quinta-feira, 6 de maio de 2021

Este mundo tenebroso - volume 01 - Capítulo 19


 O escritório do Clarim estava enfim recuperando a boa e saudável eficiência que Marshall gostava de ver, e a nova moça, Carmem, era grandemente responsável por essa me­lhora. Em menos de uma semana ela havia mais do que preenchido a vaga de Edie, restabelecendo uma rígida rotina no escritório.

Era apenas quarta-feira, e o jornal já estava em pleno movimento, aprontando a edição de sexta-feira. Marshall deteve-se diante da escrivaninha de Carmem, a caminho do café. Ela lhe entregou matéria nova e disse:

— É parte do artigo de Tom. Marshall assentiu com a cabeça.

— Sim, o negócio do departamento de bombeiros...

— Separei-o em três títulos: pessoal, histórico e objetivos, e achei que podíamos publicá-lo em três segmentos. Tom já deixou espaço nas duas próximas colagens e acha que pode arrumar alguma coisa na terceira.

Marshall gostou.

— É, toque em frente, gostei. Que bom você entender a letra do Tom.

Carmem já havia revisado a maior parte do material de sexta-feira e estava quase terminando de preparar a cópia para George, o tipógrafo. Ela havia repassado os livros e acertado todas as contas. Pla­nejava ajudar Tom com a colagem no dia seguinte. Os negativos para o layout do Clube dos Esportistas estavam prontos.

Marshall meneou a cabeça em feliz espanto.

— Bem-vinda a bordo. Carmem sorriu.

— Obrigada, senhor.

Marshall dirigiu-se ao café e serviu duas xícaras. Foi então que percebeu: Carmem havia encontrado o fio dessa máquina boba!

Ele carregou as duas xícaras de volta ao escritório e, ao passar por sua mesa, deu à moça um sorriso de aprovação. A localização da mesa havia sido o seu único pedido no emprego. Perguntara se podia ser removida para um local ao lado da porta do escritório de Marshall, e Marshall acedeu de bom grado. Agora, só precisava voltar-se e dar um berro e ela entrava imediatamente em ação para fazer o que ele pedira.

Marshall entrou no escritório, colocou uma xícara sobre a escri­vaninha, e ofereceu a outra ao homem de cabelo comprido, levemente atordoado, sentado no canto. Berenice estava sentada numa cadeira que trouxera juntamente com sua própria xícara de café.

— Bem, onde estávamos? — perguntou Marshall, sentando-se à escrivaninha.

Kevin Weed esfregou o rosto, tomou um gole de café, e tentou apanhar o fio dos pensamentos de novo, olhando no chão em seu redor como se os tivesse deixado cair ali em algum lugar.

Marshall instigou:

— Muito bem, deixe-me pelo menos ter certeza de que entendi o que disse: Você costumava ser... conhecido de Susan, e ela foi a companheira de quarto de Pat Krueger, irmã de Berenice. Estou certo até aqui?

Weed assentiu com a cabeça.

— É, sim, está certo.

— E então o que Susan estava fazendo no festival?

— Sei lá. Como já disse, ela apareceu atrás de mim e disse oi, e eu nem a estava procurando. Não podia acreditar que era ela, en­tende?

— Mas ela pegou o número do seu telefone e depois ligou para você ontem à noite...

— É, toda em órbita, nervosa. Foi uma loucura. Ela não dizia coisa com coisa.

Marshall olhou para Weed e Berenice e perguntou à moça:

— E essa é a mesma mulher com cara de fantasma que você fo­tografou aquela noite?

Berenice estava convicta.

— As descrições que Kevin me deu se encaixam perfeitamente com a mulher que vi, e também a do homem mais velho que estava com ela.

— Sim, Kaseph —. Kevin pronunciou o nome como se tivesse gosto ruim.

— Muito bem — e Marshall fez uma lista mental. — Então vamos falar desse Kaseph primeiro, depois falaremos de Susan, e depois falaremos de Pat. Berenice tinha o bloco de anotações na mão.

— Faz idéia de qual seja o nome completo de Kaseph? Weed forçou o cérebro.

— Alex... Alan... Alexander... algo assim.

— Mas começa com A.

— Certo. Marshall perguntou:

— O que ele é? Weed respondeu:

— O novo namorado de Susan, foi por causa dele que ela me chutou.

— Mas, e o que ele faz? Onde trabalha? Weed abanou a cabeça.

— Não sei. Mas ele tem grana. Vive fazendo rolos. A primeira vez que ouvi falar dele, ele estava arrodeando Ashton e a faculdade, e falando de comprar propriedades e coisas desse tipo. Cara, o sujeito tinha grana e queria que todo o mundo ficasse sabendo disso.

Então ele se lembrou:

— Oh, Susan disse que ele está tentando tomar a cidade...

— Que cidade? Esta?

— Acho que sim. Berenice perguntou:

— E de onde ele é?

— Do Leste, talvez de Nova York. Acho que é o tipo de cara de cidade grande.

Marshall disse a Berenice:

— Faça uma nota para eu chamar Al Lemley no Times. Ele pode conseguir descobrir esse sujeito se ele estiver em Nova York —. Berenice tomou nota. Marshall perguntou a Weed:

— O que mais você sabe a respeito dele?

— Ele é esquisito, cara. Está metido com negócios esquisitos. Marshall estava ficando impaciente.

— Vamos, faça um pouco mais de força. Weed mexeu e remexeu na cadeira.

— Bem, sabe, ele era como um guru, ou um feiticeiro, ou algum tipo de bruxo em órbita, e ele envolveu Susan em todo esse negócio.

Berenice instigou:

— Você está falando de misticismo oriental?

— Sim.

— Religiões pagãs, meditação?

— Sim, sim, todo esse tipo de coisa. Ele estava metido em tudo isso, ele e aquela professora da faculdade, como é mesmo o nome dela... Marshall estava enjoado do nome.

— Langstrat.

O rosto de Weed animou-se, relembrando.

— Sim, essa mesmo.

— Kaseph e Langstrat eram associados? Eram amigos?

— Sim, claro. Eles davam juntos umas aulas à noite, eu acho, as que Susan freqüentava. Kaseph era um figurão visitante ou algo as­sim. Todo mundo estava impressionado com ele. Ele me fazia ar­repiar os cabelos.

— Certo, então Susan estava freqüentando essas aulas...

— E ela ficou louca, e estou dizendo louca. Cara, ela não podia ter ficado mais em órbita com mescalina. Eu nem podia mais falar com ela. Ela estava sempre perdida no espaço.

Weed continuou a falar, pondo-se em movimento um pouco por conta própria.

— Foi isso que realmente começou a me chatear, como ela e o resto daquela turma começou a ter segredos e falar em códigos e não me dizer do que estavam falando. Susan me dizia apenas que eu não era esclarecido e não compreenderia. Cara, ela simplesmente deu tudo o que tinha àquele tal Kaseph e ele a tomou, e estou dizendo que realmente a tomou. Ele é o dono dela agora. Ela se foi. Já era.

— E a Langstrat estava metida em tudo isso?

— Oh, sim, mas Kaseph era o verdadeiro chefão. Ele era o guru, sabe. Langstrat era o seu cachorrinho de estimação.

Berenice disse:

— E agora Susan pega o número do seu telefone e liga para você depois de todo esse tempo.

— Ela estava apavorada — disse Weed. — Está em apuros. Ela me disse que entrasse em contato com vocês e contasse o que eu sabia, e disse que tinha informação a respeito de Pat.

Berenice ansiava por saber.

— Ela disse que tipo de informação?

— Não, nada. Mas ela quer entrar em contato com você.

— Bem, por que ela não me liga?

Essa pergunta ajudou Weed a lembrar-se de algo.

— Oh, sim, ela acha que o seu telefone pode estar grampeado. Marshall e Berenice ficaram em silêncio por um momento. Esse era um comentário que não sabiam se deveriam levar a sério. Weed acrescentou:

— Acho que ela me ligou para eu ser um intermediário, passar a informação a vocês.

Marshall arriscou:

— Como se você fosse a única pessoa em quem ela ainda pode confiar?

Weed apenas deu de ombros. Berenice perguntou:

— Bem, e o que você sabe a respeito de Pat? Susan contou-lhe alguma coisa quando vocês namoravam?

Uma das empreitadas mais dolorosas para Weed era tentar lembrar-se das coisas.

— Ah... ela e Pat eram boas amigas, por uns tempos, pelo menos. Mas, entende, Susan não quis mais saber da gente quando começou a correr atrás da turma do Kaseph. Ela meio que me afastou, e também à Pat. Elas não se deram muito bem depois disso, e Susan ficava a dizer como Pat era... ah... parecida comigo, tentando atrapalhar, não esclarecida, arrastando os pés.

Marshall pensou na pergunta e não esperou que Berenice a fizesse.

— Então você diria que essa turma do Kaseph pode ter considerado Pat como inimiga?

— Cara... — Weed lembrou-se de outras coisas. — Ela realmente se arriscou, isto é, atrapalhou. Ela e Susan tiveram uma briga feia certa fez a respeito das coisas com que Susan estava metida. Pat não confiava em Kaseph e vivia dizendo a Susan que ela estava se sub­metendo a uma lavagem cerebral.

Os olhos de Weed brilharam.

— Sim, falei com Pat uma vez. Estávamos num jogo, e falamos a respeito daquilo em que Susan estava-se metendo e de como Kaseph a estava controlando, e Pat estava muito nervosa com a história, da mesma maneira que eu. Acho que Pat e Susan realmente tiveram umas brigas relacionadas com isso até que Susan se mudou do dor­mitório e fugiu com Kaseph. Ela não apareceu mais nas aulas.

— Então Pat arrumou inimigos, isto é, inimigos de verdade? Weed continuou a desenterrar coisas que haviam estado enterradas debaixo dos anos e do álcool.

— Ah, sim, talvez tenha arrumado. Foi depois que Susan fugiu com esse Kaseph. Pat contou-me que ela ia fazer uma devassa em tudo aquilo de uma vez por todas, e acho que ela pode ter ido ver a Langstrat algumas vezes. Pouco depois, encontrei-a de novo. Estava num refeitório do campus, e estava com cara de quem não havia dormido por muitos dias, e perguntei-lhe como ia, e ela mal falou comigo. Perguntei-lhe como a investigação estava indo, sabe, do Ka­seph e da Langstrat e todo esse negócio, e ela disse que tinha parado de mexer com aquilo, que realmente não era grande coisa. Achei aquilo um tanto esquisito, já que ela estava tão amolada com a questão antes. Perguntei-lhe: "Ei, eles estão atrás de você agora?" e ela não quis tocar no assunto, disse que eu não compreenderia. Depois disse algo acerca de algum instrutor, um sujeito que a estava ajudando e que ela estava bem, e acabei percebendo que ela não queria que eu metesse o nariz na vida dela, por isso mais ou menos deixei-a lá.

— O comportamento dela lhe pareceu estranho? — perguntou Be­renice?

— Sim, muito. Se ela não tivesse ido tão contra toda a turma do Kaseph e da Langstrat, eu teria pensado que era uma deles; aquele mesmo aspecto abobalhado, perdido no espaço havia tomado conta dela.

— Quando? Quando foi exatamente que você a viu pela última vez?

Weed sabia mas detestava dizer.

— Um pouco antes de ela ser encontrada morta.

— Ela parecia atemorizada? Deu qualquer indicação de algum ini­migo, qualquer coisa assim?

Weed fez uma careta, tentando recordar-se.

— Ela não quis falar comigo. Mas eu a vi mais uma vez depois disso, e tentei perguntar-lhe acerca de Susan, e ela agiu como se eu fosse um assaltante ou coisa parecida... ela berrou: "Deixe-me em paz, deixe-me em paz!" e tentou se afastar e então viu que era eu, e olhou em volta como se alguém a estivesse seguindo...

— Quem? Ela disse quem? Weed fitou o teto.

— Oh... qual é o nome daquele cara?

Berenice inclinou-se para a frente, presa às palavras do homem.

Havia alguém?

— Thomas, algum sujeito chamado Thomas.

— Thomas! Alguma vez ela mencionou o sobrenome dele?

— Não me lembro de nenhum sobrenome. Nunca encontrei o su­jeito, nunca o vi, mas certamente ele deve ter sido o dono dela. Ela agia como se ele a estivesse seguindo por todo o canto, falando com ela, talvez ameaçando, não sei. Ela parecia ter muito medo dele.

— Thomas — sussurrou Berenice. Ela disse a Weed:

— Há alguma coisa mais a respeito desse Thomas? Qualquer coisa que seja?

— Nunca vi o sujeito... ela não disse quem ele era ou onde ela iria encontrá-lo. Mas a coisa toda era meio estranha. Num minuto ela estava falando como se ele fosse a melhor coisa que lhe havia acontecido, e então no próximo minuto se escondia e dizia que ele a estava seguindo.

Berenice ergueu-se e dirigiu-se à porta.

— Acho que temos uma lista da faculdade em algum canto —. Ela pôs-se a procurar nas escrivaninhas e estantes do escritório da frente.

Weed ficou em silêncio. Tinha o aspecto cansado. Marshall assegurou-lhe:

— Você está-se saindo bem, Kevin. Ei, já faz algum tempo.

— Ah... não sei se isto é importante...

— Considere tudo importante.

— Bem, esse negócio de Pat ter um novo instrutor... acho que alguns da turma do Kaseph, talvez fosse Susan, eles tinham instru­tores.

— Mas entendi que Pat não queria ter nada com aquele grupo.

— Sim, é, é mesmo. Marshall mudou de rumo.

— Então, onde você se encaixava em tudo o que estava aconte­cendo, além de seu relacionamento com Susan?

— Ei, em parte alguma! Eu não quis saber de nada daquilo, cara.

— Você estudava na faculdade?

— Sim, fazendo contabilidade. Cara, quando tudo isso começou a deslanchar e depois Pat se matou, dei o fora depressa. Eu não queria ser o próximo, entende? — Ele fitou o chão. — Minha vida nada mais tem sido do que um inferno desde então.

— Você está trabalhando?

— Sim, na madeireira dos Irmãos Gorst, um pouco acima de Baker —. Ele meneou a cabeça. — Não achava que fosse ver Susan nova­mente.

Marshall voltou-se para a mesa e procurou um papel.

— Bem, temos de nos manter em contato. Dê-me o número do seu telefone e endereço, do serviço e particular.

Weed deu a informação.

— E se eu não estiver aí, provavelmente pode me encontrar no Bar Sempre-Verde em Baker.

— Está bem, ouça, se tiver alguma outra notícia de Susan, avise-nos, de dia ou de noite —. Ele acrescentou o número do telefone de casa no cartão e o entregou a Weed.

Berenice voltou com a lista.

— Marshall, há um telefonema para você. Acho que é urgente — disse ela. Em seguida voltou-se para Weed:

— Kevin, vamos para a outra sala e examinemos esta relação. Tal­vez encontremos o nome completo daquele sujeito.

Weed saiu com Berenice enquanto Marshall apanhava o telefone.

— Hogan — disse ele.

— Hogan, aqui é Ted Harmel. Marshall tateou à procura de um lápis.

— Oi, Ted. Obrigado por ligar.

— Então você falou com Eldon...

— E Eldon falou com você? Harmel suspirou e disse:

— Você está em apuros, Hogan. Darei uma entrevista. Tem um lápis à mão?

— Pronto. Pode falar.

Berenice tinha acabado de se despedir de Weed quando Marshall apareceu na porta do escritório com um pedaço de papel na mão.

— Alguma coisa? — perguntou ele.

— Nada de nada. Não há nenhum Thomas, nome ou sobrenome.

— Ainda assim é uma pista.

— Quem foi que telefonou? Marshall apresentou o pedaço de papel.

— Graças a Deus por pequenos favores. Foi Ted Harmel —. Be­renice ficou bem mais animada quando Marshall explicou:

— Ele quer-me ver amanhã, e aqui estão as informações de como chegar lá. Deve ser um fim-de-mundo. O cara ainda está todo para­nóico; estou surpreso de que ele não me tenha feito ir disfarçado.

— Ele não disse nada a respeito de tudo isto?

— Não, não pelo telefone. Tem de ser apenas nós dois, em parti­cular.

Marshall inclinou-se de leve e disse:

— Ele é outro que acha que o nosso telefone pode estar grampeado.

— E como podemos verificar se está ou não?

— Tome isso como uma de suas tarefas. E aqui está o restante delas —. Berenice pegou o bloco de anotações de sobre a escrivaninha e fez a sua própria lista enquanto Marshall ia falando. — Verifique a lista telefônica de Nova York...

— Já verifiquei. Nenhum A. Kaseph consta dela.

— Risque essa. Próxima: Dê uma olhada nas agências imobiliárias. Se Weed estiver certo a respeito de Kaseph procurar propriedades por aqui, algumas dessas pessoas poderiam saber alguma coisa. E eu procuraria na lista de propriedades comerciais também.

— Hum-hum.

— E enquanto estiver fazendo isso, descubra o que puder sobre seja lá quem for o proprietário da mercearia do Joe.

— Não é o Joe?

— Não. A mercearia era de Joe e Angelina Carlucci. Quero saber aonde eles foram parar e quem é o novo dono da mercearia. Veja se consegue algumas boas respostas.

— E você ia entrar em contato com o seu amigo do Times.

— Sim, Lemley —. Marshall acrescentou uma nota ao seu pedaço de papel.

— Só isso?

— Por enquanto. Enquanto isso, voltemos a cuidar do jornal.

O tempo todo, durante a reunião com Weed e a conversa que se seguiu, Carmem estava sentada à sua mesa, muito ocupada e fazendo de conta que não tinha ouvido nem uma palavra.

 A manhã havia sido apertada, com o prazo do próximo número galopando ao encontro deles, mas até o meio-dia a colagem estava pronta para a tipografia e o escritório teve a oportunidade de voltar ao ritmo normal.

Marshall ligou para Lemley, seu antigo confrade no Times de Nova York. Lemley recebeu a informação que Marshall possuía acerca desse estranho personagem Kaseph, dizendo que encetaria a busca imediatamente. Marshall desligou o telefone com uma mão e agarrou o paletó com a outra; sua próxima parada era o encontro daquela tarde com o recluso Ted Harmel.

Berenice saiu para as tarefas designadas. Estacionou o carro ver­melho no estacionamento do que fora a mercearia do Joe, e que agora se chamava Ashton Mercantil, e entrou no estabelecimento. Cerca de meia hora mais tarde, ela voltou ao carro e foi embora. Tinha sido uma viagem perdida: ninguém sabia nada, apenas trabalhavam lá, o gerente não estava, e não tinham a mínima idéia de quando ele voltaria. Alguns jamais tinham ouvido falar de Joe Carlucci, alguns tinham mas não sabiam aonde ele tinha ido parar. O auxiliar do gerente finalmente pediu-lhe que parasse de amolar os empregados na hora de trabalho. Era isso o que conseguira ao procurar boas respostas.

Agora, toca a procurar as imobiliárias.

A Imobiliária Johnson-Smythe ocupava uma casa antiga reformada como escritório, localizada na orla do distrito comercial; a casa ainda tinha um jardim muito gracioso na frente, com uma espécie de sequóia alta plantada no meio e uma caixa de correspondência original, imitando uma cabana de toras, na frente. Dentro, era cálida e acon­chegante, e silenciosa. Duas escrivaninhas ocupavam o que antiga­mente era sala de estar; as duas estavam desertas no momento. Nas paredes encontravam-se quadros de avisos com fotos de casa após casa, com cartões debaixo de cada foto descrevendo o prédio, a pro­priedade, a vista, proximidade de lojas e assim por diante, e por último, mas não menos importante, o preço. Puxa, o que as pessoas estavam pagando esses dias por uma casa!

A uma terceira escrivaninha no que tinha sido a sala de jantar, uma jovem pôs-se de pé e sorriu para Berenice.

— Olá, em que posso servi-la?

Berenice sorriu também, apresentou-se, e perguntou:

— Preciso fazer uma pergunta que pode parecer um tanto estranha, mas aqui vai. Está pronta?

— Pronta.

— Vocês trataram de algum negócio com alguém pelo nome de A. Kaseph no ano passado?

— Como se escreve esse nome?

Berenice soletrou-o para ela, depois explicou.

— Sabe, estou tentando entrar em contato com ele. É uma questão pessoal. Gostaria de saber se você teria um número telefônico ou endereço, ou qualquer coisa.

A moça olhou o nome que havia acabado de escrever num pedaço de papel e disse:

— Bem, sou nova aqui, por isso não sei, mas deixe-me perguntar à Rosemary.

— Enquanto isso, importa-se se eu der uma olhada no seu arquivo de microfilme?

— Pode olhar. Você sabe como funciona?

— Sim.

A moça dirigiu-se aos fundos onde Rosemary, aparentemente a chefe, tinha o escritório. Berenice podia ouvir Rosemary falando no telefone. Obter resposta dela poderia demorar um pouco.

Berenice foi ao monitor de microfilmes. Por onde começar? Ela olhou um mapa de Ashton e vizinhanças na parede e encontrou a localização da mercearia do Joe. As centenas de pequenas placas de celulóide estavam arranjadas por Seção, Cidade, Divisões, e os nú­meros de ruas. Berenice teve de olhar para diante e para trás ao tentar obter todos os números do mapa. Finalmente achou que poderia ter encontrado o microfilme certo para colocar no monitor.

— Com licença — veio uma voz. Era Rosemary, marchando pelo corredor em sua direção com uma expressão sombria no rosto. — Srta. Krueger, sinto muito, mas os microfilmes são para uso exclusivo de nosso pessoal. Há alguma coisa que a senhorita gostaria que eu procurasse...

Berenice manteve-se calma e tentou fazer com que as coisas con­tinuassem a fluir.

— Claro, desculpe. Eu estava tentando descobrir quem é o novo proprietário da mercearia do Joe.

— Eu não saberia dizer.

— Bem, achei que poderia estar em algum lugar aqui na máquina.

— Não, acho que não. Faz algum tempo desde que as fichas foram atualizadas.

— Bem, poderíamos olhar mesmo assim? Rosemary ignorou totalmente a pergunta.

— Alguma outra coisa que a senhorita deseja saber? Berenice manteve-se firme e inabalável.

— Ora, a minha pergunta original ainda não foi respondida. Vocês fizeram algum negócio com alguém chamado Kaseph no ano pas­sado?

— Não, nunca ouvi falar nesse nome.

— Bem, talvez outra pessoa da sua equipe...

— Eles também nunca ouviram falar —. Berenice estava prestes a questionar essa resposta, mas Rosemary interrompeu com:

— Eu saberia. Conheço todos os clientes deles. Berenice pensou em mais uma coisa.

— Vocês não teriam um... um fichário de referências cruzadas, teriam...

— Não, não temos — respondeu Rosemary muito abrupta. — Agora, mais alguma coisa?

Berenice estava cansada de ser educada.

— Bem, Rosemary, mesmo que tivesse, estou certa de que você não poderia ou estaria disposta a fornecê-lo. Estou indo agora, pode respirar aliviada.

Ela saiu às pressas, sentindo que lhe haviam mentido muito.