Tráfego. Essa foi uma das principais áreas de problema em
minha vida, e acontecia regularmente entre as quatro e meia e cinco e meia da
tarde. Eu dirigia o carro ao voltar para casa, procedente de minha fábrica
localizada na zona industrial de Baltimore, na zona em que se encontram a
Bethlehem Steel, a General Motors e umas poucas outras empresas pequenas como
essas. . . Havia cerca de umas quarenta mil pessoas tentando chegar às suas
casas na mesma hora, trafegando em estradas construídas para tráfego de
veículos de tração animal, estradas de mão única.
Oh, como eu costumava magoar-me, dirigindo naquela balbúrdia
da tarde. Eu havia trabalhado o dia todo e me dera bem louvando ao Senhor; mas
depois tinha de enfrentar o tráfego da tarde. Dentro de quinze minutos eu me
sentia completamente exausto. Eu costumava sentar-me ao chegar a um semáforo,
pronto para entrar em ação, com o motor acelerado e minha pressão sangüínea
também. Não podia descontrair-me naqueles trinta segundos de espera pela
mudança de farol, porque alguém podia passar à minha frente. Eu tinha de sair adiante
de todos quando o farol abrisse, e deixá-los tragando a fumaça do escapamento.
Todos os faróis me pareciam os mais demorados. Eu era capaz de jurar que o
marcador de tempo estava errado, e lá no meu íntimo suspeitava que aquilo era
obra de intento maldoso de alguém para me importunar.
Meu desejo era ter uma longa barra de aço sob o eixo de
transmissão do carro. Ela estaria ligada a um botão sob o painel, e quando
alguém entrasse em meu caminho, alguém que demorava e 'não me permitia tomar a
dianteira do tráfego, era só eu apertar o botão. A barra atravessaria o tanque
de gasolina do indivíduo e iria sair no radiador, e isso lhe daria uma boa
lição.
Então um dia dei com os olhos no texto bíblico que dizia:
“Amai os vossos inimigos, fazei o bem aos que vos odeiam; bendizei aos que vos
maldizem, orai pelos que vos caluniam.” Vinha direto para mim como “Bendiga aqueles
que o importunam”, e eu sabia que Deus falava acerca de minha atitude quando eu
estava na direção do carro.
“Mas, Senhor, todos no tráfego me importunam”, disse-lhe eu.
Está bem, disse ele, foi você que disse que ia tentar todas
as regras do Manual do Fabricante. Por isso, comece bendizendo os que o
importunam no tráfego.
Bem, era difícil fazê-lo, mas prometi ao Senhor que tentaria.
Em primeiro lugar, teria de desfazer-me de minha arma imaginária. Então, pela
graça de Deus, tentei bendizer os que acintosamente abusavam de mim em situações
de tráfego.
Isso exigia uma boa dose de bendizer.
A primeira noite em que experimentei o modo de Deus no
tráfego, localizei um camarada assentado numa rua lateral em total melancolia.
Estava com fome, havia trabalhado duro o dia todo, e sabia que havia dez mil
carros cheios de pagãos que ainda tinham de passar apressados por aquele
cruzamento antes que ele tivesse esperança de sair dali.
Quando parei e lhe fiz sinal que passasse à minha frente,
esse gesto quase acabou com ele. Seus olhos se estatelaram e, por um breve
momento, parece que se havia esquecido de como dirigir o carro. Ele pensara que
não conseguiria sair dali dentro de duas horas, por isso desligou o motor e
desistiu.
Bem, quando ele deu partida e saiu, todo o padrão do tráfego
mudou. Vi que ele deixou alguém mais sair. Pude sentir que aliviava o espírito
de correria daquela hora, e me senti tão abençoado que mal podia conter-me.
Agora eu me divirto a valer no tráfego. Quando paro num
semáforo, observo o motorista tenso ao lado do meu carro, fazendo o que eu
costumava fazer. Pisa no acelerador para ter certeza de que o motor funciona
bem, emite fumaça poluidora suficiente para matar a vizinhança.
Quando a luz fica verde, de propósito espero um pouco para
permitir que ele saia primeiro. E ao sair, ele abre a boca num sorriso que vai
duma orelha à outra.
Talvez, pela primeira vez nos últimos trinta dias ele tenha sido
excelente numa manobra. Pode ser que ele tenha aceitado o fato de que é um
fracasso total, e então fi-lo sentir-se um êxito retendo meu carro. Contribuí
para o seu dia, e posso vê-lo todo radiante em seu calhambeque.
Bem posso ouvir esse cavalheiro quando ele chegar a casa.
Entra, e a esposa se admira por ele estar feliz. Ela estava acostumada a vê-lo
entrar mal-humorado, como eu costumava entrar em minha casa, mais que exausto.
Mas hoje ele está eufórico.
— Querida, afinal de contas meu calhambeque não é tão ruim
como parece. Você precisava ver como esta tarde deixei para trás um Mercedes
novinho em folha num semáforo.
Talvez ele lhe dê um abraço extra e para variar a leve a jantar
fora, e quem sabe? a garçonete receba uma gorjeta extra. Um gesto de bênção
partido de um filho do Rei que procede como filho do Rei tem efeito duradouro.
Chego à minha casa descontraído, louvando ao Senhor, intercedendo
por todos em toda parte, e quando entro, minha esposa sabe que me estive
comportando como filho do Rei. Se, porém, chego fatigado, ela sabe que voltei
ao meu velho sistema de dirigir.
Não existe área alguma de nossa vida que Deus não possa
endireitar se lhe permitimos que ele faça o trabalho a seu modo.