O Oxigênio do Reino
"Novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros:
assim como eu vos amei, que também vos
ameis uns aos outros. Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos,
se tiverdes amor uns aos outros." (Jo
13.34,35.)
Antes que o leitor comece a ter receios de se tornar
escravo, deixe-me falar-lhe um pouco a
respeito do oxigênio do Reino — o amor.
Durante muitos anos eu vi o amor apenas como uma das muitas
virtudes da vida cristã. Em meus
sermões, eu dizia aos ouvintes que ele era uma das qualidades mais importantes
na vida.
Depois, eu vim a conhecer o verdadeiro amor, e descobri que
ele não é apenas um dos aspectos da vida
cristã — o amor é a vida cristã. Não é uma das virtudes mais importantes — é a única.
Quando falamos acerca da vida eterna, parece que estamos
sempre pensando em sua duração, anos e
anos e anos. Nunca procuramos meditar sobre sua finalidade. Se vida eterna significa apenas uma vida sem fim, então o inferno
é uma forma de vida eterna.
Mas a finalidade intrínseca da vida eterna que Jesus dá é o
amor. É o seu oxigênio; sem ele não há
vida. O amor é o único elemento eterno. Os outros notáveis elementos —
dons, línguas, profecias, sabedoria,
conhecimento, leitura bíblica, oração — cessarão algum dia. O único que atravessará a morte e passará à
eternidade é o amor.
O amor é a luz do novo Reino. A Bíblia é tão clara quando
diz que Deus é luz, e Deus é amor. João
escreveu o seguinte: "Se, porém, andarmos na luz, como ele está na luz,
mantemos comunhão uns com os outros, e o
sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica de todo pecado.
Não sei por que temos sempre pensado em luz como
conhecimento. Talvez seja porque em
inglês, a palavra light (luz) às vezes significa "um melhor
entendimento". Fala-se a respeito
de "acender-se uma luz" sobre um determinado assunto.
Na Bíblia, entretanto, luz é amor. "Aquele que ama a
seu irmão, permanece na luz e nele não
há nenhum tropeço. Aquele, porém, que odeia a seu irmão, está nas trevas, e
anda nas trevas, e não sabe para onde
vai, porque as trevas lhe cegaram os olhos." (1 Jo 2.10,11.)
O que são trevas? Simplesmente a ausência de luz. Não
precisamos comprar trevas; não é preciso
que encomendemos sacos e sacos de trevas para se encher com elas um
recinto. Basta que apaguemos as luzes, e
as trevas aparecem.
O mesmo acontece com o reino das trevas. As trevas nos
comunicam um grande sentimento de
solidão. Em minha terra, nós costumávamos ter muitos black-outs à noite.
Às vezes, estávamos pregando, e
subitamente as luzes se apagavam. O que acontecia?
As mulheres logo diziam aos maridos: "Querido, onde
está você? Dê-me sua mão." Nada se
modificara, mas as pessoas se sentiam subitamente sozinhas, apesar de
estarem em companhia de outras.
Durante o dia, nós vamos a qualquer lugar, e até levamos
flores ao cemitério. Mas, não apreciamos
muito a idéia de ir ao cemitério à noite. Por quê? Os mortos estão mortos
durante a noite, do mesmo modo que estão
durante o dia. Mas é a escuridão que faz com que não queiramos ir lá.
As trevas falam de individualidade, de egoísmo. A luz é amor, comunhão, convívio. Se andarmos na luz, teremos comunhão, porque veremos uns aos outros como irmãos. O versículo que citamos acima diz também que: "Nele não há nenhum tropeço", falando daquele que ama seu irmão. Nós, os crentes, tropeçamos uns nos outros o tempo todo. Os pastores se embaraçam uns nos outros e os membros da congregação fazem o mesmo. Até os líderes denominacionais estão sempre tendo dificuldades e desentendimentos. E nós erramos tanto que, às vezes, quando o Espírito Santo desce sobre uma igreja em poder e convicção, temos que ficar muito tempo confessando os erros uns aos outros. Não temos caminhado na luz do amor.
Se um irmão está na luz e outro não está, ainda é possível
evitar tropeços; um pode guiar o outro.
E se os dois estão na luz, melhor ainda. Não há trevas.
Vou mais longe: o amor é a prova da salvação. Algumas
pessoas pensam que esta prova é o modo
como nos vestimos, se fumamos ou não, e se fazemos ou não uma porção de
outras coisas. Todas estas coisas são
importantes, mas não tanto quanto o amor. Se tivéssemos dado ao amor a mesma importância que temos dado ao
fumo, por exemplo, tudo teria sido
diferente. O amor é a prova de nossa salvação.
Ouçamos o que João diz: "Amados, amemo-nos uns aos
outros, porque o amor procede de Deus; e
todo aquele que ama é nascido de Deus e conhece a Deus. Aquele que não ama não conhece a Deus, pois Deus é amor."
(1 Jo 4.7, 8.)
Você deseja saber se é nascido de Deus? Muito fácil, não
é?
João diz também o seguinte: "Nós sabemos que já
passamos da morte para a vida, porque
amamos os irmãos; aquele que não ama permanece na morte." (1 Jo
3.14.) Às vezes, algumas pessoas
dirigem-se ao pastor e dizem: "Não tenho certeza da salvação; estou com muita dúvida. Como posso
chegar a ter certeza?" Eis aqui um teste muito simples: "Você ama os irmãos?"
De acordo com esta proposição de João, quem não ama os
irmãos não é salvo; está vivendo em
morte. Uma pessoa pode conhecer bem a doutrina do milênio ou da
tribulação, mas a única maneira como ela
pode ser salva, pode passar da morte para a vida, das trevas para a luz, é pelo amor.
Tenho que ir um pouco mais longe (espero não escandalizar
ninguém): se amássemos do modo como Deus
quer que amemos, não haveria necessidade dos mandamentos da Bíblia. "De sorte que o cumprimento da lei é o
amor." (Rm 13.10.) E é exatamente nisso que se constitui a nova aliança de Deus. "Na
mente lhes imprimirei as minhas leis, também no
coração lhas inscreverei" (Jr 31.33.)
Quando o amor brota em nosso interior, ele soluciona toda
sorte de problemas que porventura possam
existir. O fruto do Espírito é o amor — e também alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade,
fidelidade, mansidão, e domínio próprio. (Gl 5.22,23.) Por que é que pregamos tanto? Porque
desejamos implantar o amor e todas estas coisas no coração dos crentes. Mas se o amor estivesse
sendo cultivado como deve, não precisaríamos
de tantos sermões. O amor não é um dos elementos da vida cristã — é o
seu elemento vital. O amor é a própria
vida.
As pessoas que estão buscando os dons do Espírito ao invés
de buscarem o seu fruto, estão enganando
a si mesmas. Embora apreciemos os dons, devemos ter muito cuidado em saber a que daremos ênfase. Jesus não disse:
"Pelos seus dons os conhecereis", mas "Pelos seus frutos os conhecereis." (Mt
7.20.)
Os dons não fornecem o índice de espiritualidade de ninguém,
pois os dons de uma pessoa são como os
presentes que depositamos ao pé da árvore de Natal. Buenos Aires é uma cidade muito populosa, e por isso, não temos
muita arborização. A maioria de nossas árvores
de Natal é artificial; elas são feitas de papel verde e arame. Mas são
muito bem enfeitadas. Nós compramos uma
destas árvores por dois ou três dólares e dependuramos nelas relógios, anéis, e outros presentes. E elas ficam muito
bonitas, embora não sejam árvores de verdade.
Mas quando se sai à rua no dia 26 de dezembro, vê-se que
todas aquelas belas árvores estão no
lixo. Na véspera, elas estavam adornadas com caríssimos relógios Omega, mas
hoje
Só podemos julgar a árvore pelo fruto. Se as maçãs de uma
macieira são boas, então dizemos que aquela
macieira é de boa qualidade, e isso se aplica a qualquer árvore. Naturalmente, a melhor coisa que poderia
acontecer a uma árvore é ela ter ambos: as
frutas boas e os relógios Omega — ter os frutos e os dons. Mas, se isto
não for possível, pelo menos o fruto
deve ser bom. Uma pessoa que não tem dons pode ser desculpada, mas não há desculpas para a não-frutificação. Se
perguntarmos a uma macieira: "Por que você não tem um belo anel?" ela poderia responder:
"Desculpe-me, mas ninguém dependurou um anel em mim." Contudo, a macieira não pode ser
desculpada por não dar frutos, porque a maçã é um produto natural de uma macieira normal.
Do mesmo modo, nós não temos desculpas para a ausência do
amor em nossa vida. Se estivermos cheios
do Espírito Santo, a coisa mais natural do mundo, para nós, será amar. Eu lamento bastante o fato de que nós, os
pentecostais, durante muito tempo, tenhamos
dado mais importância a Atos 2.4, do que a Gálatas 5.22. Nossa
declaração de fé afirma: "Cremos no
revestimento do Espírito Santo de acordo com Atos 2.4", isso é, com o dom
de línguas. A História poderia ter sido
bem diferente se tivéssemos declarado: "Cremos no revestimento do Espírito Santo, de acordo com
Gálatas 5.22." Um dos resultados seria que
não haveria tantas divisões entre pessoas cheias do Espírito.
Sendo um ministro pentecostal, é difícil para mim ter que
confessar isso. Mas tal fato é verdade,
e o Espírito Santo deseja que encaremos a realidade. Quando alguém sai para
caçar veados ou qualquer outro tipo de
caça, ele faz mira para a cabeça do animal e não para a sua cauda, pois se o tiro o atingir na cabeça,
pega o animal todo.
Ao buscarmos o revestimento do Espírito Santo, a cabeça é o
fruto do Espírito e a cauda é o dom de
línguas. Muitos de nós estão atirando na cauda, e o animal continua fugindo.
Se houvéssemos atirado na cabeça,
teríamos todo o animal, inclusive a cauda.
Jesus não disse: "Nisto conhecerão todos que sois meus
discípulos, se falardes em outras
línguas." Embora eu próprio tenha o dom de línguas, devo dizer que o mundo
só saberá que eu sou discípulo de
Cristo, se eu mostrar o sinal do amor. Já está na hora de colocarmos a ênfase onde ela deve estar, isto é, naquilo a
que Jesus deu ênfase.
Sansão possuía dons — carismas — mas era um homem carnal.
Saul, o primeiro rei de Israel, era
carismático, ele profetizava. Mas era um homem carnal. Paulo disse que, se
ele falasse as línguas dos homens e dos
anjos, mas não tivesse amor, aquilo não passaria de mero ruído. Falar em línguas, sem amor, é apenas
fazer barulho. A profecia e a capacidade de
compreender os mistérios espirituais, sem amor, nada são. O dom da fé,
sem amor, também é nada.
Portanto, se virmos uma pessoa manifestando um dom, mesmo
que seja ressuscitar um morto, não
tenhamos muita pressa em segui-la. Primeiro, aproximemo-nos daquela
árvore. Não nos fixemos nos relógios e
anéis; olhemos debaixo das folhas; procuremos pelo seu fruto. Nestes dias de grande confusão, o povo de
Deus precisa ser muito sábio.
Será que cada um de nós está mesmo ciente da importância do amor? Somente se compreendermos isto, é que estaremos abertos para o Espírito. É como a farinha de um bolo. É possível fazer-se um bolo sem ovos e sem sal, mas não sem a farinha. O amor é a vida cristã. As outras coisas, como por exemplo, os dons, e o culto que prestamos têm seu valor, mas o amor é que é a vida.