sexta-feira, 7 de maio de 2021

Este mundo tenebroso - volume 01 - Capítulo 38

Hank e Marshall saíram pela porta do porão do tribunal e se acharam sozinhos. Seus amigos ainda estavam congre­gados à porta do departamento de polícia, cantando, con­versando, orando, demonstrando.

— O Senhor seja louvado! — foi tudo o que Hank pôde dizer.

— Oh, eu acredito, acredito — respondeu Marshall.

Foi John Coleman quem primeiro os viu e soltou um viva. Os outros todos volveram as cabeças e ficaram chocados e exultantes. Saíram correndo na direção de Hank e Marshall, como galinhas à ração.

Mas abriram caminho para Mary, chegando mesmo a dar-lhe empurrõezinhos carinhosos quando ela passava por eles. O Senhor era tão bom! Ali estava a querida Mary de Hank, chorando e abraçando-o e sussurrando-lhe que o amava, e ele mal podia acreditar que isso estava realmente acontecendo. Jamais se sentira tão separado dela.

— Você está bem? — perguntava ela repetidas vezes, e ele respon­dia:

— Estou bem, muito bem.

— É um milagre — disseram os outros. — O Senhor respondeu às nossas orações. Ele os tirou da prisão da mesma forma que a Pedro.

Marshall compreendeu quando praticamente o ignoraram. Aquela era a hora de Hank.

Mas o que estava acontecendo ali adiante? Através das cabeças, ombros e corpos, Marshall notou Alf Brummel escapulindo rapi­damente pela porta da frente, entrando no carro e partindo a toda. Aquele nojento. Se eu fosse ele, faria o mesmo.

E ali vinha... Não! Não, não podia ser! Marshall pôs-se a abrir lentamente caminho entre a multidão, espichando o pescoço a fim de certificar-se de que os passageiros no carro que acabava de chegar eram quem pareciam ser. Sim! Berenice até lhe acenava! E lá estava Weed, vivo! Aquela outra moça, a que estava dirigindo... não podia ser! Mas tinha de ser! Nada menos que Susan Jacobson, voltando dentre os mortos!

Marshall conseguiu passar por entre os admiradores de Hank e caminhou com passos rápidos, o rosto aberto em largo sorriso, ao local onde Susan estava acabando de estacionar o carro. Minha nossa! Quando essa gente ora, Deus escuta!

Berenice explodiu do carro e jogou os braços em torno dele.

— Marshall, você está bem? — disse ela, quase chorando.

— Você está bem? — revidou ele. Uma voz atrás deles disse:

— Oh, Sra. Hogan, queria muito conhecê-la.

Era Hank. Marshall fitou o homem de Deus, parado ali todo sor­risos, com a esposa do lado e todo o povo de Deus atrás de si, e sentiu o ímpeto do abraço deixar-lhe os braços.

Berenice deslizou flacidamente do abraço.

— Hank — disse Marshall com o tom quebrantado que Berenice jamais o ouvira usar antes — esta não é a minha esposa. É Berenice

Krueger, minha repórter —. Então Marshall olhou para Berenice e disse com grande amor e respeito:

— É uma ótima repórter!

Berenice soube imediatamente que algo havia acontecido a Mars­hall. Não ficou surpresa; algo tinha acontecido com ela também, e podia ver no rosto de Marshall e detectar em sua voz aquele mesmo quebrantamento íntimo que ela própria vinha sentindo. De alguma forma ela soube que aquele homem em pé ao lado de Marshall tinha algo a ver com tudo o que acontecera.

— E quem é esse seu colega de cadeia? — perguntou ela.

— Berenice Krueger, quero apresentar-lhe Hank Busche, pastor da Igreja da Comunidade de Ashton e meu muito recente, muito bom amigo.

Ela apertou-lhe a mão, empurrando de lado todos os pensamentos e emoções. O tempo estava passando.

— Marshall, escute com cuidado. Temos de lhe dar um curso con­centrado em sessenta segundos!

Hank pediu licença e retornou ao seu excitado rebanho. Quando Berenice apresentou Susan a Marshall, ele pensou que estendia a mão a nada menos que um milagre.

— Ouvi dizer que você havia morrido, e Kevin também.

— Estou ansiosa para lhe contar a história toda — replicou Susan agradavelmente — mas no momento nosso tempo é muito curto e há muita coisa que você precisa saber.

Susan abriu o porta-malas do carro e mostrou a Marshall o con­teúdo de sua mala arrebentada. Marshall regalou-se com cada minuto da revelação. Estava tudo ali, tudo o que ele achou haver perdido para os dedos grudentos de Carmem e para aqueles nojentos da "So­ciedade".

— Kaseph está vindo a Ashton a fim de fechar o negócio com o conselho diretor da faculdade. Às 14:00 horas os papéis serão assi­nados e o campus da Faculdade Whitmore será vendido em surdina à Omni S.A.

— A Sociedade, você quer dizer — respondeu Marshall.

— Claro. É uma jogada-chave. Quando a faculdade cair, a cidade acabará caindo junto.

Berenice interrompeu de chofre com as novidades a respeito de Mattily, Parker e Lemley, quanto mais o fato de Harvey Cole ter decifrado os livros de Baylor.

— E então, quando eles chegam? — perguntou Marshall.

— Esperamos que a tempo para a reunião do conselho. Eu lhes disse que nos encontrassem lá.

— Pode até ser que eu me convide para a reunião. Sei que ficarão todos muito contentes em me ver.

Susan tocou o braço de Marshall e disse:

— Mas precisa ser avisado de que eles têm trabalhado sua filha Sandy.

— E não sei disso?!

— Eles podem tê-la sob sua influência neste instante; é o estilo de Kaseph, acredite. Se você tentar alguma coisa contra ele, pode colocar a vida de Sandy em perigo.

Berenice contou a Marshall acerca de Pat, acerca do diário, acerca do misterioso amigo chamado Thomas, e acerca daquele fingido ad­vogado do diabo, Shawn Ormsby.

Marshall fitou-os por um instante, depois chamou:

— Hank, é aqui que você e a sua gente entram!

 Um domingo de verão em Ashton é geralmente um dos dias mais alegres e tranqüilos da semana. Os fazendeiros batem papo; os bal­conistas desfrutam calma nas atividades; outros comerciantes fecham suas lojas; mamães, papais, e crianças pensam em coisas agradáveis para fazer e lugares interessantes aonde ir. Muitas cadeiras pregui­çosas de jardim são ocupadas, as ruas ficam bem mais quietas, e as famílias geralmente se reúnem.

Mas esse ensolarado domingo de verão não corria bem para nin­guém: um fazendeiro estava com uma vaca inchada nas mãos en­quanto outro estava com um magneto do trator queimado que ninguém parecia ter em estoque; e embora nenhum deles fosse res­ponsável pelos problemas do outro, acabaram brigando. Os balco­nistas que trabalhavam naquele dia estavam tendo dificuldade em contar o troco, e metendo-se em discussões muito desagradáveis com os fregueses cujo troco tentavam contar. Cada comerciante nada mais desejava do que deixar seu negócio porque não importava qual fosse o seu ramo, estava condenado a fracassar mais cedo ou mais tarde. Muitas esposas estavam nervosas e queriam ir a algum lugar, qual­quer lugar, não sabiam aonde; seus maridos faziam a criançada entrar nas peruas, em seguida as esposas não mais queriam ir, então a criançada começava a brigar dentro dos veículos, então seus pais começavam a brigar, e as famílias não iam a parte alguma enquanto as peruas permaneciam estacionadas nas entradas de carro com ber­ros saindo-lhes pelas janelas e as buzinas tocando. As cadeiras pre­guiçosas nos jardins rasgavam-se debaixo dos traseiros dos donos ou simplesmente não podiam ser encontradas; as ruas estavam conges­tionadas com motoristas frenéticos dirigindo sem destino; os cães, aqueles sempre vigilantes cães de Ashton, latiam e uivavam e ganiam, desta feita com os pêlos em pé, as caudas erguidas e as caras voltadas para o leste.

Caras voltadas para o leste? Havia muitas. Aqui um administrador da faculdade, ali um empregado do Correio, acolá uma família de oleiros e tecelões, lá adiante um vendedor de seguros. Por toda a cidade, certas pessoas que conheciam um certo destino e uma certa vibração espiritual de empatia, postavam-se caladas, como que em adoração, os rostos voltados para o leste.

E nada se movia em torno da grande árvore morta. Rafar ergueu-se do grande galho, seu trono de poder como mestre do jogo, e, em pé sobre a colina, dirigiu os maldosos olhos amarelos à cidadezinha de Ashton, ao mesmo tempo em que o séquito de suas hordas de espíritos se reunia em torno dele. Seus braços musculosos se on­dularam, as amplas asas negras erguer-se às suas costas como um manto real, suas jóias brilharam e refulgiram ao sol.

Ele também voltou-se para o leste.

Ele esperou até ver. Então, seu fôlego foi sugado através das presas como um arquejar de surpresa, mas não era surpresa. Era o mais alto tipo de excitação, uma vibração demoníaca que ele apenas raramente sentia, um fruto precioso e muito maduro a ser saboreado somente após muito trabalho e preparo.

A mão coberta de pêlos pretos agarrou o cabo dourado da espada e tirou a lâmina da bainha, fazendo-a cantar e zumbir e tremeluzir com luz vermelho-sangue. Todo o séquito dos demônios arquejou e aplaudiu quando Rafar elevou bem alto a espada, banhando todo o ajuntamento em sua sinistra luz vermelha. As asas enormes desa­pareceram repentinamente em um borrão e com um jato de vento e uma explosão de poder elas o elevaram ao ar, acima do vasto vale, acima da cidadezinha, a descoberto, onde podia ser visto de qualquer parte da cidade ou de qualquer esconderijo perto dela.

Ele ascendeu a grandes alturas e em seguida começou a pairar, a espada ainda na mão. A cabeça se voltava nesta e naquela direção, o corpo girava lentamente, os olhos corriam em redor.

— Capitão dos Exércitos Celestiais! — bradou ele, e os ecos de sua voz estrondosa atravessaram o vale de um lado a outro como trovão. — Capitão Tal, escute-me!

Tal podia ouvir Rafar perfeitamente. Ele sabia que Rafar estava prestes a fazer um discurso, e sabia o que o guerreiro demoníaco iria dizer. Também vigiava o horizonte leste enquanto se mantinha es­condido na floresta, seus principais guerreiros ao seu lado.

Rafar continuou a olhar por toda a parte, procurando algum sinal de seu adversário.

— Eu, que ainda não vi seu rosto nesta nossa aventura, agora lhe mostro o meu! Fitem-no, você e seus guerreiros! Pois hoje coloco este rosto para sempre na sua lembrança como o rosto daquele que o derrotou!

Tal, Guilo, Triskal, Krioni, Mota, Chimon, Natã, Armote, Signa, estavam todos juntos, reunidos para esse momento, reunidos para ouvir esse longamente esperado discurso. Rafar continuou:

— Hoje coloco o nome de Rafar, Príncipe da Babilônia, para sempre em sua lembrança como o nome daquele que permanece ousado e continua invicto! — Rafar deu mais algumas voltas rápidas, procu­rando à sua volta algum sinal de seu inimigo mortal. — Tal, Capitão dos Exércitos Celestiais, ousará mostrar-me seu rosto? Acho que não! E ousará mesmo atacar-me! Acho que não! E você e seu reles ban-dinho de assaltantes se atreverão a colocar-se no caminho dos po-deres do ar? — Rafar irrompeu num riso debochado. — Acho que não!

Fazendo uma pausa de efeito, ele se permitiu um riso zombeteiro.

— Tem minha permissão, caro Capitão Tal, para retirar-se, a fim de se poupar a angústia que o espera às minhas mãos! Concedo agora a você e a seus guerreiros a oportunidade de partirem, pois meu pronunciamento é o de que a decisão da batalha realmente já foi feita!

Então Rafar apontou a espada na direção do horizonte leste e disse:

— Olhe para o leste, capitão. Lá se encontra o resultado claramente escrito!

Tal e seus chefes já estavam olhando na direção do horizonte leste, a atenção arrebatada e inabalável, mesmo quando um mensageiro chegou voando com as novidades:

— Hank e Busche estão livres! Eles... — ele se deteve no meio da sentença. Seus olhos acompanharam todos os outros olhares ao leste, e ele viu o que tanto lhes prendia a atenção.

— Oh, não! — disse ele num sussurro. — Não, não!

A princípio a nuvem tinha sido apenas um ponto distante de trevas emergindo acima do horizonte; poderia ter sido uma nuvem de chuva, ou a chaminé de uma fábrica, ou uma montanha distante escurecida pela neblina que surgia subitamente. Mas então, à medida que se aproximava, seus limites expandiram-se para fora como a lateral da ponta rombuda de uma flecha que emergia lentamente e se estendia devagar e com segurança de um lado a outro do horizonte qual dossel escuro, como constante maré de trevas a bloquear o céu. A princípio um olhar direto podia contê-la; em apenas alguns mi­nutos, os olhos tinham de espraiar-se de um lado a outro, de uma ponta do horizonte a outra.

— Desde a Babilônia — disse Guilo baixinho a Tal.

— Eles estavam lá — disse Tal — cada um deles, e agora voltaram. Olhe as fileiras da frente, voando em múltiplas camadas por cima, por baixo, e no meio.

— Sim — disse Guilo, observando. — Ainda o mesmo estilo de assalto.

Uma nova voz falou:

— Bem, até aqui, Tal, seu plano funcionou muito bem. Saíram todos do esconderijo, e em números incontáveis.

Era o General. Era esperado. Tal respondeu:

— E nossa esperança é que estejam planejando uma estrondosa vitória.

— Pelo menos o seu antigo rival está, pela sua gabolice. Tal apenas sorriu e disse:

— Meu General, Rafar gaba-se com ou sem razão.

— E o Valente?

— Pelo formato da nuvem, eu diria que ele a precede por apenas poucos quilômetros.

— Tendo possuído Kaseph?

— Seria esse o meu palpite, senhor.

O General olhou cuidadosamente para a nuvem que se aproximava, agora cor do negro profundo do carvão, e espalhada como um dossel através do céu. O zumbir grave e ressonante de asas apenas começava a se fazer ouvir.

— Qual é a nossa posição? — perguntou o general. Tal respondeu:

— Estamos preparados.

Então, quando o som das asas cresceu e a sombra da nuvem co­meçou a cobrir os campos e fazendas além de Ashton, um tom aver­melhado pôs-se a permear a nuvem como se ela estivesse queimando por dentro.

— Eles desembainharam as espadas — disse Guilo.

 Por que estou com tanto medo? perguntava-se Sandy.

Cá estava ela, segurando a mão de Shawn, subindo os degraus da frente do Prédio da Administração, prestes a ficar conhecendo al­gumas pessoas que tinham de ser as verdadeiras chaves do seu des­tino, os degraus que a levariam à verdadeira satisfação espiritual, à mais elevada percepção, talvez mesmo à autorealização, e contudo... toda a conversa não conseguia remover um temor enervante que sentia bem no íntimo. Algo simplesmente não estava certo. Talvez fosse apenas o nervosismo normal que alguém sentiria antes do ca­samento ou de qualquer outro evento muito significativo, ou talvez fosse aquele último resquício de sua velha e abandonada herança cristã que ainda a segurava, retendo-a. Fosse lá o que fosse, ela tentou ignorar, vencer pelo raciocínio, usar mesmo as técnicas de descontração que havia aprendido na aula de ioga oferecida pela faculdade.

Vamos, Sandy... respiração estável agora... concentre, concen­tre. .. realinhe suas energias.

Pronto, estava melhor. Não quero que Shawn ou a professora Langstrat ou qualquer outro pense que não estou pronta para fazer parte do grupo.

Enquanto o elevador subia ela falou e tagarelou e tentou rir, e Shawn ria junto, e quanto chegaram ao terceiro andar e à porta que trazia o número 326, ela achou que estava pronta.

Shawn abriu a porta, dizendo:

— Você gostará muito disto — e entraram.

Ela não os viu. Aos olhos de Sandy, essa era apenas a sala de descanso do pessoal da faculdade, um cômodo muito agradável re­coberto por macio tapete, com sofás de couro e mesinhas de centro pesadas, em estilo rústico.

Mas a sala encontrava-se lotada, muito densa e hediondamente povoada, e os olhos amarelos fitavam-na de maneira penetrante e fixa de todos os lados, de cada canto e cadeira e parede. Esperavam por ela.

Um deles sibilou asmaticamente:

— Alô, minha filha.

Sandy estendeu a mão a Oliver Young.

— Pastor Young, que surpresa agradável — disse ela. Outro emitiu uma risadinha longa e babosa e disse:

— Que bom você ter vindo.

Sandy deu um abraço na Professora Juleen Langstrat.

Ela correu os olhos pelo aposento e reconheceu muitos dos pro­fessores da faculdade, alguns dos seus próprios professores, e mesmo alguns homens de negócios e operários da cidade. Lá, no canto, encontrava-se o novo dono da antiga mercearia do Joe. Essas trinta pessoas ofereciam uma perfeita amostra do que Ashton tinha de melhor.

Os espíritos estavam todos prontos e esperando. Engano exibiu-a como se fosse um troféu. Madeline encontrava-se presente, sorrindo maldosa, e ao seu lado achava-se outro cúmplice demoníaco, com volta após volta de pesadas correntes brilhantes enroladas nas mãos ossudas.

 Na nuvem, havia miríades de demônios altivos, selvagens, em­briagados com a antecipação de vitória, chacina, poder e glória sem precedentes. Em baixo deles, a cidade de Ashton era mero brinquedo, um vilarejo tão pequeno num território tão vasto. Camada após ca­mada de espíritos adiantavam-se num zumbido constante, e miríades de olhos amarelos espiavam o prêmio lá embaixo. A cidade estava quieta e desprotegida. Baal Rafar fizera bem o seu trabalho.

Uma série de guinchos ásperos saíram das fileiras da frente da nuvem; os generais davam ordens. Imediatamente, os demônios co­mandantes nas orlas da nuvem transmitiram as ordens aos enxames atrás de cada um deles, e à medida que os comandantes deixavam a nuvem e começavam a voar para baixo, seguidos de seus incon­táveis esquadrões, as laterais da nuvem principiaram a afrouxar e a se estender na direção do chão.

 Na sala de conferências, ampla e formalmente mobiliada, no ter­ceiro andar, os membros do conselho começaram a reunir-se. Eugene Baylor encontrava-se lá com uma pilha de livros e relatórios finan­ceiros, fumando charuto e sentindo-se animado. Dwight Brandon parecia um tanto sombrio, mas não o suficiente para manter-se ca­lado. Delores Pinckston não se sentia nada bem, e apenas desejava que o negócio todo acabasse. Os quatro advogados de Kaseph, muito profissionais, afiados, entraram com um sorrisinho. Adam Jarred entrou casualmente e parecia mais preocupado em ir pescar depois do que com o negócio que estariam conduzindo. De vez em quando, alguém consultava o relógio de pulso ou olhava para o enfeitado relógio de parede. Logo seriam 14:00 horas. Alguns estavam-se sen­tindo um pouco nervosos.

Os espíritos malignos que haviam entrado no aposento também estavam-se sentindo nervosos, percebiam que logo estariam na pre­sença do Valente. Essa seria a primeira vez para eles.

 A longa limusine preta de Kaseph, dirigida por motorista parti­cular, adentrou os limites da cidade e virou na Rua da Faculdade.

Kaseph, sentado em esplendor real no banco de trás, carregava a pasta no colo e lançava olhares cobiçosos através do vidro esfumaçado das janelas à linda cidade que atravessavam. Ele fazia planos, vislumbrando mudanças, decidindo o que manteria e o que remo­veria.

O mesmo fazia o Valente, sentado dentro dele, que riu seu riso grave, gorgolejante. Kaseph riu da mesma forma. O Valente não con­seguia lembrar-se de quando estivera tão contente e tão orgulhoso.

 A nuvem estava frouxa nas beiradas enquanto continuava a adian­tar-se, e Tal e sua companhia continuavam a observar de seu escon­derijo.

— Estão abaixando seu perímetro — disse Guilo.

— Sim — disse Tal, fascinado. — Como sempre, tencionam conter a cidade por todos os lados antes de chegarem a descer sobre ela.

Enquanto olhavam, as laterais da nuvem caíram como negras cor­tinas que gradualmente envolveram a cidade; demônios deslizavam a fim de ocupar seus lugares como tijolos numa parede. Cada espada estava desembainhada, cada olho cauteloso.

— Hogan e Busche? — perguntou Tal a um mensageiro.

— Eles estão-se dirigindo a seus lugares, juntamente com o Re­manescente — respondeu o mensageiro.

 A limusine de Kaseph deslanchou na direção da faculdade, e Ka-seph pôde ver os imponentes prédios de tijolos vermelhos despon­tando entre os bordos e carvalhos que cercavam o campus. Ele olhou ao relógio. Chegaria bem na hora.

Quando a limusine passou por uma intersecção, uma viatura po­licial verde, sem marca identificadora, entrou na Rua da Faculdade e pôs-se a segui-la. Seu motorista era o Delegado de Polícia Alf Brum­mel. Parecia sombrio e muito nervoso. Ele sabia a quem estava se­guindo.

Quando a limusine, e a seguir a viatura, passaram por outra in­tersecção, o semáforo mudou e toda uma fila de carros dobrou à direita, entrando na Rua da Faculdade, seguindo atrás dos outros dois. O primeiro veículo a fazer a curva foi o marrom.

— Ora, ora! — disse Marshall quando ele, Hank, Berenice, Susan e Kevin perceberam os dois carros que estavam seguindo.

— Você reconheceu Kaseph? — perguntou Susan a Berenice.

— Sim, o bom velhinho em pessoa. Marshall ficou em dúvida:

— Mas o que está acontecendo aqui? Parece que a reunião ainda está em pé, apesar de tudo.

Berenice falou:

— Talvez Brummel não me tivesse acreditado, afinal de contas.

— Oh, acreditou, sim. Ele fez tudo o que você lhe disse que fizesse.

— Então por que Kaseph não desmarcou a reunião? Ele está-se dirigindo diretamente para ela.

— Ou Kaseph pensa que é intocável, ou Brummel nada lhe disse. Hank olhou para trás deles.

— Parece que todos conseguiram atravessar o semáforo.

Os outros olharam para trás. Sim, lá estava Andy, dirigindo sua perua Volkswagen lotada de crentes que confiavam na oração, e lá vinha a caminhonete de Cecil Cooper com a cabina e a carroceria cheias de gente. A perua de John e Patty Coleman seguia logo atrás, e nalgum lugar lá adiante vinha o antigo pastor, James Farrel, diri­gindo um furgão de bom tamanho, transportando Mary, e vovó Duster e diversos outros irmãos.

Marshall olhou para a frente, e depois para trás, e então concluiu:

— Que vai ser uma reunião e tanto, isso vai.