segunda-feira, 10 de maio de 2021

O discipulo - Capítulo 05

O Oxigênio do Reino 

"Novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros: assim como eu vos amei, que também vos  ameis uns aos outros. Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns aos outros." (Jo  13.34,35.) 

Antes que o leitor comece a ter receios de se tornar escravo, deixe-me falar-lhe um  pouco a respeito do oxigênio do Reino — o amor. 

Durante muitos anos eu vi o amor apenas como uma das muitas virtudes da vida cristã.  Em meus sermões, eu dizia aos ouvintes que ele era uma das qualidades mais importantes na  vida. 

Depois, eu vim a conhecer o verdadeiro amor, e descobri que ele não é apenas um dos  aspectos da vida cristã — o amor é a vida cristã. Não é uma das virtudes mais importantes —  é a única. 

Quando falamos acerca da vida eterna, parece que estamos sempre pensando em sua  duração, anos e anos e anos. Nunca procuramos meditar sobre sua finalidade. Se vida eterna  significa apenas uma vida sem fim, então o inferno é uma forma de vida eterna. 

Mas a finalidade intrínseca da vida eterna que Jesus dá é o amor. É o seu oxigênio; sem  ele não há vida. O amor é o único elemento eterno. Os outros notáveis elementos — dons,  línguas, profecias, sabedoria, conhecimento, leitura bíblica, oração — cessarão algum dia. O  único que atravessará a morte e passará à eternidade é o amor. 

O amor é a luz do novo Reino. A Bíblia é tão clara quando diz que Deus é luz, e Deus é  amor. João escreveu o seguinte: "Se, porém, andarmos na luz, como ele está na luz, mantemos  comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica de todo pecado. 

Não sei por que temos sempre pensado em luz como conhecimento. Talvez seja porque  em inglês, a palavra light (luz) às vezes significa "um melhor entendimento". Fala-se a  respeito de "acender-se uma luz" sobre um determinado assunto. 

Na Bíblia, entretanto, luz é amor. "Aquele que ama a seu irmão, permanece na luz e  nele não há nenhum tropeço. Aquele, porém, que odeia a seu irmão, está nas trevas, e anda  nas trevas, e não sabe para onde vai, porque as trevas lhe cegaram os olhos." (1 Jo 2.10,11.) 

O que são trevas? Simplesmente a ausência de luz. Não precisamos comprar trevas; não  é preciso que encomendemos sacos e sacos de trevas para se encher com elas um recinto.  Basta que apaguemos as luzes, e as trevas aparecem.

O mesmo acontece com o reino das trevas. As trevas nos comunicam um grande  sentimento de solidão. Em minha terra, nós costumávamos ter muitos black-outs à noite. Às  vezes, estávamos pregando, e subitamente as luzes se apagavam. O que acontecia? 

As mulheres logo diziam aos maridos: "Querido, onde está você? Dê-me sua mão."  Nada se modificara, mas as pessoas se sentiam subitamente sozinhas, apesar de estarem  em companhia de outras. 

Durante o dia, nós vamos a qualquer lugar, e até levamos flores ao cemitério. Mas, não  apreciamos muito a idéia de ir ao cemitério à noite. Por quê? Os mortos estão mortos durante  a noite, do mesmo modo que estão durante o dia. Mas é a escuridão que faz com que não  queiramos ir lá. 

As trevas falam de individualidade, de egoísmo. A luz é amor, comunhão, convívio. Se  andarmos na luz, teremos comunhão, porque veremos uns aos outros como irmãos.  O versículo que citamos acima diz também que: "Nele não há nenhum tropeço", falando  daquele que ama seu irmão. Nós, os crentes, tropeçamos uns nos outros o tempo todo. Os  pastores se embaraçam uns nos outros e os membros da congregação fazem o mesmo. Até os  líderes denominacionais estão sempre tendo dificuldades e desentendimentos. E nós erramos  tanto que, às vezes, quando o Espírito Santo desce sobre uma igreja em poder e convicção,  temos que ficar muito tempo confessando os erros uns aos outros. Não temos caminhado na  luz do amor. 

Se um irmão está na luz e outro não está, ainda é possível evitar tropeços; um pode  guiar o outro. E se os dois estão na luz, melhor ainda. Não há trevas. 

Vou mais longe: o amor é a prova da salvação. Algumas pessoas pensam que esta prova  é o modo como nos vestimos, se fumamos ou não, e se fazemos ou não uma porção de outras  coisas. Todas estas coisas são importantes, mas não tanto quanto o amor. Se tivéssemos dado  ao amor a mesma importância que temos dado ao fumo, por exemplo, tudo teria sido  diferente. O amor é a prova de nossa salvação. 

Ouçamos o que João diz: "Amados, amemo-nos uns aos outros, porque o amor procede  de Deus; e todo aquele que ama é nascido de Deus e conhece a Deus. Aquele que não ama  não conhece a Deus, pois Deus é amor." (1 Jo 4.7, 8.) 

Você deseja saber se é nascido de Deus? Muito fácil, não é? 

João diz também o seguinte: "Nós sabemos que já passamos da morte para a vida,  porque amamos os irmãos; aquele que não ama permanece na morte." (1 Jo 3.14.)  Às vezes, algumas pessoas dirigem-se ao pastor e dizem: "Não tenho certeza da  salvação; estou com muita dúvida. Como posso chegar a ter certeza?" Eis aqui um teste muito  simples: "Você ama os irmãos?" 

De acordo com esta proposição de João, quem não ama os irmãos não é salvo; está  vivendo em morte. Uma pessoa pode conhecer bem a doutrina do milênio ou da tribulação,  mas a única maneira como ela pode ser salva, pode passar da morte para a vida, das trevas  para a luz, é pelo amor. 

Tenho que ir um pouco mais longe (espero não escandalizar ninguém): se amássemos  do modo como Deus quer que amemos, não haveria necessidade dos mandamentos da Bíblia.  "De sorte que o cumprimento da lei é o amor." (Rm 13.10.) E é exatamente nisso que se  constitui a nova aliança de Deus. "Na mente lhes imprimirei as minhas leis, também no  coração lhas inscreverei" (Jr 31.33.) 

Quando o amor brota em nosso interior, ele soluciona toda sorte de problemas que  porventura possam existir. O fruto do Espírito é o amor — e também alegria, paz,  longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, e domínio próprio. (Gl 5.22,23.)  Por que é que pregamos tanto? Porque desejamos implantar o amor e todas estas coisas no  coração dos crentes. Mas se o amor estivesse sendo cultivado como deve, não precisaríamos  de tantos sermões. O amor não é um dos elementos da vida cristã — é o seu elemento vital. O  amor é a própria vida. 

As pessoas que estão buscando os dons do Espírito ao invés de buscarem o seu fruto,  estão enganando a si mesmas. Embora apreciemos os dons, devemos ter muito cuidado em  saber a que daremos ênfase. Jesus não disse: "Pelos seus dons os conhecereis", mas "Pelos  seus frutos os conhecereis." (Mt 7.20.) 

Os dons não fornecem o índice de espiritualidade de ninguém, pois os dons de uma  pessoa são como os presentes que depositamos ao pé da árvore de Natal. Buenos Aires é uma  cidade muito populosa, e por isso, não temos muita arborização. A maioria de nossas árvores  de Natal é artificial; elas são feitas de papel verde e arame. Mas são muito bem enfeitadas.  Nós compramos uma destas árvores por dois ou três dólares e dependuramos nelas relógios,  anéis, e outros presentes. E elas ficam muito bonitas, embora não sejam árvores de verdade. 

Mas quando se sai à rua no dia 26 de dezembro, vê-se que todas aquelas belas árvores  estão no lixo. Na véspera, elas estavam adornadas com caríssimos relógios Omega, mas hoje  estão nas latas de lixo. Não podemos valorizar muito uma árvore só por causa dos presentes  que ela tem em si. Os dons não indicam que tipo de árvore ela é. 

Só podemos julgar a árvore pelo fruto. Se as maçãs de uma macieira são boas, então  dizemos que aquela macieira é de boa qualidade, e isso se aplica a qualquer árvore.  Naturalmente, a melhor coisa que poderia acontecer a uma árvore é ela ter ambos: as  frutas boas e os relógios Omega — ter os frutos e os dons. Mas, se isto não for possível, pelo  menos o fruto deve ser bom. Uma pessoa que não tem dons pode ser desculpada, mas não há  desculpas para a não-frutificação. Se perguntarmos a uma macieira: "Por que você não tem  um belo anel?" ela poderia responder: "Desculpe-me, mas ninguém dependurou um anel em  mim." Contudo, a macieira não pode ser desculpada por não dar frutos, porque a maçã é um  produto natural de uma macieira normal. 

Do mesmo modo, nós não temos desculpas para a ausência do amor em nossa vida. Se  estivermos cheios do Espírito Santo, a coisa mais natural do mundo, para nós, será amar.  Eu lamento bastante o fato de que nós, os pentecostais, durante muito tempo, tenhamos  dado mais importância a Atos 2.4, do que a Gálatas 5.22. Nossa declaração de fé afirma:  "Cremos no revestimento do Espírito Santo de acordo com Atos 2.4", isso é, com o dom de  línguas. A História poderia ter sido bem diferente se tivéssemos declarado: "Cremos no  revestimento do Espírito Santo, de acordo com Gálatas 5.22." Um dos resultados seria que  não haveria tantas divisões entre pessoas cheias do Espírito. 

Sendo um ministro pentecostal, é difícil para mim ter que confessar isso. Mas tal fato é  verdade, e o Espírito Santo deseja que encaremos a realidade. Quando alguém sai para caçar  veados ou qualquer outro tipo de caça, ele faz mira para a cabeça do animal e não para a sua  cauda, pois se o tiro o atingir na cabeça, pega o animal todo. 

Ao buscarmos o revestimento do Espírito Santo, a cabeça é o fruto do Espírito e a cauda  é o dom de línguas. Muitos de nós estão atirando na cauda, e o animal continua fugindo. Se  houvéssemos atirado na cabeça, teríamos todo o animal, inclusive a cauda. 

Jesus não disse: "Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos, se falardes em  outras línguas." Embora eu próprio tenha o dom de línguas, devo dizer que o mundo só saberá  que eu sou discípulo de Cristo, se eu mostrar o sinal do amor. Já está na hora de colocarmos a  ênfase onde ela deve estar, isto é, naquilo a que Jesus deu ênfase. 

Sansão possuía dons — carismas — mas era um homem carnal. Saul, o primeiro rei de  Israel, era carismático, ele profetizava. Mas era um homem carnal. Paulo disse que, se ele  falasse as línguas dos homens e dos anjos, mas não tivesse amor, aquilo não passaria de mero  ruído. Falar em línguas, sem amor, é apenas fazer barulho. A profecia e a capacidade de  compreender os mistérios espirituais, sem amor, nada são. O dom da fé, sem amor, também é  nada. 

Portanto, se virmos uma pessoa manifestando um dom, mesmo que seja ressuscitar um  morto, não tenhamos muita pressa em segui-la. Primeiro, aproximemo-nos daquela árvore.  Não nos fixemos nos relógios e anéis; olhemos debaixo das folhas; procuremos pelo seu fruto.  Nestes dias de grande confusão, o povo de Deus precisa ser muito sábio. 

Será que cada um de nós está mesmo ciente da importância do amor? Somente se  compreendermos isto, é que estaremos abertos para o Espírito. É como a farinha de um bolo.  É possível fazer-se um bolo sem ovos e sem sal, mas não sem a farinha. O amor é a vida  cristã. As outras coisas, como por exemplo, os dons, e o culto que prestamos têm seu valor,  mas o amor é que é a vida.