sexta-feira, 7 de maio de 2021

Este mundo tenebroso - volume 01 - Capítulo 37


 Sandy Hogan continuava a se enfeitar em frente ao espelho no banheiro de Shawn, escovando nervosamente os cabelos, examinando a maquiagem. Oh, espero estar com boa apa­rência hoje... o que direi, o que farei? Nunca estive em uma reunião como essa antes.

Shawn lhe havia dado uma notícia extraordinariamente boa: A professora Langstrat havia achado que Sandy era um excelente exem­plar com habilidades psíquicas excepcionais, tanto que Sandy estava agora sendo considerada como principal candidata à especial ini­ciação em algum tipo de exclusiva comunidade de médiuns, uma sociedade internacional! Sandy lembrava-se agora de ter ouvido menção passageira a algum tipo de grupo de Percepção Universal, e sempre havia parecido algo muito elevado, muito secreto, sagrado mesmo. Jamais havia sonhado que uma oportunidade tão extraor­dinária lhe seria concedida, a de ficar conhecendo de fato outros médiuns e tornar-se parte de seu círculo de confiança! Ela podia imaginar as novas experiências e as percepções mais elevadas que poderiam ser obtidas na companhia de tanta gente talentosa, todas elas combinando suas habilidades e energias psíquicas na busca in­cessante de iluminação!

Madeline, você teve alguma coisa que ver com isto? Espere só até nos encontrarmos de novo! Tenho um abraço e mil agradecimentos para lhe dar!

 Berenice, Susan e Kevin não podiam fazer nada além de tentar preservar as provas que Susan, a tão grave risco, havia ajuntado. Berenice reproduziu todas as fotos que Susan havia tirado, e Kevin fez fotocópias das reproduções, juntamente com cópias de todo o resto do material. Berenice examinou o prédio à procura de um bom lugar para esconder aquilo. Susan examinou um mapa e considerou diferentes rotas de fuga da cidade, diferentes meios de escapar, di­ferentes pessoas que poderiam chamar assim que saíssem.

Então o telefone tocou. Eles o haviam ignorado antes e deixado que a secretária eletrônica grunhisse a mensagem de sempre. Mas desta vez, depois do apitinho, uma voz disse:

— Alô, aqui fala Harvey Cole, e acabei de trabalhar naquelas contas que você me deu...

— Espere! — disse Berenice. — Aumente o volume!

Susan engatinhou rumo à escrivaninha no escritório da frente onde se encontrava a secretária eletrônica e aumentou o volume. A voz de Harvey Cole continuou:

— Realmente preciso falar com você o mais rápido possível. Berenice agarrou o telefone no escritório de Marshall.

— Alô? Harvey? Aqui é Berenice! Susan e Kevin ficaram horrorizados.

— O que você está fazendo?

— Os tiras vão ouvir isso, cara!

Harvey disse pelo telefone e também através do volume aumentado da secretária eletrônica:

— Oh, você está aí! Ouvi dizer que tinha sido presa ontem à noite. A polícia não me quer dizer nada. Eu não sabia para onde ligar...

— Harvey, ouça apenas. Tem caneta ou lápis?

— Sim, agora tenho.

— Chame meu tio. Seu nome é Jerry Dallas; o número é 240-9946. Diga-lhe que me conhece, diga-lhe que é uma emergência, e diga que tem material para mostrar a Justin Parker, o promotor municipal.

— O quê? Não tão depressa.

Berenice passou com esforço a informação mais uma vez, mais devagar.

— Agora, esta conversa está provavelmente sendo ouvida por Alf Brummel ou um de seus asseclas do Destacamento de Polícia de Ashton, por isso quero que você garanta que se alguma coisa me acontecer, essa informação ainda irá parar nas mãos do promotor a fim de que ele comece a indagar o que está acontecendo nesta cidade.

— Devo anotar isso também?

— Não. Apenas entre em contato com Justin Parker. Se por acaso for possível, peça que ele nos ligue aqui.

— Mas, Berenice, eu ia dizer, está bem claro que os fundos têm saído, mas os registros não mostram onde...

— Temos os registros que mostram onde. Temos tudo. Diga isso ao meu tio.

— Está bem, Berenice. Você realmente está em apuros, então?

— A polícia está atrás de mim. Provavelmente descobrirão que estou aqui porque estou falando com você e o telefone foi grampeado. É melhor apressar-se!

— É, sim, está bem! Harvey desligou depressa.

Susan e Kevin se entreolharam e em seguida fitaram Berenice. Ela lhes devolveu o olhar e pôde dizer apenas:

— Sei que é um risco. Susan deu de ombros.

— Bem, não tínhamos nenhuma idéia melhor.

O telefone tocou novamente. Berenice hesitou, esperando que a secretária eletrônica repassasse seu pequeno recitativo. Então veio a voz.

— Marshall, aqui fala Al Lemley. Ouça, estou com uns agentes federais alvoroçados aqui em Nova York que querem falar com você acerca do seu homem Kaseph. Faz já algum tempo que estão atrás dele, e se puder fornecer-lhes boa informação, eles estariam interes­sados...

Berenice apanhou o telefone de novo.

— Al Lemley? Aqui é Berenice Krueger. Trabalho para Marshall. Pode trazer esses homens a Ashton hoje?

— O quê? Alô? — surpreendeu-se Lemley. — É você mesma ou é uma gravação?

— Sou muito eu, e precisando da sua ajuda. Marshall está na cadeia e...

— Cadeia?

— Uma acusação forjada. É coisa do Kaseph. Ele está assumindo controle da Faculdade Whitmore hoje às 2:00hs, botou Marshall na geladeira a fim de mantê-lo afastado, e estou fugindo da polícia. É uma longa história, mas seus amigos a adorarão e obtivemos os do­cumentos que provam cada palavra que estou dizendo.

— Qual é mesmo o seu nome?

Berenice esforçou-se por dar o nome de novo e teve de soletrá-lo duas vezes.

— Ouça, eles grampearam este telefone, por isso provavelmente sabem onde estou agora, e assim poderia fazer o favor de apressar-se em vir e trazer todos os mocinhos que conseguir encontrar? Não sobrou nenhum nesta cidade.

Al Lemley ouvira o bastante.

— Está bem, Berenice, farei toda e qualquer coisa que puder. E é melhor esses vagabundos que grampearam seu telefone ficarem sa­bendo que se as coisas não estiverem um perfeito docinho de coco quando chegarmos aí, é garantido que teremos encrenca!

— Chegue ao Prédio da Administração no campus da Faculdade Whitmore às 2:00hs ou antes.

— Até as 2:00.

A esta altura Kevin e Susan estavam começando a ficar um pouco mais animados.

— Era isso o que você queria? — perguntou Susan. — Outro mi­lagre?

O telefone tocou novamente. Dessa vez Berenice não esperou, mas tirou o aparelho do gancho no mesmo instante. Uma voz disse:

— Alô, aqui é o Secretário da Justiça do Estado Norm Mattily, chamando Marshall Hogan.

Susan não conseguiu abafar um gritinho. Kevin disse:

— Está bem, está bem! Berenice falou com Mattily.

— Sr. Mattily, aqui fala Berenice Krueger, repórter do Clarim. Eu trabalho para o Sr. Hogan.

— Oh... ah, sim... — Mattily parecia estar consultando outra pessoa. — Sim, ah, Eldon Strachan está aqui comigo, e me diz que há algum tipo de encrenca aí em Ashton...

— O pior tipo. Está tudo vindo a furo hoje. Obtivemos umas provas substanciais para lhe mostrar. Quanto tempo demoraria para chegar aqui?

— Bem, não tinha a intenção de fazer isso...

— A cidade de Ashton vai ser tomada por uma organização ter­rorista internacional às 14:00 horas hoje.

— O quê?

Berenice conseguia ouvir a voz abafada de Eldon Strachan, pro­vavelmente martelando o outro ouvido de Mattily.

— Ah... bem, onde está o Sr. Hogan? Strachan está preocupado com a segurança dele.

— Tenho certeza de que o Sr. Hogan não está nada seguro. Eu e ele caímos na emboscada dos bandidos locais ontem a noite durante uma investigação de rotina. Marshall os deteve enquanto eu fugi Tenho-me escondido desde então e não tenho a menor idéia do que aconteceu ao Sr. Hogan.

— Pela madrugada! Você está... — Eldon continuava falando no outro ouvido de Mattily. — Bem, precisarei de algum tipo de prova concreta, algo que agüente o tranco legalmente...

— Isso nós temos, mas precisaremos de sua intervenção direta e imediata. Pode vir e trazer policiais verdadeiros consigo? É questão de vida e morte.

— É melhor que isto seja pra valer!

— Por favor, chegue aqui antes das 14:00hs. O melhor seria en­contrar-se conosco no Prédio da Administração no campus da Fa­culdade Whitmore.

— Muito bem — disse Mattily, sua voz ainda soando um tanto hesitante — irei até aí e verei o que tenha para mostrar.

Berenice desligou e o telefone prontamente tocou de novo.

— Clarim.

— Alô, aqui fala o Promotor Municipal Justin Parker. Com quem estou falando?

Berenice tapou depressa o bocal com a mão e sussurrou para Susan:

Existe um Deus, sim!

 Alf Brummel não agüentava mais. As coisas estavam-lhe esca­pando ao controle, coisas que muito tinham a ver com seu próprio futuro e segurança. Não podia ficar afastado da delegacia por mais tempo. Tinha de ir lá a fim de tomar conhecimento do que estava acontecendo, a fim de evitar que as coisas se transtornassem irreversivelmente, a fim de... oh, onde estavam as chaves do carro?

Ele entrou no veículo e voou pela cidade rumo à delegacia.

O Remanescente ainda cantava no estacionamento quando ele che­gou, e até ele descobrir quem eram e por que estavam ali, era tarde demais para escapulir. Teve de entrar e estacionar.

Eles convergiram sobre seu carro como voraz enxame de pernilongos.

— Onde esteve até agora, Delegado?

— Quando é que o Hank vai sair?

— Mary gostaria de vê-lo.

— Barbaridade, o que pensa estar fazendo com aquele homem? Ele não estuprou ninguém!

— É bom que esteja pronto para dizer adeusinho ao seu emprego!

Capriche, Alf, se tencionar salvar o que sobrou de você.

— Ah, onde está Mary?

Mary acenou-lhe dos degraus da frente do tribunal. Ele tentou abrir caminho diretamente até ela, e uma vez que as pessoas viram a direção na qual ele se encaminhava, mostraram-se mais do que dis­postas a deixá-lo passar.

Mary começou a fazer perguntas assim que ele chegou ao alcance dos seus gritos.

— Sr. Brummel, gostaria de ver o meu marido e como se atreve a permitir esta farsa?

Jamais em sua vida Brummel vira a doce e aparentemente vul­nerável Mary Busche tão agressiva. Ele tentou pensar numa resposta.

— Tem sido um hospício por aqui. Desculpe eu ter estado fora...

— Meu marido é inocente, e você sabe disso! — disse ela com bastante firmeza. — Não sabemos como pretende safar-se desta mas estamos aqui para garantir que não o fará.

A esse comentário, uma lufada de gritos de apoio reboou da mul­tidão. Brummel tentou usar o método de intimidação.

— Agora escutem, todos vocês! Ninguém está acima da lei, não importa quem seja. O Pastor Busche foi acusado de ofensa sexual, e não tenho escolha a não ser cumprir o meu dever como agente da lei. Não posso fazer nada se somos amigos ou membros da mesma igreja, esta é uma questão de lei...

— Besteira! — veio um brado gutural de perto de Brummel.

O delegado voltou-se na direção da voz para corrigi-la, mas tornou-se pálido ao deparar-se com Lou Stanley, seu antigo companheiro de armas.

Lou manteve-se firme, uma mão na cinta, a outra apontando di­retamente para o rosto de Brummel, enquanto dizia:

— Você falou de fazer uma tramóia dessas muitas vezes, Alf! Já o ouvi dizer que tudo o de que precisava era a oportunidade certa. Ora, o que estou dizendo agora é que foi o que fez. Estou acusando-o, Alf! Se alguém quiser o meu depoimento em qualquer tribunal, estou pronto a dar!

Um viva e algumas vaias soaram.

Então Brummel levou outro susto. Gordon Mayer, o tesoureiro da igreja, colocou-se à frente da multidão, e também apontou um dedo para o rosto de Brummel.

— Alf, simples divergência é uma coisa, mas conspiração aberta é outra muito diferente. E bom ter certeza do que está fazendo.

Brummel estava encurralado.

— Gordon... Gordon, temos de fazer o melhor... nós...

— Bem, não conte comigo! — disse Mayer. — Já fiz o bastante por você!

Brummel voltou as costas aos dois antigos companheiros apenas para dar de cara com o repentinamente limpo Bobby Corsi!

— Ei, delegado Brummel — disse Bobby. — Lembra-se de mim? Adivinhe para quem estou trabalhando agora.

Brummel ficou mudo. Pôs-se a caminhar rumo à porta do depar­tamento policial, como se ali houvesse abrigo de todo esse desastre.

Andy Forsythe não se colocou em seu caminho, mas acompanhou-o perto o bastante para fazê-lo deter-se.

— Sr. Brummel — disse Andy — há uma jovem esposa lá atrás que ainda gostaria que seus pedidos fossem considerados.

Brummel andou mais depressa. — Verei o que posso fazer, está bem? Deixe-me verificar a situação das coisas. Um instantinho. Vol­tarei num momento.

Tão depressa quanto pôde, ele passou pela porta e a trancou atrás de si. A multidão seguiu-o como uma onda e encostou-se à porta, uma barricada a barrar-lhe a saída.

A nova recepcionista encontrava-se sentada à mesa de recepção, os olhos arregalados, olhando através da janela a todos aqueles rostos enraivecidos.

— Devo... devo chamar a polícia? — perguntou ela.

— Não — disse Brummel. — São apenas alguns amigos que vieram me ver.

Com isso, ele desapareceu escritório adentro e fechou a porta.

Juleen, Juleen! Era culpa dela! Ele estava enjoado dela, enjoado da coisa toda!

Ele viu um bilhete na sua mesa. Sam Turner havia deixado um recado para que ligasse. Ele discou o número e Sam atendeu.

— Como estão as coisas, Sam? — perguntou Brummel.

— Nada bem, Alf. Ouça, estive no telefone a manhã toda e ninguém quer convocar uma assembléia de emergência da congregação. Eles não têm a menor intenção de botar Hank para fora, e pouca gente acredita nesse negócio de estupro. Não há como negar, Alf, você fracassou.

— Eu fracassei? — explodiu Brummel. — Eu fracassei? A idéia não foi sua também?

— Não diga uma coisa dessas! — veio muito ameaçadora a resposta de Turner. — Jamais diga uma coisa dessas!

— Então agora você também não me vai apoiar.

— Não há nada para apoiar, Alf. O plano furou. Busche é um escoteiro e todo o mundo sabe disso, e você não vai conseguir fazer essa acusação de estupro colar.

— Sam, entramos nisso juntos! Ia dar certo!

— Mas não deu, amigão. Hank veio para ficar, é assim que vejo a coisa, e estou me retirando de tudo isso. Faça o que tiver de fazer, mas é melhor fazer algo, ou seu nome não vai valer um monte de esterco quando tudo tiver terminado.

— Ora, muitíssimo obrigado, amigão! — Brummel desligou com raiva.

Ele olhou para o relógio. Era quase meio-dia. A reunião começaria em duas horas.

Hogan. Ele ainda tinha de dar um recado a Hogan acerca de Sandy. Puxa vida, aí estava outra das boas encrencas de Juleen. Claro, Juleen, pode deixar! Já estou enrascado com essa acusação forjada contra Busche, e agora você quer-me ver declarado cúmplice de seja lá o que for que esteja planejando para Sandy Hogan.

E que dizer de Krueger? A quem teria ela conseguido dedar a coisa toda? Ele saiu correndo do escritório e foi pelo corredor à sala de rádio-comunicação.

— Alguma coisa sobre a fugitiva? — perguntou ele ao único fun­cionário que ali se encontrava.

O operador empurrou um pedaço de sanduíche de manteiga de amendoim contra a bochecha e disse:

— Não, tudo está muito quieto.

— Nada mesmo no Clarim?

— Há um carro de fora estacionado nos fundos, mas é de outro estado e eles ainda não conseguiram descobrir o registro da placa.

— Não conseguiram...! Descubram o registro dessa placa! Exa­minem o prédio! Pode haver alguém lá dentro!

— Eles não viram ninguém...

— Examinem o prédio! — explodiu Brummel.

A recepcionista chamou do outro lado do corredor:

— Capitão Brummel, Berenice Krueger está no telefone. Quer que deixe recado?

— Nããão! — berrou ele, correndo pelo corredor ao seu gabinete. — Atenderei aqui!

Ele bateu a porta atrás de si e agarrou o telefone.

— Alô? — Ele acertou o segundo botão do seu telefone. — Alô?

— Sr. Alf Brummel! — veio uma voz muito condescendente.

— Berenice!

— Está na hora de termos uma conversa.

— Muito bem. Onde está você?

— Não seja um refinado idiota. Escute, estou chamando para lhe dar um ultimato. Estive falando com o secretário da justiça do estado, o promotor municipal, e a polícia federal. Tenho prova, e estou falando de coisa muito concreta, que desvendará totalmente sua tramoiazinha, e estão todos a caminho para vê-lo.

— Está blefando!

— Você tem as conversas em fita, sem dúvida. É só tocá-las. Brummel sorriu. Ela acabara de revelar onde estava.

— E afinal qual é o seu ultimato?

— Solte Hogan. Agora. E recolha a sua matilha que está atrás de mim. Dentro de duas horas tenho a intenção de mostrar a cara nesta cidade, e não quero saber de ser perturbada, especialmente porque estarei acompanhada de visitantes muito especiais!

— Você está no Clarim agora, não está?

— Sim, claro que estou. E posso ver... qual é mesmo o nome dele? Kelsey, sentado lá fora naquele caco velho, ele e o companheiro, Michaelson. Quero que recolha esses caras. Se não, todos os grandões do mundo saberão o que aconteceu comigo. Se o fizer, poderá contar a seu favor.

— Você está... ainda digo que está blefando!

— Toque a sua maquininha de grampeamento, Alf. Veja se estou falando a verdade. Esperarei para ver o carro ir embora.

Clique. Ela desligou.

Brummel voou ao armário e abriu as portas. Tirou o gravador. Ele hesitou, pensou furiosamente, ficou imóvel por um momento. Em­purrando o gravador de volta ao armário, bateu com força as portas, e disparou pelo corredor à sala de rádio-comunicação.

O operador ainda estava mastigando seu sanduíche. Brummel es­tendeu o braço sobre o colo dele e agarrou o microfone, ligando o transmissor.

— Unidades dois e três, Kelsey, Michaelson, recolher. Repito: re­colher imediatamente.

O operador ergueu os olhos, feliz.

— Ei! O que aconteceu? Krueger se entregou?

Alf Brummel nunca foi bom em retrucar quando as perguntas eram idiotas ou fora de hora. Ele disparou pelo corredor à recepção e discou o número do tribunal.

— Quero falar com Dunlop. Dunlop atendeu.

— Jimmy, Hogan e Busche vão sair sob minha responsabilidade pessoal. Solte-os.

Jimmy fez-lhe mais algumas perguntas idiotas.

— Apenas faça o que mandei e deixe a papelada por minha conta! Agora, vá!

Ele bateu o telefone e desapareceu escritório adentro. A recepcio­nista continuava a olhar pela janela a todas aquelas pessoas. Estavam recomeçando a cantar. O som era bonito.

 Berenice, Susan e Kevin esperaram nervosos que uma coisa muito boa ou muito ruim acontecesse. Ou Brummel acederia ou eles es­tariam ficando altos em gás lacrimogêneo dentro de minutos. Mas então ouviram a partida de um motor do outro lado da rua.

— Ei! — disse Kevin.

Susan ainda retorcia as mãos. Berenice apenas observava, sem poder acreditar numa coisa boa muito prontamente. O velho carro se foi, carregando Kelsey e Michaelson.

Berenice não quis esperar.

— Vamos arrumar toda esta coisa na mala e chegar ao tribunal. Marshall vai precisar pôr as novidades em dia.

— Não precisa dizer isso duas vezes! — disse Kevin. Tudo o que Susan conseguiu dizer foi:

— Obrigada, Deus. Obrigada, Deus!

 Alf Brummel ouviu apenas um breve segmento de uma conversa telefônica, aquela entre Berenice e o Secretário da Justiça do Estado Norm Mattily. Ele conhecia a voz de Mattily, e, sim, fazia perfeito sentido o fato de Eldon Strachan ter procurado Mattily, se Strachan tivesse alguma informação genuinamente digna de confiança.

Brummel praguejou alto. Informação de confiança! Tudo o que Mattily precisava fazer era encontrar essa lindeza de gravador ali, ligado ilegalmente a todos aqueles telefones!

Um zumbido indicou um chamado da recepcionista. Esticando o braço à escrivaninha, ele apertou o botão do interfone.

— Sim? — disse, muito irritado.

— Juleen Langstrat na linha dois — disse ela.

— Pegue o recado! — disse ele, e desligou o seu botão.

Ele sabia por que ela estava chamando. Ia amolar-lhe a paciência, lembrá-lo de estar na reunião daquela tarde que envolvia Sandy Hogan.

Ele abriu a outra porta do armário e tirou os livros e as fitas gra­vadas. Mas afinal onde poderia esconder todo aquele negócio? Como poderia destruí-lo?

O sinal da recepcionista zumbiu novamente.

— O quê?

— Ela insiste em que o senhor fale com ela.

Ele apanhou o aparelho, e a voz oleosa de Langstrat veio pela linha.

— Alf, está pronto para hoje?

— Sim — respondeu ele impaciente.

— Então faça o favor de vir assim que puder. Precisamos preparar as energias das salas antes que a reunião comece, e quero ter todas as coisa em uníssono antes que Shawn chegue com Sandy.

— Então você realmente vai envolvê-la nisto?

— Apenas como garantia, naturalmente. Marshall Hogan foi afastado, mas precisamos estar certos de que continuará assim, pelo menos até que todos os nossos esforços e visões tenham-se cumprido e a cidade de Ashton tenha empreendido o salto vitorioso para dentro da Percepção Universal —. Ela fez uma pausa para saborear o pen­samento por um instante, e então perguntou sem grande interesse:

— E teve alguma notícia de nossa ladra fugitiva? Antes mesmo de saber por que o fazia, ele mentiu:

— Não, nada ainda. Ela está afastada.

— Certamente. Garanto que será encontrada logo, e depois de hoje ela não terá nenhuma esperança.

Ele nada respondeu. Estava subitamente distraído por um pensa­mento que o inundou como uma onda de três metros: Alf, ela acre­ditou em você. Ela realmente não sabe!

— Você vem imediatamente, Alf? — ela perguntou e ordenou ao mesmo tempo.

Ela não sabe o que aconteceu, era tudo o que Brummel conseguia pensar. É vulnerável! Eu sei algo que ela não sabe!

— Irei já, já — disse ele, mecanicamente.

— Até já — disse ela com finalidade autoritária, e desligou.

Ela não sabe! Acha que está indo tudo bem e que não haverá encrenca! Acha que conseguirá fazer tudo isso sem ser apanhada!

Brummel permitiu que seus pensamentos voassem enquanto con­siderava suas opções, a informação exclusiva que acabara de receber, e o estranho senso de poder que ela lhe dava. Sim, estava tudo praticamente acabado, e era provável que ele afundasse... mas tinha o poder de levar aquela mulher, aquela aranha, aquela bruxa, para baixo consigo!

De repente, já não sentia desejo de destruir as fitas e os livros. As autoridades que os encontrassem. Que encontrassem tudo. Talvez ele até lhes mostrasse.

Quanto ao Plano, se Kaseph e sua Sociedade são tão oniscientes e tão invencíveis, por que deveria você contar-lhes coisa alguma? Eles que descubram por si mesmos!

"Não seria bom ver a sua cara Juleen suando uma vez na vida?" perguntou Lucius.

— Seria bom ver Juleen suando uma vez na vida — murmurou Brummel.