segunda-feira, 10 de maio de 2021

O discipulo - Capítulo 06

Amor ao Próximo 

Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. (Lv 19.18.) 

O primeiro degrau na escala do amor é o mínimo requerido, é o tipo de amor  apresentado no Velho Testamento. Este mandamento não é apenas para a Igreja,  naturalmente. Ele tem âmbito universal. Ele é parte da Lei moral de Deus; se todos os homens  do mundo amassem alguém, então todos seriam amados e todos estariam amando. 

Qual é o significado deste mandamento? Ele significa que devo desejar para o meu  próximo aquilo que desejo para mim mesmo. E devo empregar, em favor do meu próximo o  mesmo esforço que emprego para a obtenção de bens para mim. 

Se eu tenho um prato de comida e meu próximo não tem, amá-lo implica em empregar  em seu favor o mesmo esforço que empreguei em obter alimento para mim. Se isso não for  possível, então devo dar a ele metade do que eu possuo. Se eu tenho duas mudas de roupa e  ele não tem nenhuma, devo fazer um esforço para conseguir-lhe duas mudas de roupa, do  mesmo modo como me empenhei para mim mesmo. Se meus filhos estão bem alimentados e  freqüentando uma boa escola, e os dele não estão, tenho que fazer por seus filhos o mesmo  que faço pelos meus. 

Ê isto que significa amar o próximo como a si mesmo. Sabe de uma coisa? A maioria  dos crentes não está cumprindo nem mesmo este mandamento do Velho Testamento. Não  estamos amando uns aos outros como a próximos. 

E, naturalmente, Jesus disse que deveríamos amar uns aos outros não como próximos,  mas como irmãos. Mas se os amássemos pelo menos na igreja, como próximos, isto daria  início a uma revolução. Em toda congregação cristã, existem pessoas que têm demais e  pessoas que não têm nada. Um crente tem um belo carro e mora numa casa grande e bonita, e  se assenta à mesa para comer peru e carne assada. E eles, todos juntos, cantam hinos que  falam sobre o amor e como se amam mutuamente. E quando o culto termina, dizem uns para  os outros: "Deus o abençoe, irmão!" e depois cada um vai para sua casa. 

Quando perguntaram a Jesus: "Quem é o meu próximo?" ele respondeu narrando a  parábola do Bom Samaritano (Lc 10) Já preguei muitas vezes sobre esta parábola,  espiritualizando-a. Jerusalém, era a igreja; Jericó, o mundo; o viajante era o crente que  abandonava a igreja e se dirigia para o mundo. Os ladrões eram Satanás e os demônios e o  bom samaritano, o irmão que trazia o outro de volta para a igreja. 

Que bela maneira de fugir à nossa responsabilidade! Eu estava pregando o Quinto  Evangelho, o Evangelho Segundo os Santos Evangélicos. 

Em outra ocasião, dei uma interpretação diferente. Jerusalém era o jardim do Éden,  Jericó, a queda do homem, e Jesus era o Bom Samaritano que veio e... ah! existem tantos  modos de explicá-la. 

Jesus encerrou dizendo ao levita que lhe havia feito a indagação: "Vai, e procede tu de  igual modo." (v. 37). Ele quis dizer que se virmos uma pessoa necessitada, devemos atender  àquela necessidade. Está bem claro. Não é preciso espiritualizar nada. 

Mas nós passamos por pessoas que sofrem, e a única coisa que fazemos é ir para casa e  comentar o fato: 

"Presenciei uma cena horrível hoje. Coitado do homem! Senti tanta pena dele..." E nada  mais. 

O samaritano não era nenhuma pessoa excepcional. É verdade que nós o chamamos de  "Bom Samaritano", mas Jesus não o fez. Ele disse apenas: "Certo samaritano, que seguia o seu caminho, passou-lhe perto..." (v. 33). Ele estava simplesmente observando o velho  mandamento. Deixou, na hospedaria, dinheiro para pagar o tratamento do homem, e depois  seguiu em frente para cuidar de seus interesses. 

Mas nós somos tão relapsos que, em comparação conosco, ele é o bom samaritano. O  mesmo acontece nas igrejas hoje em dia. Às vezes um pastor me diz: "Irmão Ortiz, quero  apresentar-lhe um bom diácono de minha igreja." 

"Ah, terei muito prazer em conhecê-lo", digo eu. 

"Então, depois que fomos apresentados, indago do pastor: 

"Por que você disse que ele é um bom diácono?" 

"Bem, porque ele assiste a todas as reuniões. Ele dá o dízimo; e me auxilia todas as  vezes que lhe peço. 

Isto não é ser um bom diácono; isto é apenas ser diácono. Mas quando uma pessoa se  aproxima da normalidade, dizemos que ela é "uma excelente pessoa". 

Como Deus ficaria satisfeito se conseguisse que todos nós fôssemos apenas samaritanos  normais. 

Jesus disse: "Assim brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as  vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que está nos céus." (Mt 5.16.) O que é esta luz? O  que é que produz boas obras? O amor. E como já disse antes, a luz de Deus é o amor. 

Agora precisamos fazer uma aplicação concreta. Quando falamos de amor ou de  qualquer outro assunto da Bíblia, temos que fazer uma aplicação específica, senão isto seria  costurar sem dar nó na ponta da linha. A gente costura, costura, costura, e as coisas continuam  do mesmo jeito. Às vezes tentamos costurar até sem linha mesmo, somente com a agulha.  Tudo o que fazemos é perfurar o pano deixando nele pequenos orifícios. Mas o tecido  permanece rasgado, pois não damos os passos específicos para conservar os lucros. 

Deus não ordenou: "Amem a todos os próximos!" É impossível amar o mundo inteiro.  Ele diz: "Amarás o teu próximo!" Portanto, escolhamos uma pessoa, uma família, e  comecemos a orar por ela. Comecemos a analisar seus problemas, suas necessidades  espirituais, materiais e psicológicas — todos os tipos de necessidades. 

Não nos dirijamos a eles com um folheto na mão; iremos dar a impressão de um  vendedor de porta em porta. Vendamos a nós mesmos. Demo-nos a nós mesmos para eles.  Deixemos que eles vejam que nós os amamos, e nos colocamos à sua disposição para  qualquer serviço. 

Conhecemos uma senhora de idade, na Argentina, que, segundo ela mesma explica,  "nunca conseguiu ganhar uma alma para Jesus". (Para falar a verdade, não nos preocupamos  muito em ganhar almas, mas sim ganhar a alma, o corpo e o espírito — a pessoa toda.) Aquela  senhora já estava na igreja havia muitos anos. Certo dia, o Senhor deu-lhe uma visão clara  deste tipo de amor, e ela veio a compreender que não foi um folheto que Deus enviou do céu;  ele mandou seu Filho, que desceu à terra e viveu entre nós e curou as pessoas. Ele nos  auxiliou e conviveu conosco. 

Aquela irmã resolveu que iria fazer a mesma coisa. 

Defronte do lugar onde morava havia uma casa para alugar. Quando os novos  moradores se mudaram para ela, essa irmã já estava preparada. Dirigiu-se para a casa levando  café e bolinhos, e disse àquela gente: "Vim trazer-lhes alguma coisa para comer, pois sei que  se mudaram agora e creio que ainda não puderam preparar uma refeição. Voltarei depois para  buscar as vasilhas; e não se preocupem em lavar nada. Devem estar muito atarefados. 

"E a propósito, se desejarem conhecer o armazém, fica naquela esquina..." E ela nem  colocou um folheto por baixo dos bolinhos. Apenas levou aquelas coisas para eles e ajudou-os  um pouco. 

Pouco depois, ela voltou para pegar os pratos e disse-lhes:

"Se precisarem de mais alguma coisa, estou às ordens. Se quiserem alguma coisa, terei  muito prazer em ajudá-los." 

Ela não falou de Cristo, mas um mês depois a família toda foi batizada, por causa da luz  que ela fizera brilhar diante deles. 

Jesus não disse: "Deixem que seus lábios falem perante os homens de tal maneira que  eles ouçam as belas palavras e glorifiquem o Pai." O que ele disse foi: "Deixem brilhar a sua  luz!" — seu amor. 

Talvez alguns de nós tenham dificuldades com esta questão porque fomos doutrinados  num evangelho anticatólico. Desvestimos totalmente as boas o-bras de todos os seus méritos.  Não somos salvos por boas obras, dizemos; e isto é apenas uma parte da verdade, pois nós  somos "criados em Cristo Jesus para boas obras" (Ef 2.10). 

Em Atos 10, nós lemos a respeito de Cornélio e das boas obras que realizava — e  gostamos de acrescentar que ele ainda não era salvo. Mas notemos que Deus enviou-lhe um  anjo porque "as tuas orações e as tuas esmolas subiram para memória diante de Deus" (v. 4).  Esta é a outra faceta da verdade. 

As boas obras evidenciam a existência do amor. As vezes, nós levamos tudo para o lado  místico — "Oh! Como eu o amo, meu irmão!" — mas não demonstramos nosso amor de outra  forma, a não ser com abraços e sorrisos. 

Boas obras significam boas obras. Obras significam trabalho, e não apenas uma  filosofia mística. Precisamos abrir nossa carteira e praticar boas obras. Naturalmente, existe  uma diferença entre as boas obras que são realizadas como resultado do amor, e as realizadas  na carne. 

Paulo disse que se eu der todos os meus bens para os pobres e não tiver amor, nada sou.  É por isso que o marxismo não representa uma solução completa para os males da  humanidade. O marxismo tem muitas características apreciáveis. Ele ensina algumas coisas  boas a respeito da justiça social e da partilha de bens. Mas é exatamente o oposto do que Jesus  nos ensinou. (O mesmo acontece com o espiritismo e os dons do Espírito — existem alguns  pontos análogos entre eles, mas provêm de fontes diferentes.) 

Mas notemos isto: não podemos combater os dons, a fim de lutar contra o espiritismo.  Não podemos ser contrários à partilha de bens, para negarmos o comunismo.  Não nos esqueçamos de que temos de amar o próximo no presente momento, no lugar  onde nos encontramos.