Na noite de sexta-feira, Hank não conseguia tirar da
cabeça a assembléia extraordinária que se aproximava, o que provavelmente era
bom para ele em vista da moça que estava sentada à sua frente no seu pequenino
escritório, canto da casa. Ele havia pedido a Mary que estivesse por perto e
agisse de forma amorosa e conjugai. Esta jovem senhora, Carmem, foi o único
nome que ela deu, era um caso dos pesados. Pela forma de se vestir e se portar,
ele fez questão que fosse Mary quem atendesse à porta e a fizesse entrar quando
ela chegou. Mas pelo que Hank podia notar, Carmem não estava tentando projetar
uma imagem falsa; parecia genuína, apenas sinceramente exagerada. Quanto aos
motivos pelos quais queria aconselhamento...
—
Acho — começou ela — acho que eu apenas estou muito sozinha, e é porque ouço
vozes...
Imediatamente, ela examinou os rostos dos dois para ver
sua reação.
Mas depois da recente experiência, nada parecia muito irreal para Hank e Mary.
Hank perguntou:
—
Que tipo de vozes? Que tipo de coisas elas dizem?
Ela pensou por um instante, os grandes olhos azuis,
exagerada-mente inocentes, perscrutando o teto.
—
O que está acontecendo comigo é legítimo — disse ela. — Não estou louca.
—
Não duvido da sua palavra — disse Hank. — Mas conte-nos acerca dessas vozes.
Quando elas falam com você?
—
Quando estou a sós, especialmente. Como ontem à noite, eu estava deitada na
cama e... — ela relatou as palavras que a voz lhe dissera, que poderiam ter
sido o texto perfeito de um telefonema obsceno.
Mary não sabia o que dizer; aquilo estava ficando muito forte. A
Hank, a coisa toda soava um tanto familiar, e embora ele se sentisse muito
cauteloso em relação a Carmem e seus motivos, ainda permanecia aberto à
possibilidade de que ela estivesse enfrentando parte das mesmas forças
demoníacas que ele enfrentara.
—
Carmem — perguntou ele — essas vozes já disseram quem são? Ela pensou por um
momento.
—
Acho que uma delas era espanhola ou italiana. Tinha um sotaque, e o nome era
Amano, ou Amanzo, ou algo parecido. Ele sempre fala muito suavemente e sempre
diz que deseja ter relação sexual comigo...
Nesse momento o telefone tocou. Mary levantou-se
depressa para atender.
—
Não se demore — pediu Hank.
Que ela saiu bem depressa, saiu. Hank a estava
acompanhando com o olhar quando sentiu que Carmem lhe tocava a mão.
—
Você não acha que estou louca, acha? — perguntou, com olhar súplice.
—
Ah... — Hank retirou a mão a fim de coçar uma coceira inexistente. — Não,
Carmem, não estou... isto é, não acho. Mas realmente quero saber de onde essas
vozes vêm. Quando foi que você começou a ouvi-las?
—
Quando cheguei a Ashton. Meu marido me abandonou e vim para cá a fim de começar
vida nova, mas... sinto-me tão sozinha.
—
Você as ouviu pela primeira vez quando chegou a Ashton?
—
Acho que é por que estava me sentindo muito solitária. Ainda me sinto
solitária.
—
O que foi que elas disseram no começo? Como se apresentaram?
—
Eu estava sozinha, e solitária, havia acabado de mudar para cá, e pensei ter
ouvido a voz de Jim. Sabe, o meu marido...
—
Continue.
—
Realmente pensei que era ele. Não indaguei como ele podia falar comigo sem
estar presente, mas respondi e ele me disse quanta falta sentia de mim, e como
achava que era melhor a maneira como as coisas estavam, e passou o resto da
noite comigo.
Ela começou a derramar lágrimas.
—
Foi lindo.
Hank não sabia o que pensar do que ela dizia.
—
Incrível — foi tudo o que conseguiu dizer.
De novo ela olhou para ele com aqueles grandes olhos súplices e disse através das
lágrimas:
—
Eu sabia que você acreditaria em mim. Já ouvi falar de você. Dizem que é um
homem compassivo, e muito compreensivo...
Depende de quem você ouve, pensou Hank; mas então a mão dela estava
novamente tocando a sua. Hora de suspender a consulta, pensou Hank.
—
Ah — disse, tentando ser confortador, sincero e imparcial. — Escute, acho que
foi uma hora bem proveitosa...
—
Oh, sim!
—
Você gostaria de voltar na semana que vem?
—
Oh, adoraria! — exclamou ela, como se Hank a tivesse convidado para um
encontro. — Tenho tantas outras coisas para lhe contar!
—
Bem, ótimo, acho que a próxima sexta está bem para mim se você puder.
Oh, ela podia, podia, sim, e Hank levantou-se,
indicando que a sessão havia terminado. Não haviam coberto muito terreno, mas no que dizia
respeito a Hank, céus, fora o bastante.
—
Agora, vamos os dois tirar um tempo para pensar nessas coisas. Depois de uma
semana, elas podem parecer um pouco mais claras.
Podem fazer mais sentido —. Onde, oh, onde estava Mary? Ah, ela voltava à sala.
—
Já está de saída?
—
Foi maravilhoso — suspirou Carmem, mas pelo menos soltou a mão de Hank.
Botar Carmem porta afora foi mais fácil do que Hank havia esperado.
Maravilhosa Mary. Salvara a pátria! Hank fechou a porta e recostou-se contra
ela.
—
Uau! — foi tudo o que conseguiu dizer.
—
Hank — disse Mary, com voz quase inaudível — eu não estou gostando nada disto!
—
Ela... ela é bem quente, isso ela é.
—
O que acha da história dela?
—
Esperarei para ver. Quem telefonou?
—
Espere só até ouvir isto! Era uma mulher do Clarim querendo saber se a
pessoa que havíamos suspendido da comunhão da igreja era Alf Brummel!
De repente Hank pareceu um brinquedo inflável com um vazamento.
—
E então, o que disseram? — perguntou ele sem erguer os olhos.
—
Não é o Brummel, e acho que não foi uma pergunta muito delicada. Conversei com
a esposa do pastor, e pelo tom da voz dela pude perceber que o assunto todo é
muito espinhoso.
—
E, ouvi conversa lá no barbeiro. Alguém estava dizendo que vão votar para
mandar o pastor embora esta noite.
—
Ah, então eles de fato têm problemas.
—
Mas totalmente independentes do nosso, o que me deixa contente. Isso já foi longe
demais.
Marshall examinou de novo a lista de nomes que Berenice
havia conseguido com Albert Darr.
—
Como é que querem que eu trabalhe aqui com esse tipo de coisas não resolvidas
rolando por aí? Bernie, você está começando a dar muito trabalho, sabia?
Ela aceitou as palavras dele como elogio.
—
E você já examinou aquele folheto que traz as matérias facultativas que
Langstrat está dando?
Marshall apanhou-o e pôde apenas menear a cabeça incredulamente.
—
Que raio de negócio é isto? “Introdução ao Deus e à Deusa Consciência e a Arte:
a divindade do homem, bruxa, bruxo, a Roda Sagrada da Medicina, como
funcionam os feitiços e rituais”? Você deve estar brincando!
—
Continue lendo, chefe!
—
“Caminhos para a sua Luz Interna: conheça os seus próprios guias espirituais, descubra a luz interna... harmonize seus níveis de existência mental,
físico, emocional e espiritual através da hipnose e da meditação.”
Marshall leu mais um pouco e a seguir exclamou:
—
O quê? “Como Gozar o Presente Através da Experiência de Vidas Passadas e
Futuras”?
—
Gosto dessa que está perto do fim: “No Princípio Era a Deusa”. Langstrat,
talvez?
—
Por que ninguém ouviu falar disso antes?
— Por algum motivo, nunca foi anunciado no jornal da
escola nem na lista pública das aulas. Foi o próprio Albert Darr quem me deu o folheto e disse
que era um item passado um tanto exclusivamente de um para o outro entre os
alunos interessados.
—
E minha Sandy está assistindo à aula dessa mulher...
—
É, de certa forma também todas essas pessoas da lista. Marshall colocou o
folheto na mesa e apanhou a lista. Meneou a cabeça novamente; era a única
coisa que ele conseguia pensar em fazer.
Berenice acrescentou:
— Acho que não me importo tanto se um bando de tontos querem cair na conversa dessa Langstrat, mas eles são importantes demais! Olhe só para isso: Dois dos
membros do conselho diretor, o dono do terreno da faculdade, o tesoureiro
municipal, o juiz do distrito!
—
E Young! O respeitado, reverenciado, influente Oliver Young, tão envolvido na
comunidade! — Marshall repassou mentalmente as recordações gravadas em alguma
fita da sua memória. — É, o quadro está completo, agora faz sentido, todo
aquele palavrório vago, evasivo que ele me passou no seu gabinete. Young tem
uma religião toda particular. De batista conservador é que ele não tem nada,
isso posso garantir!
—
Religião não me interessa muito. Mas mentiras e trapaças são coisas totalmente
diferentes!
—
Bem, ele negou veementemente conhecer a Langstrat. Perguntei-lhe diretamente,
bem na cara, e ele me disse que não a conhecia.
—
Alguém está mentindo — cantarolou Berenice.
—
Gostaria que tivéssemos mais corroboração.
—
É, apenas acabamos de conhecer o Darr.
—
E Ted Harmel? Você o conhecia bem?
—
Bem o suficiente, suponho. Você sabe por que ele se foi embora?
—
Brummel disse que houve um escândalo, mas em quem se pode acreditar hoje em
dia?
—
Ted negou.
—
Ahá, todo o mundo está dizendo tudo e todo o mundo está negando tudo.
—
Bem, de qualquer forma, ligue para ele. Eu tenho o número. Ele está morando
perto de Windsor. Acho que está tentando ser um eremita.
Marshall correu os olhos pelo material dos anúncios ainda sobre a sua
mesa, esperando seu tempo e atenção.
—
Como é que vou conseguir fazer alguma coisa por aqui?
—
Ei, não é nada importante. Se eu posso dar umas voltas por conta própria, o
mínimo que você pode fazer é ligar para o Ted. Ligue amanhã... sábado, que é
seu dia de folga. De repórter para repórter. De jornalista para jornalista.
Pode cair nas graças dele.
Marshall suspirou.
—
Passe-me o número.
Alf Brummel tinha uma chave da igreja e já estava presente, acendendo
as luzes e aumentando a temperatura do termostato. Ele não se sentia nada bem.
Era melhor que votassem certo desta vez, pensava.
No lado de fora, embora ainda faltasse meia hora para o
início da
reunião, carros começaram a chegar, em número maior do que o que geralmente
comparecia aos domingos. Sam Turner, o principal comparsa de Brummel, chegou
em seu Cadilac, e ajudou Helen, a esposa, a descer do carro. Ele era uma
espécie de fazendeiro, não um grande proprietário, mas agia como se fosse.
Naquela noite, ele estava sombrio e decidido, assim como a esposa. Em outro
carro, chegou John Coleman e a esposa Patrícia, um casal discreto que se
transferira para aquela igrejinha de uma igreja grande em outra parte da
cidade. Eles realmente gostavam de Hank e não se importavam em demonstrar a sua
afeição. Bem sabiam que Alf Brummel não ficaria muito contente com a sua
presença.
Outros foram chegando e depressa se coagulavam em
grupinhos de sentimentos afins, falando em sílabas rápidas e tons baixos e mantendo os olhos
voltados para si mesmos, exceto por uns poucos que espichavam o pescoço para
ver quem tinha comparecido, tentando prever a contagem final.
Diversas sombras escuras de seu poleiro no topo do
telhado da igreja, de suas posições à volta do prédio, ou dos postos para os quais tinham
sido designados no templo, vigiavam tudo com muita cautela.
Lucius, mais nervoso que nunca, andava e flutuava sem
cessar. Baal Rafar, ainda desejoso de manter-se em quase anonimato, havia-lhe
confiado essa tarefa e, pelo menos nessa noite, Lucius estava de volta à antiga glória.
O que mais preocupava Lucius era a presença dos outros espíritos que
ali se encontravam, os inimigos da causa, o exército dos céus. Estavam sendo
mantidos afastados pelas forças de Lucius, sem dúvida, mas havia guerreiros
novos que ele jamais vira antes.
Nos arredores, mas não muito perto, Signa e seus dois guerreiros vigiavam.
De acordo com as ordens de Tal, haviam permitido que os demônios tivessem
acesso ao prédio, mas estavam de olho nas suas atividades e vigilantes quanto à
presença de Rafar. Até então, simples presença deles, assim como a de muitos
outros guerreiros, tinha exercido um efeito tranqüilizador sobre as hostes
demoníacas. Não havia ocorrido nenhum incidente e, no momento, era tudo o que
Tal desejava.
Quando Lucius viu o casal Coleman entrar pela porta da
frente, começou
a agitar-se. No passado, eles nunca se tinham mostrado muito fortes contra as
derrotas e desânimos ordenados por Lucius, e o casamento deles quase se
desfizera. Então, haviam-se colocado ao lado desse Busche de Oração, ouvindo o
que ele dizia e tornando-se cada vez mais fortes. Não demoraria muito e eles, e
outros como eles, constituiriam uma verdadeira ameaça.
Mas a sua chegada não causou tanta agitação em Lucius quanto o enorme e
loiro mensageiro de Deus que os acompanhava. Lucius tinha certeza de nunca ter
visto esse guerreiro antes. Enquanto os Coleman se assentavam, Lucius
precipitou-se para baixo e interpelou o novo intruso.
—
Nunca o vi antes! — disse grosseiramente, e todos os outros espíritos concentraram
a atenção nele e no estranho. — De onde vem?
O estranho, Chimon da Europa, nada disse. Apenas cravou
os olhos nos de Lucius e permaneceu firme.
—
Diga-me o seu nome! — exigiu Lucius. O estranho não disse palavra.
Lucius sorriu matreiramente e sacudiu a cabeça.
—
Você é surdo? É mudo? É tão irracional quanto é silencioso? — Os outros
demônios caíram na risada. Adoravam esse tipo de jogo. — Diga-me, você é bom de
luta?
Silêncio.
Lucius puxou de uma cimitarra que rebrilhou cor de
sangue e
zumbiu metalicamente. Seguindo-lhe o exemplo, os outros
demônios
fizeram o mesmo. O ruído e o retinir de lâminas lustrosas encheram o aposento à
medida que rubras meias-luas de luz refletida dançavam nas paredes. Um círculo
de demônios armados impediram a intervenção dos outros mensageiros de Deus,
enquanto Lucius continuava a provocar o guerreiro desconhecido.
Lucius olhou para esse oponente firme e imóvel com um ódio ardente
que fez seus olhos amarelados saltarem e seu hálito sulfuroso ser violentamente
expelido através de narinas muito dilatadas. Ele brincou com a espada,
fazendo-a descrever pequenos círculos na frente do rosto do estranho, tentando
ver se o estranho fazia o menor movimento.
O estranho apenas o fitava, sem se mexer.
Com um grito intenso, Lucius passou a espada pela
frente do estranho, cortando-lhe a roupa. Vivas e risadas ergueram-se do bando
de demônios.
Lucius posicionou-se para lutar, segurando a espada com as duas mãos, agachado,
as asas abertas.
Diante dele estava uma estátua de túnica retalhada.
—
Lute, seu espírito desanimado! — desafiou Lucius.
O estranho não reagiu, e Lucius cortou-lhe o rosto. Outros vivas da
parte dos demônios.
—
Tiro uma orelha? Ou duas? Corto-lhe a língua, se é que tem uma? — provocava
Lucius.
—
Acho que está na hora de começarmos — disse Alf Brummel do púlpito. Os
presentes cessaram suas conversações cochichadas, e o lugar começou a
aquietar-se.
Lucius olhou para o estranho com uma risadinha de mofa
e indicou com a espada:
—
Vá juntar-se aos outros covardes.
O novo guerreiro afastou-se, e então tomou seu lugar junto
aos outros mensageiros de Deus atrás da barricada demoníaca.
Onze anjos tinham conseguido entrar na igreja sem
encolerizar em demasia os demônios: Triskal e Krioni já haviam entrado com Hank e Mary. Eles
tinham sido freqüentemente vistos na companhia do pastor e da esposa, e por
isso não receberam muita atenção além das expressões e posturas ameaçadoras de
sempre. Guilo estava lá, grande e ameaçador como nunca, mas aparentemente
nenhum demônio tinha o menor interesse em dirigir-lhe qualquer pergunta.
Outro novo guerreiro, um polinésio troncudo, dirigiu-se a
Chimon e tratou do ferimento do seu rosto enquanto Chimon consertava o rasgo da
túnica.
—
Mota, chamado da Polinésia — veio a apresentação.
—
Chimon da Europa. Bem-vindo ao nosso grupo.
—
Está em condições de continuar? — perguntou Mota.
—
Continuarei — respondeu Chimon, tecendo habilidosamente o tecido da túnica com
os dedos. — Onde está Tal?
—
Ainda não chegou.
— Um demônio de febre tentou deter o casal Coleman. Sem dúvida Tal teve de enfrentar um ataque contra Duster.
—
Não sei como ele o repelirá sem tornar-se visível.
— Deixe por conta dele —. Chimon olhou em redor. — Náo vejo o Príncipe
Baal em parte alguma.
—
Pode ser que jamais o vejamos.
—
E possa ele jamais ver Tal.
Brummel, em pé atrás do púlpito passou os olhos pelas quase
cinqüenta pessoas que se haviam reunido e deu início à reunião. Desse local
vantajoso, nem mesmo ele podia deixar de tentar adivinhar a contagem final.
Algumas pessoas iam definitivamente mandar Hank passear, algumas
definitivamente não iam, e então havia aquele grupo frustrador e imprevisível a
respeito do qual ele não podia ter certeza.
—
Desejo agradecer a todos o terem comparecido esta noite — disse ele. — Esta é
uma questão dolorosa que temos de resolver. Era o meu desejo que a noite de
hoje nunca chegasse, mas todos nós queremos que a vontade de Deus seja feita e
almejamos o que for melhor para o seu povo. Assim, vamos iniciar com uma oração
e entregar o restante da noite ao cuidado e direção divinas.
Tendo dito isso, Brummel iniciou uma oração muito pia, implorando
a graça e a misericórdia do Senhor, com palavras que trariam lágrimas ao mais
seco dos olhos.
No canto da frente do templo, Guilo, irritado, desejava
que um anjo pudesse cuspir num ser humano.
Triskal perguntou a Chimon:
—
Está recebendo força? Chimon respondeu:
—
Por quê? Alguém mais vai orar?
Brummel terminou a oração, os presentes murmuraram alguns améns, e então ele
prosseguiu com a apresentação do assunto em pauta.
—
A finalidade desta reunião é discutirmos abertamente os nossos sentimentos com
relação ao Pastor Hank, de colocar um ponto final em todas as calúnias e
disse-que-disses, e encerrá-la com um voto decisivo de confiança. Espero que
todos tenhamos a mente do Senhor ao resolver essas questões. Se houver algo que
alguém deseje dizer ao grupo, eu pediria que limitasse o seu tempo a três
minutos. Avisarei quando o tempo acabar, por isso não se esqueçam.
Brummel olhou para Hank e Mary, e continuou:
—
Acho que é bom dar a palavra primeiro ao pastor. Depois, ele nos deixará a fim de podermos falar à vontade.
Enquanto Hank se levantava, Mary apertou-lhe a mão. Hank dirigiu-se ao
púlpito e, colocando-se atrás dele, segurou as laterais. Durante longos
momentos, não pôde dizer coisa alguma, mas apenas ficou a olhar em cada olho de
cada rosto. Percebeu de repente o quanto verdadeiramente amava essa gente, toda
ela. Podia ver a dureza em alguns rostos, mas não conseguia deixar de enxergar
além dela a dor e a escravidão que subjugavam essas pessoas, iludidas,
desviadas pelo pecado, pela cobiça, pela amargura e pela rebeldia. Em muitos
outros rostos ele lia a dor que estavam sentindo por ele; sabia que alguns
oravam silenciosamente, pedindo a misericórdia e a intervenção de Deus.
Hank, ao começar, deixou que uma breve oração lhe entremeasse os
pensamentos.
—
Sempre considerei um privilégio colocar-me atrás deste sagrado púlpito, a fim
de pregar a Palavra e falar a verdade.
Examinou de novo o rosto dos presentes por apenas um
momento e então
continuou:
—
E mesmo esta noite sinto que não posso me desviar da comissão que Deus me deu e
do propósito pelo qual sempre me coloquei diante de vocês. Não estou aqui com o
propósito de defender a minha pessoa ou o meu ministério. Jesus é o meu
advogado, e deixo o curso de minha vida aos cuidados da sua graça, orientação e
misericórdia. Por isso, esta noite, já que estou mais uma vez atrás deste
púlpito, deixem-me partilhar com vocês aquilo que recebi de Deus.
Hank abriu a Bíblia e leu na segunda epístola de Paulo a Timóteo,
capítulo 4.
“Conjuro-te, perante Deus e Cristo Jesus que há de julgar vivos e mortos,
pela sua manifestação e pelo seu reino; prega a palavra, insta, quer seja
oportuno, quer não, corrige, repreende, exorta com toda a longanimidade e
doutrina. Pois haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina; pelo
contrário, cercar-se-ão de mestres, segundo as suas próprias cobiças, como que
sentindo coceiras em seus ouvidos; e se recusarão a dar ouvidos à verdade,
entregando-se às fábulas. Tu, porém, sê sóbrio em todas as coisas, suporta as
aflições, faze o trabalho de evangelista, cumpre cabalmente o teu ministério.”
Hank fechou a Bíblia, correu o olhar pelo aposento e disse com
firmeza:
—
Que cada um de nós aplique a palavra de Deus onde ela for aplicável. Esta noite
falarei apenas por mim mesmo. Tenho um chamado de Deus; acabei de lê-lo.
Alguns de vocês, eu sei, tiveram realmente a impressão de que Hank Busche está
obcecado com o evangelho, que ele só pensa nisso. Bem, é verdade. Às vezes
chego a perguntar-me por que permaneço numa posição tão difícil como esta, neste esforço penoso... mas para mim o chamado de Deus na minha vida é
uma ordem inescapável e, como disse Paulo: “Ai de mim se não pregar o evangelho.”
Compreendo que às vezes a verdade da Palavra de Deus pode tornar-se em divisão,
irritação, em pedra de tropeço. Mas isso só acontece porque ela permanece
imutável, inflexível, firme. E que melhor razão poderia haver para construirmos
a vida sobre tão imutável alicerce? Violar a Palavra de Deus nada mais é que
destruir a nós mesmos, nossa alegria, nossa paz, nossa felicidade.
—
Desejo ser justo com vocês, e por isso falarei a verdade ao dizer-lhes
exatamente o que podem esperar de minha parte. Tenciono amá-los a todos, não
importa o que aconteça. Tenciono pastoreá-los e alimentá-los enquanto desejarem
que eu fique. Não desacreditarei, nem transigirei, nem darei as costas àquilo
que acredito que a Palavra de Deus ensina, e isso significa que haverá horas em
que terão o meu cajado de pastor em torno de seus pescoços, não para julgar ou
fazer mal, mas para ajudá-los a se voltarem para a direção certa, a fim de
protegê-los e curá-los. Tenciono pregar o evangelho de Jesus Cristo, pois para
isso fui chamado. Sinto uma grande responsabilidade por esta cidade; há vezes
em que sinto tão fortemente essa responsabilidade que tenho de perguntar-me
por que, mas esse sentimento não se vai e não posso dar-lhe as costas nem
tentar negá-lo. Até que o Senhor me diga o contrário, tenciono permanecer em
Ashton a fim de me desincumbir dessa responsabilidade.
—
Se esse é o tipo de pastor que desejam, então digam-me esta noite. Se não for
esse o tipo de pastor que desejam... bem, realmente também preciso saber.
—
Amo-os a todos. Desejo o melhor que Deus tem para lhes dar. E acho que isso é
tudo o que tenho a dizer.
Hank desceu da plataforma, pegou a mão de Mary, e os dois
saíram pela passagem central rumo à porta. Hank tentou captar os olhos de
tantas pessoas quantas pudesse. Algumas lhe deram olhar de amor e estímulo,
outras desviaram os olhos.
Krioni e Triskal saíram com Hank e Mary. Lucius observava com zombeteiro
desdém.
Guilo murmurou para os companheiros:
—
Enquanto o gato está ausente, os ratos vão brincar.
—
Onde está Tal? — perguntou novamente Chimon. Brummel pôs-se de pé diante do
grupo.
—
Ouviremos agora as declarações da congregação. Levantem a mão se quiserem
falar. Sim, Sam, porque não fala primeiro?
Sam Turner levantou-se e foi à frente.
—
Obrigado, Alf — disse. — Bem, não tenho dúvida de que todos conhecem a mim e a
minha esposa Helen. Temos morado nesta comunidade por mais de
trinta anos, e apoiamos esta igreja através de tudo quanto foi dificuldade. Ora, não tenho muito
o que dizer esta noite. Todos sabem que tipo de pessoa sou, como acredito em
amar ao próximo e em viver uma vida de bem. Tenho tentado fazer o que é certo e
ser um bom exemplo daquilo que um cristão deveria ser.
—
E estou zangado esta noite. Estou zangado por causa de meu amigo Lou Stanley.
Vocês podem ter notado que Lou não está aqui hoje, e estou certo de saber o por
quê. Antigamente, ele podia aparecer na igreja e fazer parte dela, e nós todos
o amávamos e ele nos amava, e acho que todos ainda o amam. Mas esse sujeito
Busche, que se acha ser um presente de Deus para o mundo, pensou que tinha o
direito de julgar o Lou e chutá-lo para fora da igreja. Agora, amigos,
deixem-me dizer-lhes uma coisa: ninguém chuta Lou Stanley para fora de lugar
algum se Lou não quiser, e o próprio fato de Lou ter concordado com essa
difamação de caráter simplesmente mostra a bondade do seu coração. Ele já podia
ter processado Busche, ou resolvido a questão como já o vi resolver outros
problemas. Ele não tem medo de nada. Mas acho que Lou está com tanta vergonha
das coisas horríveis que foram ditas a respeito dele e tão magoado pelo que
acha que pensamos dele que achou melhor não aparecer mais.
—
Ora, temos aqui esse fofoqueiro farisaico de Bíblia em punho, o culpado desses
problemas. Perdoem-me se pareço um tanto duro, mas, ouçam, lembro-me de quando
esta igreja era como uma família. Quanto tempo faz agora desde que ela foi
assim? Vejam o que aconteceu: cá estamos, envolvidos numa grande discussão, e
por quê? Porque permitimos que Hank Busche viesse e alvoroçasse a todo o mundo.
Ashton costumava ser uma cidade pacífica, esta igreja costumava ser pacífica,
e digo que devemos fazer o que for necessário para que as coisas voltem a ser
como antes.
Turner voltou ao seu lugar enquanto algumas cabeças acenaram
silenciosamente em encorajamento e aprovação.
Em seguida, John Coleman pediu a palavra. Uma pessoa tímida, ele estava muito
nervoso por ter de falar na frente de todos, mas estava preocupado bastante
para fazê-lo assim mesmo.
—
Bem — disse, revolvendo nervosamente a Bíblia e olhando para o chão — em geral
não falo muito, e estou morrendo de medo pelo fato de estar em pé aqui, mas...
acho que Hank Busche é um verdadeiro homem de Deus, um bom pastor, e eu
realmente detestaria vê-lo partir. A igreja da qual Pat e eu viemos, bem,
simplesmente não estava satisfazendo às nossas necessidades, e estávamos
ficando com fome: fome da Palavra, da presença de Deus. Achamos ter encontrado
essas coisas aqui, e estávamos realmente esperando poder participar desta
igreja e crescer no Senhor sob o ministério de Hank, e sei que uma porção de outras pessoas sentem da mesma forma. No que diz
respeito a esse negócio do Lou, o que aconteceu não foi apenas responsabilidade
do Hank. Todos nós participamos da decisão, inclusive eu, e sei que
Hank não estava tentando magoar a ninguém.
Quando John se assentou, Patrícia deu-lhe uns tapinhas
no braço e disse:
—
Você se saiu muito bem —. Mas John não tinha tanta certeza assim.
Brummel dirigiu-se ao grupo.
—
Acho que seria uma boa idéia ouvirmos o que o secretário da igreja, Gordon
Mayer, tem a dizer.
Gordon Mayer foi à frente levando alguns arquivos e atas da igreja. Era
um homem tenso, de expressão rígida e voz rouquenha.
—
Tenho dois assuntos que desejo apresentar ao grupo — disse. — Antes de mais nada,
na parte de negócios, vocês todos precisam ficar sabendo que as ofertas
decaíram nos últimos meses, mas as nossas contas ficaram na mesma, se é que não
subiram. Em outras palavras, o dinheiro está acabando, e eu pessoalmente não
tenho dúvidas quanto ao motivo. Existem diferenças entre nós que realmente
precisamos resolver, e deixar de contribuir não é o modo de fazer isso. Se
tiverem reclamação acerca do pastor, então façam o que tiverem de fazer esta
noite, mas não vamos acabar com a igreja toda por causa desse homem.
—
Em segundo lugar, não sei se adianta alguma coisa, mas deixem-me dizer-lhe que
a comissão original designada para escolher o pastor estava
considerando outro homem para o cargo. Eu fiz parte da comissão e posso garantir-lhes
que ela não tinha a menor intenção de recomendar Busche para o cargo. Estou
convencido de que a coisa toda foi um engano, um grave erro. Votamos no homem
errado e agora estamos pagando.
—
Por isso, deixem-me encerrar assim: Claro, cometemos um erro, mas tenho fé no
grupo que está aqui, e acho que podemos dar as costas ao que passou e começar a
fazer a coisa certa para variar. Vamos lá, pessoal.
E assim foi a noite durante quase duas horas, enquanto
ambos os lados se alternavam em crucificar e louvar a Hank Busche. Os nervos
vieram à tona,
os traseiros se adormeceram, as costas se grudaram, e os pontos de vista
opostos cada vez mais se exaltaram em suas convicções. Após duas horas, um
sentimento comum começou a ser murmurado pelo salão: “Vamos lá, está na hora de
votar...”
Alf Brummel havia tirado o paletó, soltado a gravata, e
arregaçado as mangas. Ele estava juntando uma pilha de quadradinhos de papel,
as cédulas.
—
Muito bem, este voto será secreto — disse, entregando os papéis a dois
auxiliares escolhidos às pressas, os quais os distribuíram à congregação. —
Vamos manter a coisa bem simples. Se deseja que o pastor fique, escreva sim, e
se quiser outra pessoa, escreva não.
Mota cutucou Chimon.
—
Hank terá número suficiente de votos? Chimon apenas meneou a cabeça.
—
Ainda não temos certeza.
—
Quer dizer que ele pode perder?
—
Esperemos que alguém esteja orando.
—
Onde, mas, onde está Tal?
Escrever um simples sim ou não tomava pouco tempo, de
modo que quase de imediato os auxiliares estavam recolhendo os votos.
Guilo estava quieto no seu canto, fitando com
ferocidade tantos demônios quantos olhassem para ele. Alguns dos espíritos menores de
perturbação adejavam pelo templo tentando ver o que as pessoas estavam marcando
nas cédulas, e rindo, fazendo caretas, dando vivas ou xingando conforme o que
viam. Em pensamento, Guilo via três ou quatro daqueles pescocinhos finos em
suas mãos. Não vai demorar, demoniozinhos, não vai demorar.
Brummel assumiu o comando novamente.
—
No interesse da justiça vamos escolher representantes dos dois diferentes...
ah... pontos de vista para virem fazer a contagem.
Depois de um bocado de risinhos nervosos, John Coleman
foi escolhido pelos favoráveis e Gordon Mayer pelos desfavoráveis. Os dois levaram os
pratos de coleta cheios de votos a um banco nos fundos. Um bando de demônios
esvoaçando e chiando convergiu sobre o local, querendo ver o resultado.
Guilo também saiu do seu canto. Nada mais justo, pensou. Lucius
precipitou-se do teto num instante e sibilou:
—
Volte para o seu canto!
—
Desejo ver o resultado.
—
Ah, é isso o que você deseja, não é mesmo? — zombou Lucius — E se eu resolver
abri-lo como fiz ao seu amigo?
Algo na forma pela qual Guilo respondeu: — Experimente — pode ter
feito Lucius reconsiderar. À aproximação de Guilo os demoniozinhos saíram
alvoroçados como um bando de galinhas. Ele se inclinou sobre os dois homens
para dar uma olhada. Gordon Mayer contava primeiro, em silêncio, e depois
passava as cédulas a John Coleman. Mas sorrateiramente escondeu alguns votos
positivos na palma da mão. Guilo olhou para ver quão atentamente os demônios
estavam observando, depois fez ele mesmo um movimento sorrateiro, tocando as
costas da mão de Mayer.
Um demônio percebeu e bateu na mão de Guilo com garras à mostra.
Guilo puxou depressa a mão e chegou infinitamente perto de rasgar o demônio em
tiras, mas conteve-se e obedeceu às ordens de Tal.
—
Qual é seu nome? — quis saber Guilo.
—
Trapaça — respondeu o demônio.
—
Trapaça — repetiu Guilo enquanto voltava ao seu canto. — Trapaça.
Mas o golpe de Guilo havia servido para frustrar o
esforço de
Mayer. As cédulas caíram da mão do homem e John Coleman as viu.
—
Você derrubou alguma coisa aí — disse ele com muita doçura. Mayer não pôde
dizer nada. Simplesmente entregou as cédulas ao outro.
A contagem estava terminada, mas Mayer queria contar
outra vez. Contaram os votos novamente. O número não mudou: estava empatado.
Os dois relataram o resultado a Brummel, e este disse à congregação, que gemeu
baixinho.
Alf Brummel sentia as mãos umedecerem; tentou enxugá-las no lenço.
—
Bem, ouçam — disse ele — pode não haver muita possibilidade de que alguns de
vocês reconsiderem, mas estou certo de que ninguém deseja prolongar este
negócio além de hoje. Vamos fazer uma coisa: por que não tiramos um curto
intervalo e damos a alguns a chance de se levantarem, espreguiçarem, usarem o
banheiro. Depois nos reuniremos e votaremos de novo.
Enquanto Brummel falava, os dois demônios postados no canto da
igreja viram algo muito inquietante. A apenas um quarteirão vinham duas
senhoras idosas, manquitolando em direção à igreja. Uma andava apoiada na
bengala e ajudada pela mão da amiga. Ela não parecia nada bem, mas o queixo
estava firme e os olhos brilhantes e decididos. Os estalidos da bengala
formavam um ritmo sincopado com os dos seus passos. A amiga, melhor de saúde e
mais forte, mantinha-se ao seu lado, segurando-lhe o braço a fim de afirmá-la e
cochichava algo ao seu ouvido.
—
A da bengala é Duster — disse um demônio.
—
O que saiu errado? — quis saber o outro. — Pensei que tivessem dado um jeito
nela.
—
Está doente, com certeza, mas veio de qualquer forma.
—
E quem é a velha que a acompanha?
—
Edith Duster tem muitas amigas. Devíamos ter sabido.
As duas senhoras subiram a escada da frente, cada
degrau em si uma tarefa penosa, primeiro um pé, depois o outro, depois a bengala colocada no degrau seguinte, até que finalmente chegaram à porta da frente.
—
Aí, olhe só! — riu-se a mais forte. — Eu sabia que você conseguiria. O Senhor
a trouxe até aqui, ele cuidará de você o resto do percurso.
—
Edith Duster precisa mais é de um derrame — murmurou um demônio de enfermidade,
sacando da espada.
Talvez fosse apenas sorte, ou incrível coincidência, mas no
exato momento em que o demônio se precipitou com grande velocidade para cortar
as artérias do cérebro de Edith Duster, a outra senhora adiantou-se a fim de
abrir a porta e se pôs bem na frente. A ponta da espada do demônio bateu no
ombro da mulher, que podia ter sido de concreto; a espada se deteve.
Enfermidade, contudo, não parou, mas deu uma reviravolta por cima das duas
mulheres e aos tram-bolhões, como um papagaio quebrado, foi parar no pátio da
igreja enquanto Edith Duster entrava.
Enfermidade levantou-se e berrou:
—
O exército celestial!
O outro demônio de guarda fitou-o sem compreender.
Brummel viu Edith Duster entrar sozinha. Ele soltou uma
praga silente. Esse seria o voto que desempataria, mas ela certamente votaria
em Busche. As pessoas reuniam-se de novo.
Os mensageiros de Deus estavam eufóricos.
—
Parece que Tal conseguiu — disse Mota. Chimon, entretanto, estava preocupado.
—
Com tanto inimigo por perto, ele com toda a certeza teve de se mostrar.
Guilo deu uma risada.
—
Estou certo de que o nosso Capitão foi muito discreto.
Alguns demônios estavam de fato tentando descobrir que fim levara
a companheira de Edith Duster entre a porta da frente e o santuário.
Enfermidade continuava insistindo em que havia sido um guerreiro celeste, mas
onde estava ela agora?
Tal, Capitão do Exército, reuniu-se a Signa e aos outros guardas
em sua posição escondida.
—
O senhor enganou até a mim, Capitão — disse Signa.
—
Você poderia tentar esse truque algum dia — replicou Tal. Na plataforma,
Brummel tateava mentalmente em busca de um trunfo. Ele podia até ver os olhos ardentes de
Langstrat, caso a votação saísse errada.
—
Bem — disse ele — por que não reiniciamos a assembléia e nos preparamos para
outra votação? — Os presentes se acomodaram, e fez-se silêncio. O lado dos sim
estava mais do que pronto.
—
Agora que oramos e falamos sobre o assunto, talvez alguns de nós
pensemos de forma diferente acerca do futuro desta igreja. Eu... hum... — Vamos
lá, Alf, diga alguma coisa, mas não fale bobagem.
— Acho que poderia dizer algumas palavras; ainda não transmiti o que sinto. Sabem, Hank Busche é um pouco jovem... Um encanador de meia idade do campo
positivo disse:
—
Se você vai reforçar o lado negativo, temos o direito ao mesmo tempo para o
positivo.
Todos os pelo sim murmuraram concordando enquanto os
pelo não permaneceram
em frio silêncio.
—
Não, ouçam — gaguejou Brummel, o rosto vermelho-vivo — não tive a intenção de
influenciar a votação. Apenas estava...
—
Vamos votar! — disse alguém.
—
Sim, votem, e depressa! — sussurrou Mota.
Nesse exato momento a porta se abriu. Oh, não, pensou Brummel, quem
está chegando desta vez?
O silêncio caiu como uma mortalha sobre todo o grupo. Lou Stanley
havia acabado de entrar. Sombrio, acenou com a cabeça cumprimentando a todos e
assentou-se num banco dos fundos.
Gordon Mayer disse:
—
Vamos à votação!
Os auxiliares passaram as cédulas enquanto Brummel
tentava planejar uma boa rota de escape, caso precisasse vomitar, seus nervos
estavam praticamente em frangalhos. Ele conseguiu a atenção de Lou Stanley. Lou
olhou-o e pareceu dar uma risadinha nervosa.
—
Assegure-se de que o Lou, que está lá atrás, receba uma cédula — disse Brummel
a um dos auxiliares. O auxiliar cumpriu o pedido.
Chimon sussurrou a Guilo.
—
Acho que estamos prontos para qualquer truque que Lucius possa querer pregar.
—
Qualquer coisa que leve a um desempate, você quer dizer — respondeu Guilo.
—
Pode ser que ainda demore bastante — disse Mota.
As cédulas foram recolhidas, e Lucius manteve os seus demônios em cerco fechado ao redor de cada receptáculo de coleta, e os olhos em cada guerreiro.