Capítulo 6
O INFERNO
NAQUELE OUTONO, LUÍS, meu irmão que vivia em Bronx, foi ao
meu apartamento pedir-me para ir morar com ele. Ele lera nos jornais de Nova
York que eu estivera envolvido com a polícia. “Nicky, você está correndo risco
de vida. Está fazendo um jogo perigoso. Vai acabar sendo assassinado.” Disse
que tinha conversado sobre mim com a esposa, e ambos desejavam que eu fosse
para o apartamento deles. Minha resposta foi uma risada.
“Por que vocês querem que eu mude para lá?” perguntei. “Ninguém
mais me quer, como vocês decidiram que me querem?”
“Está errado, Nicky”, respondeu Luís, “todos queremos você.
Frank, Gene, todos nós queremos você. Mas é preciso que sossegue.”
“Escute”, disse eu, “ninguém me quer. Você é mesmo um
tapeador. Nem você, nem Frank, nem Gene, nem papai, nem mamãe...”
“Espere aí”, interrompeu Luís, “papai e mamãe amam você.”
“Ah, é? Então por que foi que eles me mandaram embora de
casa? Como explica isso, espertalhão?”
“Eles mandaram você para cá porque não podiam com a sua
vida. Você é como um selvagem... como se estivesse fugindo de alguma coisa, o
tempo todo.”
“Você acha? Talvez eu estou mesmo fugindo de vocês, seus
vagabundos. Escute, sabe quantas vezes na vida papai conversou comigo? Uma. Só
uma vez na vida ele sentou e tivemos uma conversa. Contou-me então uma estória
sobre um passarinho estúpido. Uma vez só! Nada mais. Rapaz, não vem me dizer
que ele me ama. Ele não tinha tempo para gastar com ninguém, a não ser consigo
mesmo.”
Luís levantou-se e começou a andar pelo quarto.
“Nicky, será que você não pode ouvir a voz da razão?”
“Por que tenho de ir para sua casa? Você quer me mandar de
novo para a escola, como Frank queria . Aqui eu me realizei. Tenho duzentos
amigos que fazem o que eu mando, e setenta e cinco garotas que estão comigo
sempre que eu peço. Eles me dão todo o dinheiro que preciso. Ajudam-me a pagar
o aluguel. Até a polícia tem medo de mim. Por que eu haveria de ir para a sua
casa, morar com você? A gang é a minha família. É só o que preciso.”
Luís ficou sentado à beira da cama, durante muito tempo,
noite adentro, tentando me convencer que um dia tudo aquilo iria mudar. Disse
que, se eu não fosse morto ou jogado no cárcere, um dia eu precisaria arranjar
um emprego e teria necessidade de instrução. Eu lhe disse que não pensasse mais
no assunto. Tudo me corria bem, e eu não estava disposto a abandonar aquela
posição cômoda.
Sozinho no quarto, na tarde seguinte, o medo, que tão bem
conseguira dissimular, tomou conta de mim. Recostei na cama, e bebi vinho até
ficar tão embriagado e tonto que não conseguia ficar sentado. Aquela noite
dormi de roupa, porém não estava preparado para a experiência que passei —
pesadelos! pesadelos horríveis, de gelar o sangue! Sonhei com papai. Sonhei
que ele estava acorrentado em uma caverna. Seus dentes eram como os de um lobo,
e o seu corpo estava coberto por um pelo sarnento Ele estava latindo que dava
dó, e eu queria aproximar me dele e afagá-lo, mas tinha medo de que me
abocanhasse.
Vieram então os pássaros. A face de Luís ia e vinha à minha
frente, pois se achava montado em um pássaro, que voava livremente pelo céu.
Fui depois rodeado por milhões de pássaros que dilaceravam minha carne e
bicavam-me os olhos. Cada vez que eu conseguia livrar-me deles, via Luís voando
como uma pequena mancha no céu, cavalgando um pássaro que voava para uma
liberdade desconhecida.
Levantei-me gritando: “Não tenho medo. Não tenho medo “ Mas
quando caí no sono outra vez, vi papai acorrentado nas trevas, e os pássaros
que se ajuntavam ao meu redor, para me atacar.
O efeito continuou. Por mais de dois anos eu tive medo de
dormir. Cada vez que pegava no sono, os sonhos horríveis voltavam. Lembrava-me
de papai e desejava que ele viesse a Nova York, a fim de afastar aqueles
demônios de mim. Eu estava possuído de um sentimento de culpa e de medo, e de
noite ficava deitado na cama, lutando contra o sono e repetindo
indefinidamente: “Vai mal. Vai mal. Não tenho saída. Não tenho saída.” Só as
atividades da quadrilha me impediam de enlouquecer completamente .
Os Mau-Maus tinham-se tornado parte da minha vida. Embora
fôssemos suficientemente fortes para sobreviver sozinhos, ocasionalmente
formávamos aliança com outra quadrilha. No inverno de 1955 os Hell Burners, de
Williamsburg, procuraram-nos para formar aliança conosco.
A noite vinha perto e alguns de nós estávamos reunidos no
parque infantil, perto do 67.° Distrito, para discutir uma “guerra” que
teríamos contra os Bishops. Levantei os olhos e vi três rapazes saindo das
trevas, encaminhando-se para nós. Imediatamente colocamo-nos em guarda. Um dos
Mau-Maus esgueirou-se pelas sombras e colocou-se por trás dos três que já
estavam quase nos alcançando.
“Ei, o que é que estão querendo?” gritei.
“Estamos procurando Nicky, o líder dos Mau-Maus.” Um deles
falou pelos outros.
“Bem, o que é que querem com o Nicky?” Eu sabia que podia
ser um truque.
“Escute, cara, não queremos tapear ninguém. Estamos
atrapalhados, e precisamos falar com o Nicky.”
Eu continuava desconfiado. “Que atrapalhação é essa?”
perguntei.
“Meu nome é Willie Açougueiro”, disse o rapaz,
suficientemente perto agora, para que eu pudesse vê-lo. “Sou o líder dos Hell
Burners. Precisamos de ajuda.”
Eu agora estava certo de quem se tratava: “Que tipo de
ajuda?”
“Vocês ouviram falar do que os Phantom Lords fizeram com o
Ike?” apontou com a cabeça o rapaz à sua direita.
Eu tinha ouvido. Toda a história tinha sido publicada nos
jornais. Ike tinha quatorze anos, e morava na Rua Keap. Estava brincando com
dois meninos, quando uma turma de Phantom Lords os atacara. Os outros
conseguiram fugir, mas Ike foi cercado e empurrado contra uma cerca. Quando
ele tentou reagir, foi dominado
e arrastado para um porão, do outro lado da rua. Ali, de
acordo com a reportagem dos jornais, amarraram-no com as mãos para a frente, e
lhe deram socos e chutes até que perdeu os sentidos. Depois, derramaram fluido
para isqueiro sobre as suas mãos, e puseram fogo. Ele cambaleou até a rua, onde
caiu e foi encontrado por uma radiopatrulha que passava.
Dei uma rápida olhadela no rapaz que Willie Açougueiro
apresentara como Ike. As mãos e os braços estavam cobertos de ataduras, e o seu
rosto estava muito ferido.
“Vocês são os únicos que podem ajudar. Queremos ser clubes
irmãos. Todo mundo tem medo dos Mau-Maus, e nós precisamos da sua ajuda para
brigar com Phantom Lords. Se não vingarmos Ike, somos covardes”, continuou
Willie.
As outras quadrilhas conheciam a minha reputação e a
reputação da gang dos Mau-Maus. Não era a primeira vez que alguém nos
procurava, pedindo ajuda. E nós gostávamos, pois isso nos dava uma desculpa
para brigar.
“E se nós não ajudarmos?”
“Vamos perder o nosso território para os Phantom Lords.
Ontem à noite eles já entraram lá e puseram fogo em nossa confeitaria.”
“Eles queimaram a sua confeitaria? Bem, rapaz, eu vou
queimá-los. Todos eles. Amanhã à noite eu estarei no território dos Hell
Burners, e faremos planos para matar aqueles esnobes.”
No dia seguinte, saí do meu apartamento, logo que escureceu,
e dirigi-me para Williamsburg. No caminho, convidei dez membros da minha quadrilha.
Ao entrarmos no território dos Hells, sentimos a tensão no ar. Eles estavam com
medo e tinham subido aos telhados. De repente, fomos bombardeados com pedras e
garrafas. Felizmente a pontaria deles era péssima, e nós nos enfiamos pela
porta de um prédio de apartamentos, para escapar à avalanche de pedras e vidro
que despencava do alto.
Disse aos outros rapazes que continuassem escondidos,
enquanto eu subia pelo prédio de apartamentos, até o último andar. Ali
descobri uma escada que subia até o teto, com um alçapão dando para o telhado.
Levantando um pouco a tampa do alçapão, pude ver os rapazes
na parte da frente do telhado, debruçados na beirada, olhando a rua, lá em
baixo. Esgueirei-me silenciosamente pelo alçapão, e me escondi atrás do tubo
de ar.
Devagarinho, aproximei-me de dois deles, e dei-lhes um tapa
no ombro. “Aiiiiii!” gritaram. Os dois quase caíram do telhado. Olharam para
trás, com os olhos arregalados, mãos agarradas nervosamente ao parapeito, bocas
abertas de medo.
“Q-q-q-quem é-é-é- vo-você?” gaguejaram.
“Ei, meu chapa, eu sou Nicky. Quem é você? Uma coruja, ou o
quê?” Não pude deixar de rir.
“Q-q-quem é Nicky?” gaguejou um deles.
“Vamos, moleque, eu sou o líder dos Mau-Maus. Estamos aqui
par.a ajudar, a menos que nos matem primeiro. Onde está o seu líder? Onde está
Willie Açougueiro?”
Ele estava em outro telhado. Levaram-me até lá. Cerca de
quinze Hell Burners aglomeraram-se ao nosso redor, e o resto dos Mau-Maus subiu
e juntou-se a nós.
Willie nos contou como estavam tentando frustrar a invasão
dos Phantom Lords, mas como até então não tinham conseguido nada. Naquela
noite, tudo estava quieto, mas nunca se sabia quando a quadrilha surgiria nas
ruas, para picá-los em pedacinhos. A polícia sabia que estava havendo uma guerra
de quadrilhas, mas nada podia fazer para impedi-la.
Willie tinha um revólver, mas pelo que pude compreender,
nenhum dos outros rapazes tinha arma de fogo.
Escutei o que tinham a dizer e depois comecei a traçar os
planos para a batalha. A turma ficou
quieta enquanto eu falava.
“Vocês estão perdendo porque estão na defensiva. Estão
deixando que eles venham aqui, e assim têm de defender o seu próprio
território. A maneira de vencer é ir atrás deles.”
Fiz uma pausa para causar efeito, e depois continuei: “E
nada de armas de fogo.”
“Nada de armas de fogo? Como é que se pode brigar sem
revólver?” Houve um movimento entre eles.
“Vamos usar armas silenciosas.” Abri o paletó e tirei uma
baioneta de uns sessenta centímetros, completa, com bainha. Tirei-a da bainha,
brandindo-a no ar. Pude ouvir assobios baixos dos rapazes que nos rodeavam.
Eu ganhara seu respeito e aprovação. Agora ouviam-me,
ansiosos para ver como é que eu ia liderá-los.
Virei para Willie: “Quero cinco dos rapazes mais fortes. Nós
vamos escolher cinco dos nossos. Amanhã à noite vamos entrar no território dos
Phantom Lords, e conversar com os chefes. Eles não querem inimizade com os
Mau-Maus. Digo que agora somos clubes irmãos, e se eles não deixarem vocês em
paz, terão de lutar também com a gente. Se não quiserem acordo, vamos botar
fogo na confeitaria deles, só para eles ficarem sabendo que estamos falando
sério. O que é que acham?”
“Sim, sim, meu chapa”, começou a gritar a gang. “Vamos tocar
fogo naqueles bastardos. Vamos acabar com eles. Vamos mostrar a eles.”
Na tarde seguinte fui com cinco de nossos rapazes, e nos
reunimos na confeitaria da Rua White, no território dos Hell Burners. A
confeitaria fora fechada desde a briga das quadrilhas, alguns dias antes. Cinco
dos Hells, inclusive Willie, nos encontraram lá. Conversei com o gerente, e
disse que sentíamos muito que os Phantom Lords
tivessem depredado a casa, e que iríamos providenciar para que aquilo
jamais acontecesse de novo. Pedi-lhe então para guardar a minha baioneta até
que voltássemos
Eram cerca de cinco da tarde, e uma chuva fina estava caindo
no crepúsculo frio. Saímos dali e atravessamos a cidade, em direção à Rua Três,
no território dos Phantom Lords. Havia cinco deles na confeitaria. Eles nos
viram chegando, mas não puderam escapar porque tínhamos bloqueado a porta.
Todos entramos de mãos no bolso do paletó, como se
portássemos revólveres. Dirigi-me aos rapazes que tinham ficado de pé, por
trás da mesa. Perguntei praguejando: “Quedê o chefe?”
“Freddy é o nosso líder”, disse um rapaz de expressão
maldosa, que usava óculos escuros.
“Qual de vocês é Freddy?”
“Eu sou Freddy; que diacho são vocês?” perguntou um rapaz
de cerca de dezoito anos, de feições abrutalhadas e cabelo negro e crespo, que
deu um passo à frente.
Eu mantinha ainda a mão no bolso, e a gola da capa de chuva
levantada atrás.
“Sou Nicky, Presidente dos Mau-Maus. Já ouviu falar de nós?
Este é Willie Açougueiro, chefe dos Hell Burners. Agora nós somos clubes
irmãos. Queremos acabar com a briga.”
“Tá certo, meu chapa”, disse Freddy. “Vamos bater um papo. “
Reunimo-nos a um canto para conversar, mas um dos Phantom
Lords xingou Willie com um palavrão Antes que eu pudesse mover-me, Willie
tirou a mão do bolso e abriu um punhal. Em vez de recuar, o rapaz estendeu o
guarda-chuva na direção dele. A ponta de metal, afiada como uma agulha, rasgou
a capa de chuva de Willie, esfolando-lhe o lado, perto das costelas.
Imediatamente, um dos Hell Burners agarrou um pesado açucareiro, e atirou-o no
rapaz que empunhava o guarda-chuva, atingindo-o no ombro e derrubando-o por
terra.
“Ei calma!” gritou Freddy, mas ninguém lhe deu atenção. Os
rapazes lançaram-se uns contra os outros. Freddy virou-se para mim: “Manda
parar.”
“Ora, manda você. Foi sua turma que começou.”
Foi então que algo me atingiu na nuca. Ouvi um tinido de
vidro quebrado, quando uma garrafa espatifou-se contra um espelho por trás do
balcão.
Lá fora, um carro da radiopatrulha parou no meio da rua, com
um rangido de freios, luzes vermelhas piscando. Dois policiais uniformizados
saltaram, deixando as portas do carro abertas, e correndo para a confeitaria,
com os cassetetes na mão.
Os outros rapazes também os viram. Como por um sinal, todos
voamos para a porta e nos espalhamos por entre os carros. Um guarda estava bem
atrás de mim, mas eu virei uma grande lata de lixo no meio da calçada,
retardando-o o suficiente para escapar por uma travessa.
O palco estava montado para um “quebra-pau” em grande
escala.
Na noite seguinte, mais de cem Mau-Maus se reuniram na
confeitaria, no território dos Hells. Willie Açougueiro estava lá com mais de
cinqüenta dos seus rapazes. Marchamos juntos pelo meio da rua, em direção à
confeitaria na zona dos Phantom Lords.
Cortez, um dos Mau-Maus, tinha passado a semana toda “alto”
com heroína, e naquela noite estava louco para brigar. Quando chegamos à
confeitaria, ele empurrou a porta e agarrou um Phantom Lord que tentou
escapar. Cortez tentou golpeá-lo com uma faca, mas errou, e empurrou-o para
mim, que vinha atrás.
Eu estava rindo. Era aquela a proporção em que eu gostava de
brigar — cerca de cento e cinqüenta contra quinze. Com um pedaço de cano de
chumbo que levava na mão bati no rapaz que cambaleava. Ele gritou de dor
quando o pesado cano o acertou no ombro. Enquanto ele caía na calçada,
golpeei-o de novo, desta vez na nuca. Ele despencou pesadamente no concreto, e
o sangue escorreu por um ferimento profundo.
“Vamos gente”, gritou alguém, “vamos queimar todo o
território.” Os rapazes espalharam-se. Alguns entraram na confeitaria e outros
arremeteram contra um salão de bilhar que ficava ao lado. Eu fui levado pela
onda, e vi-me na confeitaria. Ainda estava com o cano na mão, e ia batendo em
tudo que encontrava. As janelas já tinham sido quebradas, e pude ver o gerente
encolhido debaixo do balcão, procurando proteger-se. O pessoal estava como
louco, quebrando tudo. Alguém fez tombar a vitrola, e eu me vi sobre ela,
arrebentando-a com o cano. Outros tinham entrado atrás do balcão, e estavam
arrancando as prateleiras da parede, e quebrando garrafas e pratos. Alguém “limpou”
a caixa registradora, e então dois rapazes atiraram-na através da vidraça
quebrada.
Corri para a rua, com o rosto coberto de sangue, ferido por
um estilhaço de vidro. Corria para baixo e para cima, quebrando os pára-brisas
dos carros com o cano.
Cerca de cinqüenta rapazes estavam dentro do salão de
bilhar. Tinham virado todas as mesas de bilhar de pernas para o ar, e quebrado
todos os tacos. Agora tinham voltado para a rua e atiravam bolas de bilhar em
todas as lojas.
Uma turma de rapazes fez parar um carro no meio da rua, e
subia nele, pulando sobre o teto e o cofre do motor, até que o carro ficou
disforme. Todos estavam rindo, gritando e destruindo.
Sirenes gemeram quando carros da polícia convergiram de
ambas as extremidades da rua. Normalmente, aquilo seria um sinal para os
rapazes pararem e fugirem, mas a febre de destruição assumira o controle, e já
não ligávamos mais.
Um carro da radiopatrulha conseguiu chegar até o meio do
quarteirão, mas os tiras não puderam abrir as portas do carro, pois os rapazes
arremeteram de todos os lados, batendo neles com garrafas quebradas, tijolos e
porretes, quebrando os faróis e despedaçando as janelas. Os policiais,
enjaulados dentro do veículo, tentaram chamar a central de polícia pedindo
ajuda, mas nós subimos em cima do carro e arrancamos a antena. Um dos rapazes
começou a dar pontapés na sirene, e ela soltou-se e caiu na rua.
Mais carros da polícia brecaram, os freios rangendo, no fim
do quarteirão. Era a baderna. Mais de cento e cinqüenta rapazes estavam
lutando, gritando, virando carros, quebrando vidros. Policiais aventuraram-se
no meio daquela multidão efervescente e ruidosa, brandindo os cassetetes. Vi
Cortez lutando contra dois guardas no meio da rua. Corri para ajudá-lo, mas
ouvi estampidos de tiros, e percebi que era hora de dar o fora.
Espalhamo-nos em todas as direções. Alguns dos rapazes
correram rua abaixo e enveredaram pelas travessas. Outros entraram nos prédios
de apartamento, subiram as escadas e esconderam-se nos telhados. Em questão de
minutos a cena estava vazia, e nada mais restava além de todo um quarteirão
destruído. Nenhum carro ficara intacto. A confeitaria fora completamente
demolida. O salão de bilhar também. Todas as vidraças haviam sido quebradas no
bar do outro lado da rua, e quase todo o uísque fora roubado das prateleiras.
Alguém abrira a porta de um carro, cortara os assentos, e depois pusera fogo no
estofamento. Os policiais estavam tentando apagar o fogo, mas o fogo ainda
ardia, quando fomos embora.
Todos escaparam, menos Cortez e três Hells. A lei das
quadrilhas declarava que se o cara fosse preso, teria que “se virar sozinho”.
Se começasse a “cantar” ou a “dar o serviço”, seria punido pela quadrilha. Ou,
se estivesse na cadeia, a gang se vingava na família dele. Cortez foi
sentenciado a três anos, e os outros também receberam condenação.
Mas os Phantom Lords nunca mais voltaram ao território dos
Hells.