Eles se tinham encontrado dessa maneira regularmente, e
cada vez era uma aventura totalmente nova. As excursões calmas, repousantes a
outros níveis do consciente eram como o abrir de uma porta totalmente nova a
uma realidade superior, ao mundo de experiências e poderes psíquicos. Sandy
estava completamente fascinada.
O metrônomo sobre a mesinha batia, em ritmo lento, repousante,
constante, inspire, expire, relaxe, relaxe, relaxe.
Sandy estava ficando perita na arte de mergulhar abaixo
dos níveis
superiores do consciente, níveis esses nos quais todos os seres humanos
normalmente operam, mas que são os mais perturbados e atravancados por
estímulos externos. Em algum lugar abaixo deles encontravam-se os níveis mais
profundos, onde se podiam encontrar verdadeiras capacidades e experiências
psíquicas. A fim de atingir esses níveis era preciso descontração, meditação e
concentração cuidadosas e metódicas. Langstrat havia-lhe ensinado todos os
passos.
Enquanto Sandy permanecia assentada imóvel no sofá e Shawn
observava atentamente, Langstrat fazia uma lenta e contínua contagem
regressiva, na cadência do metrônomo.
—
Vinte e cinco, vinte e quatro, vinte e três...
Em pensamento, Sandy se encontrava num elevador,
descendo aos níveis
mais profundos do seu ser, descontraindo-se, desligando os níveis
superiores de atividade cerebral, movendo-se através dos planos inferiores.
—
Três, dois, um, nível Alfa — disse Langstrat. — Agora, abra a porta.
Sandy visualizou-se abrindo a porta do elevador e
entrando numa linda campina verde cercada de árvores recobertas de flores brancas e rosadas. O ar
era cálido e soprava uma leve brisa, como uma delicada carícia. Sandy olhou em
redor.
—
Você a vê? — perguntou Langstrat suavemente.
—
Ainda estou procurando — respondeu Sandy. Então seu rosto se iluminou. Aí vem
ela! Como é linda!
Sandy podia vê-la caminhando em sua direção, um linda jovem de
loiros cabelos cascateantes, toda vestida de tremeluzente linho branco. Seu
rosto resplandecia de felicidade. Vinha de mãos estendidas em saudação.
—
Olá! — chamou Sandy feliz.
—
Olá! — respondeu a moça na voz mais linda e melodiosa que Sandy jamais ouvira.
—
Você veio para me guiar?
A moça loira tomou nas suas as mãos de Sandy e olhou em seus
olhos com tremenda bondade e compaixão.
—
Sim. Meu nome é Madeline. Eu a ensinarei. Espantada, Sandy olhou para Madeline.
—
Você parece tão jovem! Já viveu antes?
—
Sim. Centenas de vezes. Mas cada vida foi simplesmente um passo para cima. Eu
lhe mostrarei o caminho.
Sandy estava extasiada.
—
Quero aprender. Quero ir com você.
Madeline tomou a mão de Sandy e começou a conduzi-la através da campina
verdejante na direção de uma imaculada calçada dourada.
Enquanto Sandy permanecia sentada no sofá do apartamento de
Langstrat, o rosto cheio de gozo e arrebatamento, garras brilhantes
penetravam-lhe o crânio à medida que as mãos retorcidas e negras de um hediondo
demônio prensavam-lhe a cabeça. O espírito, inclinado sobre ela, sussurrava
palavras à sua mente:
—
Então venha. Venha comigo. Eu a apresentarei a outros que se elevaram antes
mesmo de mim.
—
Eu adoraria! — respondeu Sandy. Langstrat e Shawn sorriram um para o outro.
Marshall entrar e ir diretamente para o escritório. Tom estava confuso e
cheio de perguntas.
—
Marshall, onde esteve e onde está Berenice? Os jornais não chegaram da
impressora! O telefone não parou de tocar o dia todo. Finalmente tive de ligar
a secretária eletrônica, e muita gente já veio indagar o que aconteceu com o
jornal de hoje.
—
Onde está Carmem? — perguntou Marshall, e Tom notou que Marshall tinha uma
aparência muito, muito doente.
—
Marshall — perguntou ele, preocupado — o que... o que está errado? O que está
acontecendo por aqui?
Marshall rosnou, quase gritando:
—
Onde está Carmem?
—
Não está aqui. Esteve aqui, mas então Berenice se mandou, e depois ela se
mandou. Fiquei sozinho o dia todo!
Marshall abriu com fúria a porta do escritório e entrou. Foi direto a uma
gaveta do arquivo e puxou-a com força. Vazia. Tom, a distância segura,
observava. Marshall enfiou a mão em baixo da mesa e puxou uma caixa de papelão.
A caixa saiu fácil e leve. Ele viu que também ela estava vazia e a jogou ao
chão soltando uma praga em voz alta.
—
Alguma coisa... há algo que eu possa fazer? — perguntou Tom. Marshall deixou-se
cair na cadeira, o rosto pálido, o cabelo desgrenhado. Por alguns
instantes, ele apenas se deixou ficar sentado, a cabeça apoiada na mão,
respirando fundo, tentando pensar, tentando se acalmar.
—
Ligue para o hospital — disse afinal com voz muito fraca que de jeito nenhum
parecia a de Marshall Hogan.
—
O... o hospital? — Tom não gostava nada daquilo.
—
Pergunte como Berenice está passando. O queixo de Tom caiu.
—
Berenice! Ela está no hospital? O que aconteceu? Marshall explodiu:
—
Apenas faça o que mandei, Tom!
Tom correu ao telefone. Marshall ergueu-se e foi à porta.
—
Tom...
Tom levantou os olhos, mas continuou a discar o número. Marshall recostou-se
contra a porta. Sentia-se tão fraco, tão impotente.
—
Tom, sinto muito. Realmente sinto muito. Obrigado por fazer a chamada.
Informe-me do que eles disserem.
Com isso Marshall voltou-se e entrou de novo no escritório, deixando-se cair na
cadeira e permanecendo sentado, imóvel.
Tom veio com o relatório.
—
Ah... Berenice teve apenas uma costela quebrada e eles a enfaixaram... mas
nenhum outro ferimento sério. Alguém trouxe o carro dela de Baker, e ela já teve alta e foi para casa. É lá que ela está no momento.
—
Sim... eu tenho de ir para casa...
—
O que aconteceu com ela?
—
Ela foi espancada. Alguém a atacou, surrou.
—
Marshall... — Tom estava tão horrorizado que quase ficou sem fala. — É...
bem... que coisa terrível!
Marshall levantou-se com dificuldade da cadeira e se
recostou contra a escrivaninha. Tom ainda estava preocupado.
—
Marshall, a edição de sexta-feira vai sair? Mandamos as colagens à
impressora... não compreendo.
—
Não imprimiram — respondeu Marshall com suavidade.
—
O quê? Por que não?
Marshall deixou a cabeça pender para a frente, e sacudiu-a. Soltou um suspiro,
então olhou de novo para Tom.
—
Tom, olhe, tire o resto do dia de folga, o que sobra do dia. Deixe-me ajeitar
as coisas por aqui e então ligarei para você, está bem?
—
Está bem.
Tom foi à salinha dos fundos apanhar a lancheira e o paletó. O telefone
tocou, uma linha diferente, um número que Marshall reservava para chamados
especiais. Marshall atendeu.
—
Clarim — disse.
—
Marshall?
—
Sim...
—
Marshall, aqui é Eldon Strachan.
Oh, graças a Deus, ele está vivo! Marshall sentia a garganta a se
apertar. Achou que ia chorar.
—
Eldon, você está bem?
—
Não muito. Acabamos de chegar de viagem. Marshall, alguém destruiu a minha
casa. Está uma bagunça.
—
Doris está bem?
—
Ela está perturbada. Eu estou chateado.
—
Todos nós fomos atingidos, Eldon. Eles nos descobriram.
—
O que aconteceu?
Marshall contou-lhe tudo. A parte mais difícil de todas foi dizer a
Eldon Strachan que seu amigo e companheiro de exílio, Ted Harmel, estava
morto.
Durante longo tempo, Strachan teve dificuldade em
falar. Passaram-se diversos minutos em constrangedor e doloroso silêncio, interrompido apenas
quando um dos dois perguntava se o outro ainda estava no telefone.
—
Marshall — disse Strachan afinal — é melhor corrermos. É melhor nos mandarmos
daqui a toda e nunca mais voltarmos.
—
Correr para onde? — perguntou Marshall. — Você já correu uma vez, lembra-se?
Enquanto estiver vivo, Eldon, estará vivendo com esta coisa e eles saberão.
—
Mas o que podemos fazer afinal?
—
Temos amigos, pela madrugada! E o promotor geral do estado?
—
Já lhe disse, não posso procurar Norm Mattily sem nada além da minha palavra.
Preciso de algo mais que nossa amizade. Preciso de prova, algum tipo de
documentação.
Marshall baixou os olhos à caixa de papelão vazia.
—
Conseguirei algo para você, Eldon. De um jeito ou de outro, conseguirei algo
para mostrar a quem se dispuser a ouvir.
Eldon suspirou.
—
Apenas não sei por quanto tempo ainda isto vai continuar...
—
Por tanto tempo quanto permitirmos, Eldon. Ele pensou por um instante, então
disse:
—
É, você tem razão. Consiga-me algo sólido, e verei o que posso fazer.
—
Não temos escolha. No momento estamos com a corda em torno do pescoço; temos de
nos salvar!
—
Bem, eu certamente pretendo fazer isso. Doris e eu vamos desaparecer, e
'depressa, e o aconselharia a fazer o mesmo. O que não podemos fazer é ficar
por aqui.
—
Onde poderei encontrá-lo?
—
Não vou dizer-lhe pelo telefone. O gabinete de Norm Mattily entrará em contato
com você. Será sinal de que consegui chegar a ele, e, de qualquer forma, essa é
a única forma de eu lhe ser útil.
—
Se eu não estiver aqui, se tiver dado o fora da cidade, ou aparecer morto, diga
ao seu amigo que entre em contato com Al Lemley no Times de Nova York. Tentarei
deixar recado com ele.
—
Verei você um dia destes.
—
Vamos orar para que sim.
—
Tenho orado bastante nos últimos dias.
Marshall desligou, trancou todas as portas, e
dirigiu-se a casa.
Ora, quem diria! O telefone tocou. Ela o arrebatou como
uma coruja agarrando um ratinho.
—
Alô?
—
Berenice Krueger?
—
Kevin?
—
Sim... — Ele parecia nervoso e agitado. — Ei, estou morrendo, quero dizer,
estou realmente apavorado!
—
Onde você está, Kevin?
—
Em casa. Ei, alguém entrou aqui e bagunçou o lugar!
—
A porta está fechada?
—
Está.
—
Então por que não a tranca?
—
Sim, já tranquei. Estou com medo. Eles devem ter mandado alguém atrás de mim.
—
Muito cuidado com o que disser, Kevin. O que ouvimos dizer acerca dos nossos
telefones estarem grampeados é provavelmente certo. Podem ter grampeado o seu
telefone.
Weed não disse nada por um momento; então praguejou de puro pavor.
—
Acabei de receber um telefonema de você sabe quem! Acha que eles ouviram a
nossa conversa?
—
Não sei. Precisamos ter cuidado.
—
E o que vou fazer? Está tudo vindo abaixo. Susan diz que tem a mercadoria, e
está tudo vindo abaixo! Ela vai dar o fora...
Berenice interrompeu-o.
—
Kevin, não diga mais nenhuma palavra. E melhor você me dizer pessoalmente.
Vamos nos encontrar em algum lugar.
—
Mas eles não ficarão sabendo onde nos encontraremos?
—
Se souberem, saberão, mas pelo menos teremos algum controle sobre o que
ouvirão.
—
Bem, então vamos depressa, e estou dizendo depressa!
—
Que tal a ponte ao norte de Baker, a do rio Judd?
—
A verde grandona?
—
Ela mesmo. Há uma saída bem ao norte dela. Posso estar lá em torno... —
Berenice olhou para o relógio de parede —... digamos das 7:00.
—
Estarei lá.
— Certo. Até logo.
Berenice ligou imediatamente para o Clarim. Nada.
Ligou para a casa de Marshall.
Kate, as mãos um tanto trêmulas, a respiração conscientemente
controlada, os olhos marejados de lágrimas, olhava para o marido.
—
O telefone sempre traz más notícias — gracejou ela, baixando os olhos por um
instante.
No momento Marshall tinha tanta força íntima quanto um saco de
lixo vazio e, coisa rara em sua vida, não sabia o que dizer.
—
Quando foi que recebeu o chamado? — perguntou ele afinal.
—
Hoje de manhã.
—
Mas não sabe quem era?
Kate respirou fundo, tentando manter-se acima das emoções.
—
Fosse quem fosse, sabia praticamente tudo sobre mim, sobre você, e até sobre
Sandy; não era apenas um engraçadinho. As. credenciais dele eram
impressionantes.
—
Mas ele estava mentindo! — disse Marshall furioso.
—
Eu sei — respondeu Kate com firmeza.
—
Não passa de mais uma tática para sujar meu nome, Kate. Estão tentando tomar o
meu jornal, estão tentando tomar a minha casa, e agora estão tentando destruir
o meu casamento. Não existe, nem jamais existiu nada entre mim e Berenice. Pela
madrugada, tenho idade para ser pai dela!
—
Eu sei — respondeu Kate, e fez uma pausa, tentando conseguir forças para
continuar. — Marshall, você é o meu marido, e se algum dia eu o perdesse sei
que jamais encontraria outro melhor. Também sei que você não é de jogar suas
paixões por aí. Tirei a sorte grande com você e jamais me esqueci disso.
Ele tomou a mão dela.
—
E você é toda a mulher que eu jamais poderia desejar. Ela apertou a mão dele,
dizendo:
—
Tenho confiança em que essas coisas jamais mudarão. Suponho que é esse tipo de
confiança que me tem feito continuar, esperando...
—
Marshall — disse ela afinal — há algumas outras coisas que também não mudaram,
mas essas deviam ter mudado; fizemos um acordo, você e eu, de que mudariam.
Concordamos em que as coisas seriam diferentes depois que nos mudássemos de
Nova York, que você não se mataria mais no trabalho, que teria mais tempo para
a família, que talvez conseguíssemos nos conhecer novamente e consertar as
coisas —. As lágrimas começaram a cair e lhe era difícil falar, mas estava
decidida, e continuou. — Não sei o que é, se o maior furo jornalístico
simplesmente o segue não importa aonde vá ou se é você mesmo quem o inventa,
vez após vez. Mas se algum dia eu tivesse ciúme e suspeitasse de uma amante, a
amante seria o seu trabalho. Você realmente tem outro amor, Marshall, e não sei
se posso competir com ele.
Marshall sabia que jamais conseguiria explicar tudo.
—
Kate, você não imagina o tamanho da coisa toda. Ela meneou a cabeça. Não queria
ouvir.
—
Não é esse o problema. Para dizer a verdade, tenho certeza de que é grande, que
é extremamente importante, provavelmente justifica a quantidade de tempo e energia
que você lhe tem dedicado. Mas o que tenho de tratar agora é o prejuízo que
essa coisa toda tem-me causado, e a Sandy, e a esta família. Marshall, não sou
dada a
fazer comparações; não importa onde Sandy e eu tenhamos sido
colocadas em sua lista de prioridades, ainda estamos sofrendo, e esse é o
problema que tenho de enfrentar. Não me importo com nada mais.
—
Kate... é isso o que eles querem!
—
Estão conseguindo — respondeu ela abruptamente. — Mas não se atreva a jogar a
culpa sobre ninguém mais pelo seu fracasso em cumprir o que prometeu, Marshall,
e estou exigindo o cumprimento das promessas que fez à sua família.
—
Kate, não pedi que isto surgisse, não pedi que acontecesse. Quando tudo
terminar...
—
Já terminou! E não é realmente uma questão de escolha para mim. Tenho minhas
limitações, Marshall. Sei quanto consigo agüentar. Tenho de ir embora.
Marshall estava fraco demais para dizer alguma coisa. Não conseguia pensar em
algo que dizer. Tudo o que podia fazer era olhá-la nos olhos e deixá-la falar,
deixá-la fazer o que quer que fosse que tivesse de fazer.
Kate continuou. Ela tinha de pôr tudo para fora antes que
não conseguisse fazê-lo.
—
Conversei com minha mãe hoje cedo. Ela ficou firme ao lado de nós dois, e não
está tomando partido de maneira alguma. De fato, e pode ser que você ache isto
interessante, ela tem orado por nós, por você em particular. Ela disse que até
sonhou com você outra noite; sonhou que você estava em apuros e que Deus
enviaria seus anjos a fim de ajudá-lo, se ela orasse. Ela levou a coisa toda
muito a sério e tem orado desde então.
Marshall sorriu fracamente. Apreciava aquilo, mas que
bem estava fazendo? Kate chegou ao que realmente importava.
—
Vou ficar com ela uns dias. Preciso de tempo para pensar. E você precisa
de tempo para pensar. Nós dois precisamos saber ao certo quais das suas
promessas você está realmente disposto a cumprir. Precisamos resolver isso de
uma vez por todas, Marshall, antes de darmos mais um passo que seja. Quanto a
Sandy, neste exato momento não sei onde ela se encontra. Se eu pudesse
encontrá-la pediria que viesse comigo, embora duvide que ela quisesse deixar
Shawn e tudo em que estão envolvidos —. Ela inspirou fundo enquanto essa nova
dor tomava conta de seu ser. — Tudo o que posso dizer é que você já não a
conhece, Marshall. Eu não a conheço. Ela foi-se afastando de mansinho, de
mansinho... e você nunca estava por perto —. Ela não pôde continuar. Enterrou o
rosto nas mãos e chorou.
Marshall perguntou-se se deveria aproximar-se dela,
abraçá-la.
Será que ela aceitaria seu abraço? Poderia acreditar que ele a amava?
A verdade era que seu próprio coração estava-se partindo. Foi até ela e colocou
com suavidade a mão em seu ombro.
—
Não lhe darei nenhuma resposta feita — disse ele baixinho. — Você tem razão.
Tudo o que disse está certo. E não me atrevo a fazer no momento nenhuma outra
promessa que talvez não possa cumprir —. As palavras machucavam mesmo enquanto
ele se forçava a dizê-las. — Realmente preciso pensar a respeito. Preciso fazer
uma verdadeira limpeza. Por que não faz o que disse? Vá passar uns tempos com
sua mãe, deixe toda esta confusão. Eu... eu a avisarei quando tudo terminar,
quando tiver resolvido o que é importante. Nem mesmo pedirei que volte até
então.
—
Eu o amo, Marshall — disse ela chorando.
—
Também a amo, Kate.
Ela se ergueu subitamente e abraçou-o, dando-lhe um beijo
de que ele se lembraria por muito tempo, um beijo quando se agarrava
desesperadamente a ele, quando o rosto estava molhado de lágrimas, quando o
pranto lhe sacudia o corpo. Ele a segurou com seus fortes braços como se
estivesse agarrando-se à própria vida, a um tesouro precioso que poderia jamais
voltar a ter.
Então ela disse:
—
É melhor eu ir — e lhe deu um abraço final.
Ele a segurou por um último instante e depois disse tão confortadoramente
quanto pôde:
—
Vai dar tudo certo. Adeus.
As malas delas já estavam feitas. Ela não levou muita coisa. Depois que
a porta se fechou silenciosamente e o carro saiu, Marshall permaneceu sentado
sozinho à mesa da cozinha por longo tempo. Entorpecido, ele permaneceu com os
olhos fixos nos veios da madeira da mesa, mil lembranças inundando-lhe a mente.
Minuto após minuto se passaram sem que ele o percebesse; o mundo continuava
sem ele.
Afinal à medida que todos os seus pensamentos e sentimentos vieram
repousar sobre o nome dela, seu estupor desmoronou:
— Kate... — e ele chorou e chorou.