee entendeu a
mensagem que uma irmã entregava em sua língua.
Depois, Parham levou a mensagem pentecostal para Houston,
Texas. Ali, entrou em cena W. J. Seymour, que, recebendo a mensagem, levou-a
para Los Angeles, Califórnia. Ali, sofreu o mesmo que Parham. Aceitação e
rejeição ferrenha. Mas em 9 de abril de 1906, as pessoas começaram a ser batizadas
com o Espírito Santo. O local de reunião ficou pequeno, e ele se mudou com o
grupo de crentes para a Rua Azuza, 312, que se tornou lugar histórico para o
movimento pentecostal moderno. Espalhou-se pelo mundo e chegou ao Brasil em
1911, com os missionários Daniel Berg e Gunnar Vingren, que se fixaram em Belém
do Pará, onde as mesmas características do Pentecostes tiveram lugar. As
pessoas falavam em línguas estranhas, e recebiam dons espirituais, sob a unção
do Espírito Santo.
2. O DOM DE VARIEDADES DE LÍNGUAS
Difere das línguas como evidência do batismo com o Espírito
Santo. Não é um dom dado a todos os que quiserem. Assim como os outros dons, é
dado “a cada um” como o Espírito quer (cf. 1 Co 12.11,30). Também não é uma
capacidade aprendida humanamente. Diz Carlson: “Falar em línguas é expressar-se
com palavras que nunca aprendemos, mas que nos são comunicadas diretamente pelo
Espírito Santo. Não se manifesta através de palavras pensadas de antemão ou
vocalizadas pela pessoa que fala”... “As línguas constituem um milagre vocal e
não um milagre mental. A mente se faz espectadora, e os ouvidos a atendem...”
2.1. A FINALIDADE DO DOM DE VARIEDADE DE LÍNGUAS
Com base na Palavra de Deus, podemos dizer que o dom de
variedade de línguas tem finalidades múltiplas:
1) Edificação da igreja
Como vimos, os dons não são dados para promoção pessoal de
quem os possui. Todas as manifestações espirituais, concedidas pelo Espírito
Santo, são para a edificação no seio da igreja cristã. Paulo diz que todos os
dons devem contribuir para a edificação da igreja: “Que fareis, pois, irmãos?
Quando vos ajuntais, cada um de vós tem salmo, tem doutrina, tem revelação, tem
língua, tem interpretação. Faça-se tudo para edificação” (1 Co 14.26). Essa
exortação tem caráter atualizadíssi- mo para os dias presentes.
Desse modo, uma finalidade fundamental do dom de variedade
de línguas é “transmitir à Igreja uma mensagem em línguas, e, por isso, precisa
de interpretação para que aquela seja edificada. Essa interpretação é feita
pelo dom de interpretação de línguas”.8 Trata-se de um milagre, pois quem fala
as línguas bem como quem as interpreta não as conhece. “Trata-se de uma língua
verdadeira, seja de homens ou de anjos (cf. 1 Co 13.1), conforme o Espírito
Santo concede que se fale (cf. At 2.4)”.9
2) Edificação pessoal
A variedade de línguas pode ser útil para a edificação
pessoal. Paulo ensina sobre isso de maneira bem clara: “O que fala língua
estranha edifica-se a si mesmo, mas o que profetiza edifica a igreja” (1 Co
14.4). No caso de o crente falar línguas, para sua edificação pessoal, não há
necessidade de interpretação. “Mas, se não houver intérprete, esteja calado na
igreja e fale consigo mesmo e com Deus” (1 Co 14.28). Ê um dom valioso para a
edificação pessoal. O crente, cheio do Espírito Santo e edificado por Deus,
pode ser usado nas reuniões para a edificação da igreja, através do dom de
interpretação de línguas.
Daí, a necessidade da busca pelo dom de interpretação:
“Assim, também vós, como desejais dons espirituais, procurai sobejar neles,
para a edificação da igreja. Pelo que, o que fala língua estranha, ore para que
a possa interpretar” (1 Co 14.12,13). Dessa forma, fica bem claro que o dom de
variedade de línguas pode servir para a edificação da igreja, desde que haja
interpretação sobrenatural, concedida pelo Espírito Santo.
3) Glorificação a Deus
O livro de Atos dos Apóstolos registra o episódio da ida de
Paulo à casa do centurião Cornélio, por revelação do Espírito Santo (cf. At
10.3-8; 18-20). Os judeus tradicionais que se encontravam ali ficaram
maravilhados, pois ouviam as pessoas falando línguas estranhas em adoração a
Deus.
Na descida do Espírito Santo, no Dia de Pentecostes, as
pessoas de diversas nações, ali presentes, ouviam os apóstolos, após o batismo
com o Espírito Santo, “falar das grandezas de Deus” (At 2.11). Nada mais
natural, essa finalidade, pois Jesus disse que enviaria o Espírito Santo com a
missão de anunciar a Cristo, e glorificar ao Senhor: “Ele me glorificará,
porque há de receber do que é meu e vo-lo há de anunciar” (Jo 16.14). Se um dom
não glorifica a Cristo, em sua manifestação, não deve ser considerado
proveniente do Espírito Santo.
4) Comunicação sobrenatural da parte de Deus
Gordon Chown relata o caso, ocorrido em 1906, de uma jovem
suíça, da área de fala alemã, chamada Maria Gerber, que foi para os Estados
Unidos, para estudar num Instituto Bíblico. Seu irmão foi esperá-la, no porto,
e, de imediato convidou-a para ir orar por um amigo doente. Ela se recusou de
pronto, dizendo que não faria nada no país, antes de aprender a falar inglês. O
irmão deixou-a em casa, e foi fazer a visita sozinho. Mas o Espírito de Deus
inquietou a jovem Maria, fazen- do-a sentir que não consultara a vontade de
Deus.10
Ela de imediato, saiu pelas ruas, com o endereço que fora dado
pelo irmão, e, sem saber uma palavra em inglês, perguntava aos guardas como
chegar lá. Foi muito difícil, mas conseguiu chegar à casa do do ente, onde seu
irmão já estava. E começou a orar em alemão pelo enfermo para que Jesus o
curasse. Porém, o sobrenatural aconteceu. Ela foi tomada pelo Espírito Santo, e
começou a orar em inglês perfeito, e o doente foi curado de imediato. Não só
isso, mas Maria recebeu o dom de variedade de línguas, e passou a falar inglês
fluentemente, realizando seus estudos sem dificuldades, e orando pelos que
precisavam de sua ajuda.
Dizer que esse dom foi apenas para a época dos apóstolos é
sem dúvida um preconceito contra o próprio poder ilimitado do Espírito Santo.
5) Sinal para os descrentes
Praticamente, todo o capítulo 14 da primeira carta de Paulo
aos coríntios se refere ao uso dos dons, nas reuniões da igreja local. Ali, ele
orienta quanto à ordem e aos cuidados no uso dos dons. Com relação ao dom de
línguas, ou variedade de línguas, ele diz que o falar línguas, na congregação,
deve ser acompanhado da interpretação de línguas para que a igreja possa ser
edificada (1 Co 14.13-17). As línguas servem para edificação da igreja, desde
que sejam interpretadas para toda a congregação. E também servem de “sinal”
para os não crentes, da mesma forma, se houver interpretação profética.
2.2. EQUÍVOCO QUANTO AO BATISMO COM O ESPÍRITO SANTO E O DOM
DE LÍNGUAS
Intérpretes da linha “cessacionista” entendem que, assim
como o batismo com o Espírito Santo, com sinais de línguas estranhas, foi
apenas para o período apostólico, os dons espirituais também perderam sua
necessidade e valor para os dias presentes. Jean Jacques Dubois" afirma
que a crença no batismo com o Espírito Santo, como “uma segunda bênção”,
distinta da salvação, é “confusão doutrinária” e “obra do Diabo”. Para ele, a
confusão se dá pelo desconhecimento das expressões “batizados no Espírito
Santo” e “cheios do Espírito Santo”.
Esse autor diz que “nenhum versículo da Escritura exorta o
cristão a ser ‘batizado com o Espírito’, o que seria um contrassenso!”. Ele
incorre no erro de muitos intérpretes da Bíblia que fazem eisegese, ao invés de
exegese. No primeiro caso, procura-se adaptar o texto bíblico ao que se quer a
partir de ideias preconcebidas e cristalizadas como doutrina. No segundo, o que
é correto, procura-se extrair do texto bíblico o que de fato o escritor queria
dizer ao escrevê-lo. Isso se faz através da Hermenêutica cristã, que nos ajuda
a interpretar a Bíblia de modo correto. O autor cessassionista diz que nenhuma
exortação existe para que se busque o batismo com o Espírito Santo.
Mas o que Jesus disse aos discípulos? Que eles seriam
batizados com o Espírito Santo (At 1.4,5). E acrescentou, respondendo a uma
pergunta dos discípulos sobre a restauração de Israel: “Mas recebereis a
virtude do Espírito Santo, que há de vir sobre vós; e ser-me-eis testemunhas
tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até aos confins da terra”
(At 1.8).
O referido autor não dá o menor valor aos escritos do livro
de Atos dos Apóstolos. Ele critica os pentecostais dizendo: “E impressionante
ver que a argumentação dos escritores pentecostais se apoia em grande parte no
livro de Atos e em modalidades de experiências de indivíduos ou de grupos de
indivíduos'. Para ele, o fundamento dos escritores pentecostais “é tirado de um
livro que contém mais história que um ensino” (grifo nosso).12 Esquece o autor
crítico que esses “indivíduos” e “grupos de indivíduos”, que são exemplos
claros de batismo com o Espírito Santo, com línguas estranhas, não são
“indivíduos” quaisquer. Seus exemplos, da experiência pentecostal, são
fundamento para a doutrina do batismo com o Espírito Santo.
A partir dessa visão limitada e distorcida sobre o batismo
com o Espírito Santo, Dubois rechaça a atualidade dos dons espirituais. Para
ele, a igreja do século XX e do século atual não precisam mais das
manifestações do Espírito Santo, através dos nove dons de 1 Coríntios 12. Ele
passa de largo na questão dos dons espirituais. Em todas as páginas de seu
livro, apenas se refere aos dons, e assim mesmo, enfatizando os aspectos
negativos, ocorridos na igreja dos coríntios, onde havia “desordem e divisão”.
Ele considera os dons como “experiências especiais” apenas para os apóstolos,
visto que esses não tiveram sucessores, pois viveram num “tempo de transição”.
Mas não fundamenta sua interpretação crítica em qualquer dos versículos do Novo
Testamento.
Segue os ensinos dos teólogos cessacionistas, que ignoram o
valor e a atualidade dos espirituais.
III - INTERPRETAÇÃO DE LÍNGUAS (1 CO 12.10)
Já vimos que o dom de línguas propicia mensagens de
edificação para quem o possui e que, para a edificação da igreja, necessita de
interpretação. E isso é possível, através do dom de interpretação de línguas.
Essa concomitância, entre os dois dons não havia no Antigo Testamento.
1. O QUE É O DOM DE INTERPRETAÇÃO DE LÍNGUAS
O pastor Antônio Gilberto ensina que “É um dom de
manifestação de mensagem verbal, sobrenatural, pelo Espírito Santo. Não se
trata de “tradução de línguas”, mas de “interpretação de línguas”.13 O dom de
línguas prescinde do dom de interpretação de línguas, para que seja útil para a
edificação da igreja. Paulo deu precioso ensino à igreja de Corinto sobre o uso
dos dons. Ao que parece, o dom de línguas era muito usado, mas sem o necessário
equilíbrio espiritual e emocional.
Esse dom deve andar lado a lado com o dom de línguas, no
seio da igreja cristã. São “dons geminados”. Gordon Chown diz que “A
interpretação é tão milagrosa quanto a própria Língua — e isto quer dizer que
quem possui o Dom de Línguas não vai procurar decifrá-la com a mente, mas sim,
pede e recebe a Interpretação da mesma fonte divina de onde surgiu a Língua”.14
Isso não quer dizer que o dom de interpretação de línguas é outro tipo de dom
de profecia.
A profecia é autossuficiente em sua ação para quem a ouve. O
dom de interpretação de línguas depende da mensagem em línguas, para que tenha
eficácia.
2. FINALIDADE DO DOM DE INTERPRETAÇÃO DE LÍNGUAS
Como é óbvio o que o nome diz, a finalidade principal é a
interpretação da mensagem, transmitida à igreja, através do dom de línguas. No
culto pentecostal, deve haver sabedoria e humildade no uso dos dons. Não é
comum haver quem tenha os nove tipos de dons. Normalmente, o Espírito distribui
“a cada um como quer”. Quanto mais dons houver numa igreja local, maior será
sua edificação espiritual. A Palavra de Deus é a fonte primária e mais
importante para a edificação do crente. Mas, como vimos, os demais dons também
contribuem para a edificação da igreja.
Conclusão
Os dons de elocução têm grande efeito na transmissão da
mensagem da parte de Deus para os crentes nas igrejas locais. Paulo diz que os
dons devem ser procurados, pois ele sabia o valor das manifestações espirituais
para a vida dos crentes de sua época. Ainda que haja pessoas, em diversas
igrejas, que não aceitam a atualidade do batismo com o Espírito Santo e dos
dons espirituais, graças a Deus, a realidade dos dons, nas igrejas cristãs que
aceitam o Pentecostes hoje, têm sido beneficiadas pela presença do poder do
Espírito Santo em seu meio. Historicamente, são as que mais crescem,
numericamente, em graça e unção de Deus. Oremos para que o avivamento não se
apague, no meio das igrejas cristãs, até a Volta de Jesus.