Era apenas quarta-feira, e o jornal já estava em pleno
movimento, aprontando a edição de sexta-feira. Marshall deteve-se diante da
escrivaninha de Carmem, a caminho do café. Ela lhe entregou matéria nova e disse:
—
É parte do artigo de Tom. Marshall assentiu com a cabeça.
—
Sim, o negócio do departamento de bombeiros...
—
Separei-o em três títulos: pessoal, histórico e objetivos, e achei que podíamos
publicá-lo em três segmentos. Tom já deixou espaço nas duas próximas colagens e
acha que pode arrumar alguma coisa na terceira.
Marshall gostou.
—
É, toque em frente, gostei. Que bom você entender a letra do Tom.
Carmem já havia revisado a maior parte do material de sexta-feira e
estava quase terminando de preparar a cópia para George, o tipógrafo. Ela havia
repassado os livros e acertado todas as contas. Planejava ajudar Tom com a
colagem no dia seguinte. Os negativos para o layout do Clube dos Esportistas
estavam prontos.
Marshall meneou a cabeça em feliz espanto.
—
Bem-vinda a bordo. Carmem sorriu.
—
Obrigada, senhor.
Marshall dirigiu-se ao café e serviu duas xícaras.
Foi então que percebeu: Carmem havia encontrado o fio dessa máquina boba!
Ele carregou as duas xícaras de volta ao escritório e, ao passar por sua mesa,
deu à moça um sorriso de aprovação. A localização da mesa havia sido o seu
único pedido no emprego. Perguntara se podia ser removida para um local ao lado
da porta do escritório de Marshall, e Marshall acedeu de bom grado. Agora, só
precisava voltar-se e dar um berro e ela entrava imediatamente em ação para
fazer o que ele pedira.
Marshall entrou no escritório, colocou uma xícara sobre a escrivaninha, e
ofereceu a outra ao homem de cabelo comprido, levemente atordoado, sentado no
canto. Berenice estava sentada numa cadeira que trouxera juntamente com sua
própria xícara de café.
—
Bem, onde estávamos? — perguntou Marshall, sentando-se à escrivaninha.
Kevin Weed esfregou o rosto, tomou um gole de café, e tentou apanhar o fio
dos pensamentos de novo, olhando no chão em seu redor como se os tivesse
deixado cair ali em algum lugar.
Marshall instigou:
—
Muito bem, deixe-me pelo menos ter certeza de que entendi o que disse: Você
costumava ser... conhecido de Susan, e ela foi a companheira de quarto de Pat
Krueger, irmã de Berenice. Estou certo até aqui?
Weed assentiu com a cabeça.
—
É, sim, está certo.
—
E então o que Susan estava fazendo no festival?
—
Sei lá. Como já disse, ela apareceu atrás de mim e disse oi, e eu nem a estava
procurando. Não podia acreditar que era ela, entende?
—
Mas ela pegou o número do seu telefone e depois ligou para você ontem à
noite...
—
É, toda em órbita, nervosa. Foi uma loucura. Ela não dizia coisa com coisa.
Marshall olhou para Weed e Berenice e perguntou à moça:
—
E essa é a mesma mulher com cara de fantasma que você fotografou aquela noite?
Berenice estava convicta.
—
As descrições que Kevin me deu se encaixam perfeitamente com a mulher que vi, e
também a do homem mais velho que estava com ela.
—
Sim, Kaseph —. Kevin pronunciou o nome como se tivesse gosto ruim.
—
Muito bem — e Marshall fez uma lista mental. — Então vamos falar desse Kaseph primeiro, depois falaremos de Susan, e depois falaremos
de Pat. Berenice tinha o bloco de anotações na mão.
—
Faz idéia de qual seja o nome completo de Kaseph? Weed forçou o cérebro.
—
Alex... Alan... Alexander... algo assim.
—
Mas começa com A.
—
Certo. Marshall perguntou:
—
O que ele é? Weed respondeu:
—
O novo namorado de Susan, foi por causa dele que ela me chutou.
—
Mas, e o que ele faz? Onde trabalha? Weed abanou a cabeça.
—
Não sei. Mas ele tem grana. Vive fazendo rolos. A primeira vez que ouvi falar
dele, ele estava arrodeando Ashton e a faculdade, e falando de comprar
propriedades e coisas desse tipo. Cara, o sujeito tinha grana e queria que todo
o mundo ficasse sabendo disso.
Então ele se lembrou:
—
Oh, Susan disse que ele está tentando tomar a cidade...
—
Que cidade? Esta?
—
Acho que sim. Berenice perguntou:
—
E de onde ele é?
—
Do Leste, talvez de Nova York. Acho que é o tipo de cara de cidade grande.
Marshall disse a Berenice:
—
Faça uma nota para eu chamar Al Lemley no Times. Ele pode conseguir descobrir
esse sujeito se ele estiver em Nova York —. Berenice tomou nota. Marshall
perguntou a Weed:
—
O que mais você sabe a respeito dele?
—
Ele é esquisito, cara. Está metido com negócios esquisitos. Marshall estava
ficando impaciente.
—
Vamos, faça um pouco mais de força. Weed mexeu e remexeu na cadeira.
—
Bem, sabe, ele era como um guru, ou um feiticeiro, ou algum tipo de bruxo em
órbita, e ele envolveu Susan em todo esse negócio.
Berenice instigou:
—
Você está falando de misticismo oriental?
—
Sim.
—
Religiões pagãs, meditação?
—
Sim, sim, todo esse tipo de coisa. Ele estava metido em tudo isso, ele e aquela professora da faculdade, como é mesmo o nome dela...
Marshall estava enjoado do nome.
—
Langstrat.
O rosto de Weed animou-se, relembrando.
—
Sim, essa mesmo.
—
Kaseph e Langstrat eram associados? Eram amigos?
—
Sim, claro. Eles davam juntos umas aulas à noite, eu acho, as que Susan
freqüentava. Kaseph era um figurão visitante ou algo assim. Todo mundo estava
impressionado com ele. Ele me fazia arrepiar os cabelos.
—
Certo, então Susan estava freqüentando essas aulas...
—
E ela ficou louca, e estou dizendo louca. Cara, ela não podia ter ficado mais
em órbita com mescalina. Eu nem podia mais falar com ela. Ela estava sempre
perdida no espaço.
Weed continuou a falar, pondo-se em movimento um pouco
por conta própria.
—
Foi isso que realmente começou a me chatear, como ela e o resto daquela turma
começou a ter segredos e falar em códigos e não me dizer do que estavam
falando. Susan me dizia apenas que eu não era esclarecido e não compreenderia.
Cara, ela simplesmente deu tudo o que tinha àquele tal Kaseph e ele a tomou, e
estou dizendo que realmente a tomou. Ele é o dono dela agora. Ela se foi. Já
era.
—
E a Langstrat estava metida em tudo isso?
—
Oh, sim, mas Kaseph era o verdadeiro chefão. Ele era o guru, sabe. Langstrat
era o seu cachorrinho de estimação.
Berenice disse:
—
E agora Susan pega o número do seu telefone e liga para você depois de todo
esse tempo.
—
Ela estava apavorada — disse Weed. — Está em apuros. Ela me disse que entrasse
em contato com vocês e contasse o que eu sabia, e disse que tinha informação a
respeito de Pat.
Berenice ansiava por saber.
—
Ela disse que tipo de informação?
—
Não, nada. Mas ela quer entrar em contato com você.
—
Bem, por que ela não me liga?
Essa pergunta ajudou Weed a lembrar-se de algo.
—
Oh, sim, ela acha que o seu telefone pode estar grampeado. Marshall e Berenice
ficaram em silêncio por um momento. Esse era um comentário que não sabiam se
deveriam levar a sério. Weed acrescentou:
—
Acho que ela me ligou para eu ser um intermediário, passar a informação a
vocês.
Marshall arriscou:
—
Como se você fosse a única pessoa em quem ela ainda pode confiar?
Weed apenas deu de ombros. Berenice perguntou:
—
Bem, e o que você sabe a respeito de Pat? Susan contou-lhe alguma coisa quando
vocês namoravam?
Uma das empreitadas mais dolorosas para Weed era tentar
lembrar-se das coisas.
—
Ah... ela e Pat eram boas amigas, por uns tempos, pelo menos. Mas, entende,
Susan não quis mais saber da gente quando começou a correr atrás da turma do
Kaseph. Ela meio que me afastou, e também à Pat. Elas não se deram muito bem
depois disso, e Susan ficava a dizer como Pat era... ah... parecida comigo,
tentando atrapalhar, não esclarecida, arrastando os pés.
Marshall pensou na pergunta e não esperou que Berenice a
fizesse.
—
Então você diria que essa turma do Kaseph pode ter considerado Pat como
inimiga?
—
Cara... — Weed lembrou-se de outras coisas. — Ela realmente se arriscou, isto
é, atrapalhou. Ela e Susan tiveram uma briga feia certa fez a respeito das
coisas com que Susan estava metida. Pat não confiava em Kaseph e vivia dizendo
a Susan que ela estava se submetendo a uma lavagem cerebral.
Os olhos de Weed brilharam.
—
Sim, falei com Pat uma vez. Estávamos num jogo, e falamos a respeito daquilo em
que Susan estava-se metendo e de como Kaseph a estava controlando, e Pat estava
muito nervosa com a história, da mesma maneira que eu. Acho que Pat e Susan
realmente tiveram umas brigas relacionadas com isso até que Susan se mudou do
dormitório e fugiu com Kaseph. Ela não apareceu mais nas aulas.
—
Então Pat arrumou inimigos, isto é, inimigos de verdade? Weed continuou a
desenterrar coisas que haviam estado enterradas debaixo dos anos e do álcool.
—
Ah, sim, talvez tenha arrumado. Foi depois que Susan fugiu com esse Kaseph. Pat
contou-me que ela ia fazer uma devassa em tudo aquilo de uma vez por todas, e
acho que ela pode ter ido ver a Langstrat algumas vezes. Pouco depois,
encontrei-a de novo. Estava num refeitório do campus, e estava com cara de quem
não havia dormido por muitos dias, e perguntei-lhe como ia, e ela mal falou
comigo. Perguntei-lhe como a investigação estava indo, sabe, do Kaseph e da
Langstrat e todo esse negócio, e ela disse que tinha parado de mexer com
aquilo, que realmente não era grande coisa. Achei aquilo um tanto esquisito, já
que ela estava tão amolada com a questão antes. Perguntei-lhe: "Ei, eles
estão atrás de você agora?" e ela não quis tocar no assunto, disse que eu
não compreenderia. Depois disse algo acerca de algum instrutor, um sujeito que
a estava ajudando e que ela estava bem, e acabei
percebendo que ela não queria que eu metesse o nariz na vida dela, por isso mais ou menos
deixei-a lá.
—
O comportamento dela lhe pareceu estranho? — perguntou Berenice?
—
Sim, muito. Se ela não tivesse ido tão contra toda a turma do Kaseph e da
Langstrat, eu teria pensado que era uma deles; aquele mesmo aspecto abobalhado,
perdido no espaço havia tomado conta dela.
—
Quando? Quando foi exatamente que você a viu pela última vez?
Weed sabia mas detestava dizer.
—
Um pouco antes de ela ser encontrada morta.
—
Ela parecia atemorizada? Deu qualquer indicação de algum inimigo, qualquer
coisa assim?
Weed fez uma careta, tentando recordar-se.
—
Ela não quis falar comigo. Mas eu a vi mais uma vez depois disso, e tentei
perguntar-lhe acerca de Susan, e ela agiu como se eu fosse um assaltante ou
coisa parecida... ela berrou: "Deixe-me em paz, deixe-me em paz!" e
tentou se afastar e então viu que era eu, e olhou em volta como se alguém a
estivesse seguindo...
—
Quem? Ela disse quem? Weed fitou o teto.
—
Oh... qual é o nome daquele cara?
Berenice inclinou-se para a frente, presa às palavras do homem.
— Havia
alguém?
—
Thomas, algum sujeito chamado Thomas.
—
Thomas! Alguma vez ela mencionou o sobrenome dele?
—
Não me lembro de nenhum sobrenome. Nunca encontrei o sujeito, nunca o vi, mas
certamente ele deve ter sido o dono dela. Ela agia como se ele a estivesse
seguindo por todo o canto, falando com ela, talvez ameaçando, não sei. Ela
parecia ter muito medo dele.
—
Thomas — sussurrou Berenice. Ela disse a Weed:
—
Há alguma coisa mais a respeito desse Thomas? Qualquer coisa que seja?
—
Nunca vi o sujeito... ela não disse quem ele era ou onde ela iria encontrá-lo.
Mas a coisa toda era meio estranha. Num minuto ela estava falando como se ele
fosse a melhor coisa que lhe havia acontecido, e então no próximo minuto se
escondia e dizia que ele a estava seguindo.
Berenice ergueu-se e dirigiu-se à porta.
—
Acho que temos uma lista da faculdade em algum canto —. Ela pôs-se a procurar
nas escrivaninhas e estantes do escritório da frente.
Weed ficou em silêncio. Tinha o aspecto cansado. Marshall assegurou-lhe:
—
Você está-se saindo bem, Kevin. Ei, já faz algum tempo.
—
Ah... não sei se isto é importante...
—
Considere tudo importante.
—
Bem, esse negócio de Pat ter um novo instrutor... acho que alguns da turma do
Kaseph, talvez fosse Susan, eles tinham instrutores.
—
Mas entendi que Pat não queria ter nada com aquele grupo.
—
Sim, é, é mesmo. Marshall mudou de rumo.
— Então,
onde você se encaixava em tudo o que estava acontecendo, além de seu
relacionamento com Susan?
—
Ei, em parte alguma! Eu não quis saber de nada daquilo, cara.
—
Você estudava na faculdade?
—
Sim, fazendo contabilidade. Cara, quando tudo isso começou a deslanchar e
depois Pat se matou, dei o fora depressa. Eu não queria ser o próximo, entende?
— Ele fitou o chão. — Minha vida nada mais tem sido do que um inferno desde
então.
—
Você está trabalhando?
—
Sim, na madeireira dos Irmãos Gorst, um pouco acima de Baker —. Ele meneou a
cabeça. — Não achava que fosse ver Susan novamente.
Marshall voltou-se para a mesa e procurou um papel.
—
Bem, temos de nos manter em contato. Dê-me o número do seu telefone e endereço,
do serviço e particular.
Weed deu a informação.
—
E se eu não estiver aí, provavelmente pode me encontrar no Bar Sempre-Verde em
Baker.
—
Está bem, ouça, se tiver alguma outra notícia de Susan, avise-nos, de dia ou de
noite —. Ele acrescentou o número do telefone de casa no cartão e o entregou a Weed.
Berenice voltou com a lista.
—
Marshall, há um telefonema para você. Acho que é urgente — disse ela. Em
seguida voltou-se para Weed:
—
Kevin, vamos para a outra sala e examinemos esta relação. Talvez encontremos o
nome completo daquele sujeito.
Weed saiu com Berenice enquanto Marshall apanhava o
telefone.
—
Hogan — disse ele.
—
Hogan, aqui é Ted Harmel. Marshall tateou à procura de um lápis.
—
Oi, Ted. Obrigado por ligar.
—
Então você falou com Eldon...
—
E Eldon falou com você? Harmel suspirou e disse:
—
Você está em apuros, Hogan. Darei uma entrevista. Tem um lápis à
mão?
—
Pronto. Pode falar.
Berenice tinha acabado de se despedir de Weed quando
Marshall apareceu na porta do escritório com um pedaço de papel na mão.
—
Alguma coisa? — perguntou ele.
—
Nada de nada. Não há nenhum Thomas, nome ou sobrenome.
—
Ainda assim é uma pista.
—
Quem foi que telefonou? Marshall apresentou o pedaço de papel.
—
Graças a Deus por pequenos favores. Foi Ted Harmel —. Berenice ficou bem mais
animada quando Marshall explicou:
—
Ele quer-me ver amanhã, e aqui estão as informações de como chegar lá. Deve ser
um fim-de-mundo. O cara ainda está todo paranóico; estou surpreso de que ele
não me tenha feito ir disfarçado.
—
Ele não disse nada a respeito de tudo isto?
—
Não, não pelo telefone. Tem de ser apenas nós dois, em particular.
Marshall inclinou-se de leve e disse:
—
Ele é outro que acha que o nosso telefone pode estar grampeado.
—
E como podemos verificar se está ou não?
—
Tome isso como uma de suas tarefas. E aqui está o restante delas —. Berenice
pegou o bloco de anotações de sobre a escrivaninha e fez a sua própria lista
enquanto Marshall ia falando. — Verifique a lista telefônica de Nova York...
—
Já verifiquei. Nenhum A. Kaseph consta dela.
—
Risque essa. Próxima: Dê uma olhada nas agências imobiliárias. Se Weed estiver
certo a respeito de Kaseph procurar propriedades por aqui, algumas dessas
pessoas poderiam saber alguma coisa. E eu procuraria na lista de propriedades
comerciais também.
—
Hum-hum.
—
E enquanto estiver fazendo isso, descubra o que puder sobre seja lá quem for o
proprietário da mercearia do Joe.
—
Não é o Joe?
—
Não. A mercearia era de Joe e Angelina Carlucci. Quero saber aonde eles foram
parar e quem é o novo dono da mercearia. Veja se consegue algumas boas
respostas.
—
E você ia entrar em contato com o seu amigo do Times.
—
Sim, Lemley —. Marshall acrescentou uma nota ao seu pedaço de papel.
—
Só isso?
—
Por enquanto. Enquanto isso, voltemos a cuidar do jornal.
O tempo todo, durante a reunião com Weed e a conversa
que se seguiu, Carmem estava sentada à sua mesa, muito ocupada e fazendo de conta que não tinha ouvido nem uma palavra.
Marshall ligou para Lemley, seu antigo confrade no Times
de Nova York. Lemley recebeu a informação que Marshall possuía acerca desse estranho personagem
Kaseph, dizendo que encetaria a busca imediatamente. Marshall desligou o
telefone com uma mão e agarrou o paletó com a outra; sua próxima parada era o
encontro daquela tarde com o recluso Ted Harmel.
Berenice saiu para as tarefas designadas. Estacionou o
carro vermelho no estacionamento do que fora a mercearia do Joe, e que agora
se chamava Ashton Mercantil, e entrou no estabelecimento. Cerca de meia hora
mais tarde, ela voltou ao carro e foi embora. Tinha sido uma viagem perdida:
ninguém sabia
nada, apenas trabalhavam lá, o gerente não estava, e não tinham a mínima idéia
de quando ele voltaria. Alguns jamais tinham ouvido falar de Joe Carlucci,
alguns tinham mas não sabiam aonde ele tinha ido parar. O auxiliar do gerente
finalmente pediu-lhe que parasse de amolar os empregados na hora de trabalho.
Era isso o que conseguira ao procurar boas respostas.
Agora, toca a procurar as imobiliárias.
A Imobiliária Johnson-Smythe ocupava uma casa antiga reformada como
escritório, localizada na orla do distrito comercial; a casa ainda tinha um
jardim muito gracioso na frente, com uma espécie de sequóia alta plantada no
meio e uma caixa de correspondência original, imitando uma cabana de toras, na
frente. Dentro, era cálida e aconchegante, e silenciosa. Duas escrivaninhas
ocupavam o que antigamente era sala de estar; as duas estavam desertas no
momento. Nas paredes encontravam-se quadros de avisos com fotos de casa após
casa, com cartões debaixo de cada foto descrevendo o prédio, a propriedade, a
vista, proximidade de lojas e assim por diante, e por último, mas não menos
importante, o preço. Puxa, o que as pessoas estavam pagando esses dias por uma
casa!
A uma terceira escrivaninha no que tinha sido a sala de
jantar, uma jovem pôs-se de pé e sorriu para Berenice.
—
Olá, em que posso servi-la?
Berenice sorriu também, apresentou-se, e perguntou:
—
Preciso fazer uma pergunta que pode parecer um tanto estranha, mas aqui vai.
Está pronta?
—
Pronta.
—
Vocês trataram de algum negócio com alguém pelo nome de A. Kaseph no ano
passado?
—
Como se escreve esse nome?
Berenice soletrou-o para ela, depois explicou.
—
Sabe, estou tentando entrar em contato com ele. É uma questão pessoal. Gostaria
de saber se você teria um número telefônico ou endereço, ou qualquer coisa.
A moça olhou o nome que havia acabado de escrever num pedaço de
papel e disse:
—
Bem, sou nova aqui, por isso não sei, mas deixe-me perguntar à Rosemary.
—
Enquanto isso, importa-se se eu der uma olhada no seu arquivo de microfilme?
—
Pode olhar. Você sabe como funciona?
—
Sim.
A moça dirigiu-se aos fundos onde Rosemary, aparentemente a
chefe, tinha o escritório. Berenice podia ouvir Rosemary falando no telefone.
Obter resposta dela poderia demorar um pouco.
Berenice foi ao monitor de microfilmes. Por onde começar? Ela olhou um mapa de
Ashton e vizinhanças na parede e encontrou a localização da mercearia do Joe.
As centenas de pequenas placas de celulóide estavam arranjadas por Seção,
Cidade, Divisões, e os números de ruas. Berenice teve de olhar para diante e
para trás ao tentar obter todos os números do mapa. Finalmente achou que
poderia ter encontrado o microfilme certo para colocar no monitor.
—
Com licença — veio uma voz. Era Rosemary, marchando pelo corredor em sua
direção com uma expressão sombria no rosto. — Srta. Krueger, sinto muito, mas
os microfilmes são para uso exclusivo de nosso pessoal. Há alguma coisa que a
senhorita gostaria que eu procurasse...
Berenice manteve-se calma e tentou fazer com que as
coisas continuassem a fluir.
—
Claro, desculpe. Eu estava tentando descobrir quem é o novo proprietário da
mercearia do Joe.
—
Eu não saberia dizer.
—
Bem, achei que poderia estar em algum lugar aqui na máquina.
—
Não, acho que não. Faz algum tempo desde que as fichas foram atualizadas.
—
Bem, poderíamos olhar mesmo assim? Rosemary ignorou totalmente a pergunta.
—
Alguma outra coisa que a senhorita deseja saber? Berenice manteve-se firme e
inabalável.
—
Ora, a minha pergunta original ainda não foi respondida. Vocês fizeram algum negócio com alguém chamado Kaseph no ano passado?
—
Não, nunca ouvi falar nesse nome.
—
Bem, talvez outra pessoa da sua equipe...
—
Eles também nunca ouviram falar —. Berenice estava prestes a questionar essa
resposta, mas Rosemary interrompeu com:
—
Eu saberia. Conheço todos os clientes deles. Berenice pensou em mais uma coisa.
—
Vocês não teriam um... um fichário de referências cruzadas, teriam...
—
Não, não temos — respondeu Rosemary muito abrupta. — Agora, mais alguma coisa?
Berenice estava cansada de ser educada.
—
Bem, Rosemary, mesmo que tivesse, estou certa de que você não poderia ou
estaria disposta a fornecê-lo. Estou indo agora, pode respirar aliviada.
Ela saiu às pressas, sentindo que lhe haviam mentido muito.